26 de dezembro de 2003

QUANDO OS CÃES PASSAM

A Covilhã é indubitavelmente a cidade da Beira Interior com mais acentuados melhoramentos, a vários níveis, numa perspectiva de brevemente se verem outros horizontes, transformando ainda mais o seu rosto.
Aqui se deve à inteligência dos seus mentores, aliada a uma dinâmica de intervenção que leva a dar-lhes a certeza da confiança do voto para o reforço dum trabalho de continuidade, mesmo por muitos dos não correligionários.
Se bem nos recordamos, em tempos a Cidade chegou a ser reconhecida como das mais limpas do País.
Não sendo contudo das mais sujas, muito há que fazer para que seja uma autêntica cidade limpa.

É que de sujidade, bastam os cães que os seus donos levam a arejar, para, os próprios, permitirem que os dejectos fiquem em cima dos passeios.
Várias ruas da cidade, agora com os passeios disponíveis para as pessoas e não para servirem de casas de banho para canídeos, encontram-se numa autêntica vergonha, além de originarem uma poluição citadina.
Não raro é verem-se pessoas praguejando, ao pisarem ou saltarem por tal imundice.
Até as crianças quando se deslocam para as escolas têm que passar por estes lamentáveis obstáculos, começando desde logo, no seu subconsciente, a lidarem com as coisas nauseabundas. Cada vez há mais pessoas com cães de estimação, mesmo sem quintais, nos prédios de propriedade horizontal.
Se bem que há alguns proprietários conscienciosos, que sabem levar os seus cãezinhos a fazer as necessidades para locais devidos, na sua maioria fecham os olhos e até aproveitam o virar de costas de quem passa, e a horas menos propícias dos olhares, como é a noite, para deixarem os dejectos na rua, quase sempre nos passeios, repetimos, tal é o caso de certas ruas da cidade, desde os prédios novos dos Penedos Altos à Rua Mateus Fernandes, entre outras.
É uma autêntica falta de civismo, mesmo de pessoas que nos levam a uma prolongada interjeição.
Há que pôr cobro a este atentado à urbanidade, à higiene, à saúde e bem-estar dos cidadãos.
Crie-se legislação como noutros países, proibindo estes atentados, obrigando os proprietários a irem munidos de sacos para os dejectos dos cãezinhos, na rua pública, sendo os infractores fortemente penalizados com coimas.
Aqui a Câmara tem um primordial papel, criando condições de policiamento ou alterando o Código de Posturas Municipais, se é que ainda assim se intitula, a fim de banir, de uma vez por todas, a falta de civismo e a porcaria que grassa por esta Cidade.
Certamente que os Covilhanenses reconhecerão do Município estas normas de conduta como meritórias.
É que, infelizmente, muitas vezes é necessário ensinar o cidadão a ser civilizado.

(In “Notícias da Covilhã” de 12/12/2003; “Diário XXI”, de 10/12/2003; “Jornal do Fundão”; de 26/12/2003)

19 de dezembro de 2003

NATAL!

Ainda haverá quem se mantém à margem desta época do ano?
Na generalidade, toda a gente sente chegado este período dos 365 dias de mais uma passagem da nossa vida, tanto na alegria de uma reunião de família, como, quantas vezes, paradoxalmente, na tristeza da ausência de um ente querido, no negrume dum inesperado desemprego ou duma doença que espreitou e se enraizou.
Há, efectivamente, tristes e ledas madrugadas!
Mas infelizmente ainda existem muitos indiferentes ao Natal, que nada lhes diz, a não ser o forçado envolvimento diário no mesmo, face aos meios de comunicação social, às ruas decoradas a pretexto, ao bulício das compras, com a prévia preparação dos estabelecimentos comerciais, e o anúncio de publicidade, quantas vezes duma forma exagerada e enfadonha, que emerge nos jornais, canais de televisão, e não só. São assim, indiferentes, os isolados, os sem abrigo, os de infortúnio, os que não encontram neles outra forma de se verem senão como marginalizados da sociedade onde vivem todo o ano, no período de frio e de calor, de chuva e de sol, apesar de este, quando vem, é para todos.
Natal! Festa anual cristã que comemora o nascimento de Cristo e que tem lugar no dia 25 de Dezembro, é do conhecimento de toda a gente, já se sabe, vivida ou reconhecida em quase todos os cantos do nosso planeta.
Em redor daquela palavra muito se faz, muito se conta, muito há que dizer.
Recordar o Natal de há 50 anos não será o mesmo da actualidade, não obstante ter existido também a tradição do presépio, o comprar de uma peça de vestuário que já se necessitava há muito, a alegria dos brinquedos de criança, geralmente feitos em madeira, cartão, lata ou plástico. Existia também a missa do galo e as fogueiras, numa perene tradição.
O Natal de hoje é um Natal de consumismo, onde os brinquedos são cada vez mais sofisticáveis, chegando-se ao ponto de, nalguns casos, surgir proibição da sua venda face aos efeitos nocivos da sua construção. Hoje, as crianças perdem-se num mar de presentes, para todos os gostos e feitios.
É decerto nesta quadra do ano que mais se fala na mesma palavra – NATAL – O Natal em família; Votos de Feliz Natal; Dia, Semana ou Mês do Natal; Férias de Natal; Presentes de Natal; Cânticos de Natal; Iluminação de Natal; Compras de Natal; Ceia de Natal; Missa de Natal; Espírito de Natal; Árvore de Natal; Pai Natal; Cabaz do Natal; Noite de Natal; Pinheiro de Natal; o Subsídio de Natal.
Isto para, noutro contexto, outros também poderem dizer que “vou passar o Natal à minha terra natal”.
E, pasme-se, até com ironia, há bem poucos anos, de um certo clube desportivo se dizia que corria para o título só até ao Natal, uma vez que, a partir daqui, se deixava ultrapassar pelos seus habituais parceiros da concorrência. Felizmente que outros ventos têm soprado noutro sentido...
Christmas, Noel e Weihnachten têm o mesmo significado e a mesma força como festividade de excelência, nas línguas inglesa, francesa e alemã.
Desde tempos imemoriais que o verdadeiro espírito de Natal se associou também na ajuda aos mais necessitados, aqueles que por razões diversas sentiram as agruras da vida retirando-lhes o pão, o agasalho, e os meios de adquirir os medicamentos.
Mas a pobreza nos dias de hoje é muito mais lata, onde a droga, o álcool, a má orientação, levam, quantas vezes, à maior das pobrezas.
A todos nós pode um dia bater o infortúnio, como tem acontecido a tantas famílias covilhanenses, às quais lhes surgiu o desemprego não previsto; ou fruto duma catástrofe natural, como os incêndios, as derrocadas, as inundações, um acidente de viação. Aí está a pobreza envergonhada.
Outros ainda há que, vivendo isolados, e não necessitando sequer de ajuda porquanto os seus regulares proventos são suficientes, emaranham-se em desilusões e caem no álcool ou droga e, quando chega o dia do recebimento da pensão, tudo se desfaz num ápice. Urge então que alguém responsável lhes possa gerir o que é suficiente para o seu sustento. É outra forma menos peculiar de pobreza.
Outros, ainda, com base nesta palavra, usam e abusam dela, num oportunismo à sombra duma disfarçada pobreza, num disfarce que leva ao cepticismo de quem já lhes passa ao lado.
Mais revoltante que aqueles que não fazem esforço para sair da pobreza, são alguns “fazedores” da caridade, que utilizam em benefício próprio, ou de terceiros, os recursos disponibilizados, ou ainda por outras formas os subtraem aos devidos destinatários, num contraste com o real e dignificante trabalho que outras pessoas, de boas intenções, se envolvem no trabalho das instituições de solidariedade social, procurando ajudar e direccionar os recursos conseguidos na distribuição aos verdadeiros necessitados.
São esses desavergonhados pobres de Cristo que muitas vezes levam ao descrédito das instituições onde muitos trabalham arduamente, com sacrifício após dias de trabalho intensivo, em prol da autêntica caridade, numa verdadeira ajuda ao seu semelhante.
Por isso há que haver todo um sentido responsável em procurar sanar os males e as feridas de quem sofre da pobreza, que um dia lhes bateu à porta, ou que da mesma jamais se libertaram.
É que o Natal não deverá existir só em Dezembro, mas todos os dias do ano!

(In “Notícias da Covilhã”, de 19/12/2003)

11 de abril de 2003

CRÓNICAS DA RUA DIREITA

“Quero falar com o Sr. Campos Melo” – Foi assim que o então decano dos jornalistas portugueses e, nesta actividade, o mais velho do mundo (94 anos na altura), com uma juventude a caminho do centenário, ao qual viria a conseguir chegar, em 2002 – e, pouco depois, passaria para a outra margem da vida – se dirigiu telefonicamente ao autor destas linhas.
Corria o ano de 1996 e o lapso de memória deveu-se ao facto do popular Fernando Pessa ter confundido o nome do subscritor que assinava a carta-convite, da Associação a que o mesmo presidia, para apadrinhar uma homenagem aos mais antigos da Covilhã e seu concelho, das várias actividades económicas, e cujo documento encimava com o timbre que também tinha o nome Campos Melo.
Efectivamente, o criador da célebre expressão: “E esta, hein?”, acabaria por não se deslocar à Covilhã, apesar de termos conseguido a sua anuência, porquanto o Presidente da Câmara de então, a quem previamente lhe colocámos o nosso alvitre, e nos mandou avançar, acabaria por nos deixar sozinhos no terreno.
A homenagem que sugerimos, com o apadrinhamento do nonagenário e prestigiado Fernando Pessa, visava, duma forma tão simples quanto inédita, juntar, de uma só vez, as figuras com mais anos de trabalho, nesta cidade e concelho, como covilhanenses, de raiz ou pelo coração, que ainda se mantinham em actividade, há muitos anos, dedicando o seu melhor e a sua vida ao serviço das várias tarefas em prol da Covilhã (das mais complexas às mais simples).
Seriam, pois, os mais antigos covilhanenses, de ambos os sexos, que representariam, cada um, uma única actividade: a INDÚSTRIA, nas várias vertentes (lanifícios, hoteleira, confecções, transportes auto, reparações auto, construção civil, alfaiataria, cabeleireiro, barbearia, carpintaria, marcenaria, entre outras, existentes no concelho); o COMÉRCIO: o velho merceeiro, comerciante de café e pastelaria, de pronto-a-vestir, como de retrosaria, o livreiro, papelaria, até ao vendedor ambulante; AGRICULTURA: o mais velho dos agricultores, como do negociante em pecuária; o ENSINO: o mais idoso professor do ensino básico, do secundário e do superior; os SERVIÇOS: médico, enfermeiro, seguros, bancos; a PROFISSÃO LIBERAL: advogado, contabilista, etc.; o RELIGIOSO: sacerdote, missionário(a), freira; o PÚBLICO: serviços de segurança (PSP.GNR), funcionário autárquico, do sistema fiscal, da Segurança Social; MOVIMENTO ASSOCIATIVO: o mais antigo associado de todas as colectividades e associações; a DONA DE CASA (em representação de todas).
Não se tratava duma utopia mas duma proposta interessante de reconhecer, no mundo laboral – juntando a força empresarial e a sua mão-de-obra – entidade patronal e trabalhador – quem se dedicou longos anos ao dirigismo, no ruído dos teares, nos milhares de quilómetros pelas estradas fora, na sementeira, trabalho e recolha dos produtos agrícolas, na formação de alunos, no tratamento das doenças, na religiosidade (embora não seja uma actividade profissional), no tratamento das lides caseiras, enfim, com a presença sempre alegre e de um grande humor, como era o popular jornalista, Fernando Pessa, que se faria acompanhar da televisão.
Restou-nos a sua despedida, pelo telefone: “Olhe, quando vier a Lisboa, telefone-me para irmos comer uma feijoada e contar umas anedotas...”
Vem isto a propósito da crónica que direccionámos hoje para os mais antigos da Rua Direita, desta vez, na sua qualidade exclusiva de servidores no mundo laboral.
De facto, o mais antigo empregado duma casa comercial sediada nesta rua, ainda no activo, dá pelo nome de JOSÉ MANUEL BRITO.
Sempre na Casa Dinis, onde entrou com 13 anos, e acabaria por casar com uma sua colega, este veterano já vai em quase meio século de trabalhador por conta de outrem e, nos seus 48 anos de ligação aquela casa comercial, está como o Vinho do Porto, cada vez mais activo a trabalhar.
Isto contrasta com outros mais novos, que, fruto de reformas antecipadas, passeiam nessa condição, pela Rua Direita, quando há tanto trabalho a desenvolver, ainda que gratuito, no meio associativo e até da solidariedade social, cada vez mais necessária nos dias de hoje.
Pois, o JOSÉ MANUEL, como é conhecido, além da sua “enxada” quotidiana, ainda se dedica ao associativismo, tendo pertencido a vários elencos, já lá vão 40 anos, no GIR do Rodrigo, sendo o seu esforço inegável na colaboração que tem prestado em várias actividades desenvolvidas por esta colectividade de prestígio.
E, como não sabe dizer não a quem dele se abeira, também participou no trabalho de colaboração nas profundas obras de melhoramentos na Capela do Bairro do Rodrigo.
Tem três filhos que se orgulham do pai – um exemplo de trabalhador.
Demos como referência o mais velho dos empregados num estabelecimento comercial da Rua Direita, como poderia ter sido noutro serviço.
Não podemos, nem é esta a intenção, falar de todos quantos têm também muitos anos de serviço no mundo do trabalho, isso seria impensável, pois outros há, como sempre houve, pelo que falamos somente no que é mais antigo.
Fazemos aqui uma pequena excepção, já que AURÉLIA COUTO GABRIEL COSTA, igualmente empregada numa casa comercial na Rua Direita – A Casa Fael – também já leva 46 anos de atendimento ao balcão. E só na Rua Direita.
Dois exemplos de bons trabalhadores.

(In “Notícias da Covilhã”, de 11/04/2003)

Boas Vindas

Bem-vindos a “Entre as Brumas da Memória”, espaço que destino para memorizar, em textos já publicados, e não só, aspectos, atitudes, e assuntos que estiveram em voga e que o tempo não consegue dissipar das nossas mentes, num revigorar das memórias, geralmente com pretexto para assuntos da actualidade.
Aqui poderão, sem rodeios ou receios, comentar, e criticar o que bem entenderem, de forma a ser estabelecido um diálogo que possa avivar, esclarecer ou extrair dúvidas sobre o que vier a ser apresentado.
Face à minha actividade profissional, apenas posso assumir um compromisso mensal na actualização deste blog.
Alguns artigos e as últimas crónicas que publico no Notícias da Covilhã e Kaminhos, aqui vão inseridas, e, como poderão verificar, a “memória”é o factor que predomina mas, também, a “crítica”, numa posição de verticalidade, independentemente de a mesma poder atingir algum amigo, sem o desejo de ferir qualquer susceptibilidade.
Pois, Amigo ou Amiga, aqui fica um espaço à disposição, sendo certo que muito há que dizer, que reflectir, que ponderar, que recordar...
Com as primeiras e melhores saudações.