3 de agosto de 2006

CRÓNICA EM TEMPO DE FÉRIAS

Não escasseiam os temas, tal a abundância de eventos neste cantinho à beira-mar plantado.
Da cidade alfacinha, a notícia: o sobrinho Hugo, de 22 anos, passou a engrossar o número dos engenheiros.
Muitos são os empresários que, apesar do estoicismo com que vivem estes tempos de agruras, ainda não sentem correr nas suas veias o sangue da tranquilidade. E a nossa região é uma das mais afectadas pelo pernicioso vírus da crise, longe de ser debelado.
Na generalidade, esta região tem empresas familiares, aquelas que terão mais longevidade, na opinião de Belmiro de Azevedo.
E o sustentáculo dessas mesmas empresas, braço forte do seu desenvolvimento – os trabalhadores – transfigurou-se dum sorriso próprio de quem, ontem, respirava sem sufoco; e, hoje, o seu semblante passou a estar carregado de preocupações pelas névoas que persistem no horizonte.
Dava gosto ver nas empresas, dos vários ramos de actividade; e em diversas instituições; gabinetes e escritórios ocupados com gente de trabalho, num salutar ambiente de camaradagem; hoje, é confrangedor o silêncio desses espaços transformados em arquivos mortos; e outras utilizações; onde nas reformas implementadas se teve que reduzir a máquina humana, multiplicando-se assim por várias tarefas.
E, se atentarmos no respeito que a pessoa merece, entre empregado, empregador e colegas do mesmo ofício, neste mundo globalizado, que, para muitos, não passava de um mito; e, para outros, o desenvolvimento veloz da era informática era palavra vã; a viragem de Portugal seria bem diferente.
Os valores da vida são, muitas vezes, deixados para segundo plano. A responsabilidade individual na execução das tarefas, e o relacionamento de excelência entre todas as partes envolvidas, certamente que moldaria a face de muitas empresas.
Neste País de brandos costumes não pode haver diferenças tão abismais entre ricos, desafogados, remediados e aflitos, no respeito pela dignidade do homem e da mulher.
As grandes superfícies vieram beneficiar o consumidor; mas o comércio tradicional foi abanado com encerramento de estabelecimentos e consequente aumento do desemprego. Para agravar a situação, surge o grande “supermercado” do mundo – a China, por todos os cantos das cidades e vilas.
Reclama-se e exige-se respeito: na política, na moda, na fiscalidade, na saúde, na religião, na sexualidade, nos serviços contabilísticos.
As declarações, na RTP, do dirigente fascista da Frente Nacional e militante do Partido Nacional Renovador, num incitamento à violência armada; e, após a sua detenção, a permissão das suas declarações, assumindo-se vítima e “preso político”, em pleno carro celular, foi uma autêntica falta de respeito aos portugueses, e à democracia que o mesmo odeia.
Os limites da tolerância são a própria intolerância, não podendo a democracia ser conivente ao albergar todos os que se servem da mesma para pôr em causa a própria democracia.
O governo de Sócrates tem feito esforços para transformar este país num espaço onde se possa viver melhor; e Miguel Beleza tem razão ao ter afirmado que o Governo tem revelado coragem nas medidas fiscais, não se tendo guiado por calendários eleitorais ou de ordem política.
Contudo, alguns dos seus correligionários, apregoando justiça e respeito pelos outros cidadãos; e também os responsáveis da oposição; bem depressa inverteram a situação, numa atitude em que o respeito se substitui pelas conveniências próprias, pelos direitos adquiridos para si, não para os outros. Onde está a moralidade e o respeito pelos cidadãos, os que depois de longos anos de trabalho se viram reduzidos a uma reforma insignificante em contraste com as luxuosas aposentações que se vêem por esse mundo autárquico e da governação; obtidas, muitas vezes, quase à sombra da bananeira; enquanto outros a usufruírem de pequenas remunerações vitalícias, de trabalho encharcado no suor dos pés à cabeça?
Respeito é olhar de frente para os muitos funcionários públicos, que os há, e que são mouros de trabalho; e funcionários de excelência, que também os há; mas manter a coragem numa disciplina enérgica de reforma da função pública, acabando com privilégios de que são detentores, em desfavor de outras classes trabalhadoras, grassando uma injustiça em termos de igualdade.
E o grito dos professores, cuja actuação dos seus líderes sindicais veio provar que, afinal, a generalidade do povo português não lhes dá razão, é mais um exemplo de que o respeito é uma palavra muito bonita.
E, neste contentamento descontente, como refere Carlos Magno, no DN, o governo resiste ao desgaste.
Muito haveria para dizer, sobre a respeitabilidade, não fosse este espaço limitado; como os faustosos vencimentos dos senhores da bola (dos poucos passatempos que fazem delirar ricos e pobres, endinheirados e necessitados). Por respeito aos portugueses, Gilberto Madail deveria envergonhar-se de sugerir a isenção do IRS nos prémios que os jogadores da Selecção Portuguesa vão receber; apesar de se ter quebrado um tabu de 40 anos para apuramento da segunda fase de um Mundial, com valor e talento, mesmo com a existência de alguns scolaricépticos. E também figuras como Maria João Pires, numa atitude indigna para com Portugal, a quem muito deve, criticou e esqueceu-se dos investimentos que lhe proporcionaram, e do dinheiro que recebeu. É que o respeito é muito bonito!

(In “Notícias da Covilhã”, de 03/08/2006)