25 de outubro de 2007

PORREIRO, PÁ!

Vários eventos têm sido objecto de comemorações durante 2007 que vão desde os 90 anos das Aparições de Fátima ao Cinquentenário de outros acontecimentos, como o registo das primeiras emissões da televisão em Portugal, da erupção vulcânica dos Capelinhos, na ilha açoriana do Faial, ao lançamento do primeiro satélite artificial Sputnik, e, até noutra via, o I Congresso Republicano, que juntou em Aveiro os oposicionistas ao Estado Novo, e num ambiente mais próximo dos covilhanenses – o cinquentenário da participação do SCC na Final da Taça de Portugal.
Não fôra a crise generalizada por que todos estamos passando, dizemos, quase todos, poderíamos expressar-nos num “porreiro, pá!”.
Recordamo-nos de ler no Diário de Notícias, há 50 anos, em grandes parangonas, os títulos e as fotos desse vulcão. Por estranho que pareça, no museu dos Capelinhos, as fotografias que lá se encontram são unicamente do jornal Açoriano Oriental. Também recordamos, há cinquenta anos, o primeiro satélite lançado no espaço e a cadela Laika, o primeiro ser vivo lançado no mesmo.
Com isto e o ouvir ainda o som da flauta do amolador, como há dias, esta arte em extinção para afiar tesouras, facas de cozinha ou consertando chapéus-de-chuva, e o que também faziam antigamente, reparar fundos de tachos e alguidares, não fôra a crise generalizada por que todos estamos passando, dizemos, quase todos, poderíamos expressar-nos num “porreiro, pá!”.
Nestes 50 anos, mormente nas duas últimas décadas, vimos desaparecer vultos da cultura portuguesa, como António José Saraiva, Natália Correia, Miguel Torga, Agostinho da Silva, Vergílio Ferreira, José Cardoso Pires, Eduardo Prado Coelho, e, no que à música portuguesa diz respeito, começámos o ano a falar de Zeca Afonso e acabamo-lo a falar de Adriano Correia de Oliveira, nas comemorações dos 20 e 25 anos das suas mortes, respectivamente. Reviver as suas obras, e não fôra a crise generalizada por que todos estamos passando, dizemos, quase todos, poderíamos assim expressar-nos, na ribalta das suas obras – “ porreiro, pá!”
Começou há pouco tempo o novo ano escolar, com a calculadora de regresso ao ensino básico, e se a tabuada ou as regras de divisão ou saber tirar a “prova dos nove” não ficassem para depois e não continuássemos a ser surpreendidos com os maus resultados registados em matemática, não obstante a crise generalizada por que todos estamos passando, dizemos, quase todos, poderíamos assim expressar-nos: “porreiro, pá!”.
Regressando às comemorações das Aparições de Fátima, há nove décadas, aí temos a recente inauguração da quarta maior igreja católica do mundo – a Igreja da Santíssima Trindade, com 12.300 m2, em Fátima, com capacidade para nove mil pessoas – que custou 80 milhões de euros! Não obstante a crise generalizada por que todos estamos passando, dizemos, quase todos, e na abundância de tanta massa para aquelas bandas, apraz-nos dizer: “porreiro, pá!”
Depois da quantidade de estádios de futebol construídos com parte do dinheirinho cá da malta, e após um período áureo de scolarização, com bandeiras portuguesas a flutuar por todo o lado, e para todos os gostos, desde soutiens a estendais em tudo o que era sítio, as bandeiras murcharam e parecem agora reviver um pouco com as últimas vitórias da selecção nacional lá para as bandas do Mar Cáspio, abrindo uma semana de elevação para a auto-estima pátria, pelo que, apesar da crise generalizada por que todos estamos passando, dizemos, quase todos, podemos sorrir num “porreiro, pá!”
A globalização está aí. O mundo encolheu e o tempo acelerou e hoje é cada vez mais plural. É um mundo onde o peso de novos actores como a Índia ou a China é inquestionável, e onde a Europa, que esteve historicamente na origem do paradigma global, se defronta com dificuldades indisfarçáveis.
Não obstante o mau agoiro na expressão de António Barreto, no “Público” de 14 de Outubro, em que a presidência portuguesa seria a agência funerária, o primeiro-ministro português o mestre-de-cerimónias e o cangalheiro, presidente da Comissão, também um português, viriam as suas profecias a ser ultrapassadas pela vitória da Cimeira dos 27, com o acordo global do Novo Tratado europeu acordado em Lisboa, pelo que José Sócrates, depois do “brilharete” no défice a colocar Portugal dentro das regras do PEC e com os portugueses em segundo lugar na integração de imigrantes na UE, pôde puxar dos galões e expressar-se, ainda que baixinho: “porreiro, pá!”

(In Notícias da Covilhã e Kaminhos de 25/10/2007)