22 de outubro de 2014

ENTRE HOMENS SEM ALMA

São notícias do dia-a-dia. Eles são criminosos, outros ladrões. Há corruptos e traidores. Matam inocentes por ódio e ambição. Voltam a fazer escravos. Eles são homens sem consciência. Seus corações são inexistentes e não têm alma. Vivem interiormente como bestas no cometimento das suas barbaridades. Tragédias ou desgraças são palavras que não conhecem, ou desejam omitir. Pensam e materializam esse pensamento. São homens sem alma! Fanatismo é um dos seus ideais. Um humano é como um irracional. A brutalidade, no desígnio da sua divindade, é duma feroz loucura. Inocentes condenados e famílias destroçadas. Eles são homens sem alma!
Já vai na quarta vítima dos jihadistas do Estado Islâmico, com decapitações sob as garras desses terroristas bárbaros e repugnantes. Depois dos jornalistas norte-americanos James Foley e Steven Sotloff, seguiram-se no martírio os britânicos David Haines e Alam Henning, mesmo a trabalhar no voluntariado em organizações não-governamentais, em prol dos países que lhes dão guarida. Mas os carrascos são homens sem alma!
São mais de trinta mil esses combatentes do Estado Islâmico que domina uma vasta faixa territorial entre a Síria e o Iraque, e a sua raiva já não é só sobre os americanos e britânicos, estende-se também aos franceses e aos ocidentais na sua generalidade, assim como à Austrália.
Eles aproveitaram a Primavera Árabe de 2011, e a liberdade das eleições para tentar subvertê-la a seu favor. Os extremistas islâmicos que proclamaram o califado no Iraque e na Síria apelam à violência, e violência extremamente feroz, com métodos medievais nas execuções.
E na aderência a este grupo terrorista, recrutados muitas vezes por via da Internet, também há ocidentais. Para além dos ingleses, também franceses, alemães e de outros países, e, como não podia deixar de ser, consta que há doze jihadistas de origem portuguesa na Síria e no Iraque. São filhos de emigrantes e vivem na Europa. Consta ainda que um deles já cometeu em atentado suicida no Iraque. Um é de Trás-os-Montes e outro, engenheiro de profissão, é de Lisboa.
O autodenominado Estado Islâmico (EI), que de Estado nada tem, está também agora a atrair mulheres norte-americanas, recrutadas para serem “fábricas de bébés”, com o objetivo de aumentar a população do Califado que pretendem criar, fenómeno que já não é estranho, onde se inserem adolescentes, recrutadas através da Internet.
Ora, que balanço podemos fazer da luta contra o terrorismo, treze anos volvidos sobre os bárbaros atentados que mataram milhares de pessoas nas torres gémeas de Nova Iorque? Será que o mundo está mais seguro? A Primavera Árabe acabou por se transformar num Inverno: Iraque, Líbia, Síria e Egito caíram no caos. Os que se consideram agora libertadores ultrapassaram na violação dos direitos humanos os assassinados Saddam e Kadhafi, e Assad e Mubarak. E se este pretenso Estado Islâmico, entre o Iraque e a Síria, que se propõe construir um Califado, num desejo de extermínio de milhares de infiéis que professam uma religião diferente, outro “Estado Islâmico”, a Sudoeste da Nigéria, dedica-se a raptar meninas que depois vende a pedófilos, como castigo por terem aprendido a ler e a escrever. Santo Deus! Qual é a divindade destes loucos, muito próximos dos irracionais?
Ao longo de toda a história universal encontramos guerras, conflitos, situações geradas e que poderiam ter sido evitadas. Acabou a Guerra Fria mas logo surgiram novas situações de conflitos no globo. Temos agora, para além de outras preocupações, o medo do “Estado Islâmico” (EI) – ou ISIS ou ISIL – que reúne a fação mais radical da jihad, ou seja, a guerra santa, que, apesar de recente, já se distinguiu pela sua crueldade e primitivismo.
Tem o Ocidente que fazer um esforço para separar os países que se envolveram na luta pelo Estado Islâmico, ou pelo Iraque, ou qualquer outra ambição de conquista ou vingança. E também tem que tomar as precauções necessárias para que a jihad não penetre no seu território.

(In "Notícias da Covilhã", de 23.10.2014) 

MARIA IVONE DE JESUS PINTO MANTEIGUEIRO VAIRINHO

Não é fácil falar sobre uma personalidade covilhanense por quem tive grande amizade e que nos compreendíamos pela envolvente cultural que nos tocava, tantas vezes no caminho da nossa Terra-Mãe.
Maria Ivone Manteigueiro, que nasceu na Covilhã em 27 de Fevereiro de 1936, desde muito jovem, e ainda na adolescência, se evidenciava, na Covilhã, no âmbito cultural, pelas excelsas qualidades que possuía e lhe fervilhavam da sua jovialidade, num encontro do saber e do saber fazer, de tal forma que a Covilhã, após a década de cinquenta do século XX, já era uma cidade pequena para ela.
Com 9 ou 10 anos fez a sua estreia no teatro – no teatrinho do salão paroquial de S. Pedro, como lhe chamava – e, mais tarde, ensaiou as primeiras pequenas peças de teatro que, entretanto, ia escrevendo, nos seus 13 anos.
O ensino na Covilhã, e no País, não tinha a evolução dos tempos de hoje – e o que era isso de novas tecnologias? – e, assim, o nosso Liceu só tinha o 1.º ciclo, à altura. Como Maria Ivone queria muito mais, e até  mesmo por um impulso familiar, optou pela Escola Industrial, onde o ensino se prolongava até ao 5º. ano industrial, e aí prosseguiu os seus estudos até que já no 4.º ano industrial, o então dinâmico director da Escola,
Eng.º Ernesto de Melo e Castro, conseguiu que na Escola fosse também criado o Curso Comercial. Aconselhou a jovem aluna  a mudar de curso, a qual sobressaía pelo seu valor académico.  E ei-la a ser a aluna mais distinta da Escola e a ganhar prémios entre os quais a de ter sido a 1ª classificada dos Cursos de “Formação Geral do Comércio” e “Complementar do Comércio”.
Mais tarde viria a completar os cursos do Instituto Britânico e Alliance Française, assim como a diplomar-se em estenografia portuguesa, francesa e inglesa.
E é já na sua actividade profissional ao serviço da ex-Sacor e depois Petrogal, como Secretária do Conselho de Administração que frequentou um curso internacional além de outros de informática e técnicas de secretariado.
Mas, voltando à sua juventude, na Covilhã, as peças de teatro e autos de Natal, que escrevia, foram por si representadas na Escola Industrial e Comercial Campos Melo e no já referido teatrinho do Salão Paroquial de São Pedro, mas também contos e poemas que viriam a ser publicados em diversos jornais e revistas, tendo ganho quatro primeiros prémios em contos, e uma menção honrosa em Poesia Lírica no I Concurso Literário da ex-Sacor.
Com guião e direcção do Padre José Domingues Carreto, foi a protagonista do filme “Dois Caminhos”, que relatava a luta de uma jovem operária, militante da JOCF, na defesa da mulher no mundo do trabalho, tinha Maria Ivone 15 anos.
As gentes mais antigas poder-se-ão recordar do retumbante êxito de Maria Ivone na
festa de finalistas de 1955/56, na representação de “Auto da Alma, Todo o Mundo e Ninguém” e “Súplica de Cananeia”.
Mas já antes, em 1952/53, no ressurgimento do Orfeão da Covilhã, começou a fazer parte do grupo de teatro. Declamava entre a 1.ª e a 2.ª partes da actuação do Orfeão. Foi criado o grupo folclórico que levou o folclore beirão a vários pontos do País, onde Maria Ivone fazia o papel de “Covilhã”, apresentando e explicando os números que o grupo exibia e declamando também.
Em 1954, aquando da inauguração do Teatro-Cine da Covilhã pela Companhia de Teatro Nacional Amélia Rey Colaço – Robles Monteiro, Maria Ivone representou um monólogo de Alice Ogando, tendo o casal de actores ficado muito agradado, o que proporcionou lhe  abrirem as portas do Teatro Nacional, oportunidade que não pôde concretizar.
Mas, com estes seus dotes de mulher multifacetada, colaborou em concertos da “Pró-Arte”, dizendo poemas ilustrativos de diversos andamentos de Sinfonias de Beethoven.
No cinquentenário do Monumento de NosNeves e de Maria Alberta Menéres, na sessão solene, a que presidiu o Núncio Apostólico em Portugal, Cardeal D. Fernando Cento.
sa Senhora da Conceição, na Covilhã, declamou poemas do Padre Moreira das
Com o pseudónimo de Ivone Beirão, em 1959 pertenceu ao Centro de Preparação de Artistas da Rádio. Gravou programas  nos estúdios da Emissora Nacional, na Rua do Quelhas, e estreou-se num Serão para Trabalhadores, no Pavilhão dos Desportos, no Parque Eduardo VII. Nessa altura teve também lições de arte de dizer.
Entretanto, ia escrevendo, tendo publicado quatro livros (entre os 20 e os 23 anos), dum mercado específico da Agência Portuguesa de Revistas que tinha aberto uma porta a “Novos Escritores Portugueses” – “Linhas Trocadas”, “Amor Cigano (1.ª e 2.ª edição)”, “Humilhação de Amor” e “Uma Mulher Moderna” – os romances; e, já mais recentemente,  “Livro da Dor e da Esperança”, em poesia, apresentado no Salão Nobre da Câmara Municipal da Covilhã.
Escreveu também largas dezenas de contos e crónicas que foram publicadas em revistas e muitos jornais, como já referi.  Foi colaboradora da Crónica Feminina, nos seu anos de ouro, de 1957 a 1982, com uma página semanal (conto ou crónica).
Também foi colaboradora do jornal “Poetas e Trovadores” e participou em 12 Antologias da Associação Portuguesa de Poetas.
As suas biografia e bibliografias estão incluídas em vários livros.
Em 02.10.1961, Maria Ivone casou com Victor Vairinho e foi para Lisboa, empregando-se na Sacor. Passou a ser então a Maria Ivone Manteigueiro Vairinho.
Em 1966 fez parte do “Teatro do Pessoal da Sacor”, tendo depois realizado Serões Culturais Vicentinos. Colaborou em diversos Saraus de Poesia, sempre a poesia…
A convite da ex-FNAT, representou no Teatro da Trindade, em Lisboa; no Luísa Tody, em Setúbal; e nas instalações da ex-Sacor em Lisboa, Cabo Ruivo e Faro.
Continuou a escrever os seus contos mas teve uma excelente proposta para fazer traduções de Francês, Inglês e Espanhol, e, por isso, não voltou a publicar mais romances originais. Tem várias dezenas de livros traduzidos de Espanhol, Francês e Inglês (entre eles a série Dallas, da Televisão, e Robinson Crusoe, editadas pela Agência Portuguesa de Revistas e Circulo de Leitores).
Na Biblioteca Nacional (Base Nacional de Dados Bibliográficos) tem registados em seu nome 239 livros (traduções e originais).
Reformando-se aos 56 anos, recomeçou as suas actividades literárias e artísticas e é então que começa a escrever poemas.
Foi ao auditório da RTP onde declamou e recebeu uma proposta para fazer parte da Associação de Poetas Portugueses (APP).
Proferiu diversas palestras e conferências, em vários locais do País.
Foi Presidente da Direcção da Associação Portuguesa de Poetas e Directora do seu Boletim.
Desde 2001 que Maria Ivone  dava aulas de “Ler…e Dizer – Oito Séculos de Literatura Portuguesa/Poesia”, na Universidade Sénior de Oeiras.
Era sócia da Associação Portuguesa de Poetas, Associação Portuguesa de Escritores e Sociedade Portuguesa de Autores.
Mas…poderão perguntar alguns das gerações mais novas, ou, outros, do seu tempo, menos interessados pelo fenómeno cultural: quem era Maria Ivone que aqui se narra?
Maria Ivone Manteigueiro, como era conhecida, e, depois, Vairinho pelo casamento, era  a mais nova de três irmãos: Armanda e  Francisco Manteigueiro, que foi velha glória do Sporting da Covilhã e também meu bom amigo. Quis Deus que o Francisco deixasse o mundo dos vivos em 9 de Novembro de 2011 e aguardasse pela companhia de sua querida irmã, volvidos pouco mais que dez meses, em 7 de Setembro de 2012.
A Maria Ivone era uma pessoa de raras qualidades, humilde, sem dar nas vistas, orgulhosa da sua Covilhã, amiga do seu amigo, de grande sabedoria que com facilidade assimilava e se reflectia na sua pessoa como mulher multifacetada. Depois, acabaria na sua grande paixão – a poesia, depois do teatro.
Mas isto é o suficiente para tão grande reconhecimento de mulher covilhanense?
Maria Ivone Manteigueiro Vairinho tinha na sua alma a Covilhã, sempre a Covilhã e as coisas lindas desta cidade maravilhosa!
É que, vivendo mais de meio século na cidade alfacinha, a sua voz, transcrita para o papel e para a declamação, em vários pontos da cidade lisboeta, transmitia na sua alma a Terra-Mãe que a viu nascer – a sua Covilhã, como a conheceu e a ia vendo transformar-se.
Os covilhanenses não se aperceberam!
Adicionar legenda
Houve várias ocasiões em vida, na Covilhã,  que foram merecedoras do seu reconhecimento público, mas tal não aconteceu, tendo sido  como que votada ao ostracismo. Mas, na outra cidade onde vivia – Lisboa, e também  Oeiras – Maria Ivone foi merecedora do reconhecimento dos seus méritos, tantas vezes aclamada no dizer das suas poesias, quando antes o fôra também na parte teatral.
Sabia ela que este seu amigo era ainda o que ia dando conhecimento público, na comunicação social, do valor da sua pessoa, e das suas obras, tendo a oportunidade de o fazer por várias ocasiões.
Por isso, me passou a enviar o Boletim Trimestral Informativo e Cultural da Associação Portuguesa de Poetas, à qual presidia. Guardo-os ainda religiosamente, para saborear, de quando em vez, as suas poesias, muitas delas declamadas em locais como no Centro Cultural de Belém e no Mosteiro dos Jerónimos, onde seria a sua última homenagem, já fora do mundo dos vivos.
E que doce a leitura dos seus versos, ora em redor da sua família, mormente a mãe, ora noutras direcções do seu pensamento de covilhanense de raiz. Respigo alguns títulos da sua vasta obra:  O Menino Jesus e as Crianças; Noémia; Os olhos das crianças; Lua Branca em Céu Azul (sobre a Covilhã); Tecelão da Covilhã; 25 de Abril; Olhos secos de dor; Árvore da Vida (sobre a Covilhã e a família); A Matança dos Inocentes; Meu Canto de Cisne.
Em 1 de Março de 2008, as suas amigas e amigos poetas, homenagearam a Presidente da Direcção da APP:

“Com a Lira no coração
faz da ética o seu bordão.
Tem uma chama sempre acesa
na sua alma poética
e na sua forma de amar
a nossa Língua Portuguesa”.

E, a poetisa Virgínia Branco, tesoureira da Associação Portuguesa de Poetas, referia-se assim a Maria Ivone Vairinho:
“Encontro-me hoje e aqui a prestar homenagem à grande amiga que muito prezo, à Professora, à Tradutora, à Escritora, à Conferencista, à Poetisa e Declamadora, mas acima de tudo à Digma Presidente da Associação Portuguesa de Poetas, nau que tão dignamente tem sabido levar a bom porto, servindo-a sem nunca se servir.
Para Maria Ivone não há dia ou noite, apenas conhece trabalhos a apresentar e prazos a cumprir, pois é dotada de grande carácter e firmeza, pessoa de uma só palavra.
Maria Ivone Vairinho é um Ìcone da cultura portuguesa, possuidora ela própria de uma vasta cultura é há muito um grande vulto nas Letras e na Poesia”.
O meu preito de gratidão à Maria Ivone, pela grande amizade que teve para comigo, que é, como dizer, para com a nossa Terra-Mãe – a Covilhã, e que lá dos céus possa gozar a plenitude da glória que sempre mereceu.
À família, mormente ao meu especial amigo Victor Vairinho, e à Mané, a certeza de que hoje, dia 20 de Outubro de 2014, no Salão Nobre da Câmara Municipal da Covilhã, é prestada a homenagem, há muito devida, à vossa mui amada esposa e mãe – a Maria Ivone, com a atribuição da Medalha de Mérito Municipal – Classe Prata, a título póstumo!

João de Jesus Nunes



14 de outubro de 2014

UM PAÍS ADIADO

Depois do adeus à troika, o recuperar da nossa soberania e poder de decisão independente ainda estão longe.
Continuamos um país adiado e sob tutela apertada, e assim continuaremos enquanto não tivermos juízo.
Segundo se consta, a troika tem um compromisso de nos “deitar a mão” caso as condições dos “mercados” nos obriguem, de novo, a que estendamos a mão à caridade.
Continua a haver fonte de desperdício e de dinheiro mal gasto no setor público, onde ainda não foi organizado.
Dou um exemplo recente, de desorganização, que já vem de anos atrás, e isto no que se refere à distribuição dos excedentes alimentares da União Europeia, da responsabilidade da Segurança Social.
Na Covilhã, das listas de carenciados fornecidas à Segurança Social pelas instituições de solidariedade social, como as Conferências Vicentinas, foram eliminados vários nomes, muitos deles verdadeiramente carenciados, o que causou estranheza nos meios que prestam, num autêntico espírito de voluntariado, um bem às pessoas desprotegidas.
Aconteceu, porém, como vem sendo hábito, que a Segurança Social, instituição pública, acabou por distribuir, a cada elemento das suas listagens de carenciados, quantidades enormes como, por exemplo, duas ou três dezenas de cada género alimentício (açúcar, arroz, massa) a uma única família, o que naturalmente leva a que essa pessoa não consiga consumir tudo dentro do prazo de validade, e não tenha espaço nas suas casas para tanto género alimentício, originando, várias vezes, termos visto nos contentores do lixo quantidades desses produtos deitados fora. Entretanto, para trás ficaram outros que, como já referimos, por estranho que pareça, ficaram sem esses produtos.
Será isto uma boa gestão? Já muitos contestam o trabalho das Assistentes Sociais, que deveriam andar no terreno, em ação profícua, e não nos seus gabinetes.
Entretanto, sobre este assunto, no início pretendiam que fossem as Conferências a fazer a distribuição direta dos produtos oriundos dos excedentes da UE, mas teriam que efetuar um trabalho burocrático, que não lhes competia, e para o qual as Conferências Vicentinas se negaram já que compete à Segurança Social trabalhar, como empregados públicos que são, e não quem tem já tanto serviço de voluntariado a fazer, muitas vezes sem mãos a medir.
Assim, não, não vamos lá.
“Nenhum grupo etário é tão afetado pela privação como as crianças. Segundo o Instituto Nacional de Estatística, no ano passado, 2,2% dos menores de 15 anos pertenciam a famílias que não lhes garantiam pelo menos uma refeição diária de carne ou peixe e 1,4% não comiam fruta e legumes uma vez por dia. É de gente que salta refeições ou come mal que se fala quando se fala de fome em Portugal”, segundo afirmou Eugénio Fonseca, presidente da Cáritas Diocesana.
Se formos levantar o véu doutras instituições públicas, como alguns serviços de enfermagem dos Centros de Saúde, então teríamos muito para contar.
Outro setor que nos faz um país adiado são os serviços judiciais, com a investigação criminal lenta e má, não conseguindo produzir prova de qualidade, em particular nos crimes de colarinho branco na área financeira, mas não só, o que faz com que muitos criminosos, de todas as cores e colarinhos, se consigam escapar pelas amplas malhas deixadas nas teias da lei para quem tem dinheiro para contratar bons advogados. Advogados cujos sócios “deputados” fizeram as leis com os buracos necessários para os seus conhecimentos conseguirem livrar os seus constituintes.
No entanto, mais recentemente, já vemos alguns tribunais com as suas sentenças em que as elites também já não escapam a mão pesada da Justiça.
Costa Freire foi o primeiro político condenado por atos durante o mandato, decorria o ano 1994. Dez anos depois, Maria de Lurdes Rodrigues é sentenciada a mais três anos de prisão. A Justiça portuguesa, dizem alguns juristas e advogados, segundo o jornal i, começa a ter mão pesada nos políticos e não só. Costa Freire, Isaltino de Morais, Armando Vara, Jardim Gonçalves, Ricardo Salgado e, mais recentemente, Maria de Lurdes Rodrigues, são alguns exemplos de como a Justiça portuguesa não tem olhado a elites ou postos quando em causa está uma condenação.
Esperemos que a Justiça dê o volte-face a esta situação, se bem que existe quem julgue que os banqueiros e grandes agentes económicos, assim como outras personalidades de elite, vão a tribunal em desigualdade com os outros cidadãos.
Há por este país escolas privadas muito caras, e portanto só acessíveis a uma minoria de privilegiados, conhecidas por serem excessivamente generosas na atribuição de notas destinadas a subir médias.
Assim como há universidades privadas sem quaisquer requisitos de qualidade e que oferecem “cursos superiores” sem qualquer interesse prático. O grau de exigência do setor privado deveria obrigatoriamente ser idêntico ao do setor público.
Enquanto não nos dedicarmos de corpo e alma, norteados pelos interesses do país e não pelo umbigo partidário, a estudar em profundidade, com técnicos e não políticos, a liderar o processo e a decidir sobre essas áreas não podemos viver tranquilos em Portugal.
Muito, mas muito haveria que dizer, para que este país não estivesse “entregue à bicharada” e, assim, deixasse de ser um país adiado.

(In "fórum Covilhã", de 14.10.2014)


8 de outubro de 2014

A MONUMENTAL TAÇA “O SÉCULO” GEROU CONTROVÉRSIA NA 2.ª DIVISÃO NACIONAL O ESCLARECIMENTO QUE HÁ MUITO SE IMPUNHA

Muito se falou sobre a forma “confusa” como foi atribuída a Taça “O Século” aos clubes da 2.ª Divisão, a qual acabaria por vir a ser ganha pelo Sporting Clube da Covilhã, com todo o mérito.
Dizia-se que só havia em Portugal duas monumentais taças com esta matriz – uma, ganha pelo Sporting Clube de Portugal (SCP) e, outra, pelo Sporting Clube da Covilhã (SCC).
Após aturadas pesquisas conseguiu-se o cabal esclarecimento, cujas dúvidas vinham ofuscando a transparência da informação.

A história desta Taça começa com a iniciativa do diretor do extinto jornal O Século, João Pereira da Rosa, organizando, em 1938, a “Exposição Histórica do Futebol”, para comemorar os 50 anos do futebol em Portugal e, com a respetiva receita, criou duas gigantescas taças, do mesmo tamanho, a que se chamou Monumental Taça “O Século”, destinando-se uma para os Clubes da I Divisão e outra para os Clubes da II Divisão.
“O Século, ao mesmo tempo que fez a encomenda das duas taças, elaborou um projeto de regulamento das taças, que submeteu à apreciação da Federação Portuguesa de Futebol, tendo merecido a sua melhor aprovação.
O Regulamento é do teor seguinte:
Artigo 1.º - As duas taças “O Século”, oferecidas pelo mesmo jornal, para serem disputadas, uma na I Divisão e outra na II Divisão do Campeonato Nacional de Futebol, comemorando a organização das Bodas de Ouro do Futebol Português, que promoveu em Outubro de 1938, serão disputadas nas seguintes condições:
1.º - Ficarão na posse provisória do Clube que se classificar em primeiro lugar na respetiva divisão do Campeonato Nacional de Futebol, com início na época de 1938/39.
2.º - Cada uma das taças passará à posse definitiva do Clube que ganhar em três anos consecutivos, ou cinco alternados, o Campeonato Nacional de Futebol, na respetiva divisão.
Artigo 2.º - No fim de oito épocas, se nenhuma das taças tiver passado à posse definitiva de qualquer Clube, proceder-se-á do modo seguinte:
a)      Se nessa altura nenhum Clube tiver duas inscrições na taça, será a mesma entregue ao vencedor do Campeonato de 1946/47, da respetiva divisão.
b)      Se nessa altura já houver Clubes com duas inscrições alternadas, na época de 1947/48 serão ainda as taças disputadas nos termos do n.º 2.º do art.º 1.º.
c)       Se até ao início da época de 1948/49, nenhum Clube tiver ganho as referidas taças nas condições atrás citadas, serão elas conferidas definitivamente aos Clubes que forem os vencedores das I e II divisões do Campeonato nesse décimo ano da sua disputa.
d)      Artigo 3.º - Se o Campeonato Nacional deixar de disputar-se, não sendo substituído por outra prova semelhante na qual as taças possam continuar a disputar-se, ficarão elas na posse da Federação Portuguesa de Futebol, com destino ao Museu de Futebol Nacional, quando vier a constituir-se.”

Relativamente aos Clubes da I Divisão a tarefa foi fácil na sua definição. À luz do regulamento, ganhou a 1.ª Monumental Taça “O Século” o Sporting CP porque, de 1938/39 (data do início desta Taça) até ao seu termo (1947/48) não houve nenhum requisito conseguido por qualquer clube primodivisionário.
Os vencedores dos Campeonatos das I e II Divisões foram então os seguintes:
I Divisão: 1938/39 – FC Porto; 1939/40 – FC Porto; 1940/41 – Sporting; 1941/42 – Benfica; 1942/43 – Benfica; 1943/44 – Sporting; 1944/45 – Benfica; 1945/46 – Belenenses; 1946/47 – Sporting; 1947/48 – Sporting.
II Divisão: 1938/39 – Carcavelinhos (ganhou na final ao Sp Covilhã, por 1-0); 1939/40 – Sp. Farense; 1940/41 – Olhanense; 1941/42 – Estoril; 1942/43 – Barreirense; 1943/44 – Estoril; 1944/45 – Atlético; 1945/46 – Estoril;
1946/47 – Sp. Braga; 1947/48 (Sp. Covilhã, ficando em 2.º lugar o Barreirense, com o mesmo número de pontos, 8. O SCC teve 17 golos marcados e 7 sofridos e o Barreirense 13 golos marcados e 7 sofridos, o que o inibiu de subir em favor do SCC).
Portanto, o Sporting, analisado o Regulamento da Taça “O Século”, acabou por ganhar a primeira, ao 10º ano, ou seja, na época 1947/48.
Embora tivéssemos desconhecido que o jornal “O Século” deu continuidade a nova Taça “O Século (penso que só para a I Divisão), o mesmo jornal viria a deixar de instituir este troféu a partir de 1953.
Foi entretanto ganha novamente pelo Sporting Clube de Portugal por ter sido vencedor de três campeonatos seguidos, em 1950/51, 1951/52 e 1952/53 (ganhou também o de 1953/54). Esta segunda Taça é também monumental, com 1,40 cm de altura, sendo que a primeira, igual à que possui o Sporting da Covilhã, tem 1,23 de altura.
Relativamente à II Divisão, nenhum Clube conseguiria ganhar três campeonatos seguidos, como é óbvio, já que subiam à I Divisão. Assim, ganhou a Taça “O Século” o SCC, no 10º ano, em 1947/48, precisamente quando subiu, pela primeira vez à I Divisão Nacional.
Estas Taças estiveram provisoriamente em cada Clube (I ou II Divisões), durante o ano em que ganharam os respetivos campeonatos, e iam colocando uma chapinha metálica, na Taça, com o nome do Clube e época. Portanto, as Taças, quer a da I Divisão, quer a que é pertença do SCC, esteve em poder provisório de todos os Clubes que foram ganhando os respetivos Campeonatos, daí se encontrarem algumas fotografias com esta Taça, como é o caso do Olhanense e do Barreirense.
Alguns Clubes, como o Barreirense (livro sobre a história do Clube pág.s 134 e 135), duma forma errónea, bem gravitaram na tentativa de a obter, face à má interpretação do Regulamento, ou mesmo desconhecimento do assunto que a envolveu.
Aqui fica o devido esclarecimento que se impunha.

(In "Tribuna Desportiva", de 6.10.2014; "fórum Covilhã", de 7.10.2014; e "Notícias da Covilhã", de 09.10.2014)