No rodopio quotidiano de muitos covilhanenses, e de outras gentes, que por cá se radicaram, mas também na tranquilidade das férias vitalícias de muitos outros, nem nos damos conta da exemplaridade por que muitos cidadãos aproveitam os valores da vida.
Nos dias que correm, de frustrações para uma mão cheia de gente, mas, paradoxalmente, de combate à crise, na intencionalidade e acção de um bom punhado de cidadãos, não conseguimos a convergência necessária para, num encontro de boas vontades, podermos sorrir num Portugal melhor.
Nos meandros em que nos envolvemos, cada um canta a sua vitória, e cada qual apregoa a derrota do adversário; os amigos tornam-se inimigos, e, depois, quando se é preciso juntar ao “inimigo”, dizem que se viram forçados a tomar um calmante.
Os sacrifícios são generalizados e cada vez mais se fazem sentir, já não sendo necessária a aproximação do Natal para nos lembrarmos dos mais desprotegidos, tal a evidência das suas carências. Os senhores do “pântano”, da “tanga”, e também o da “boa e má moeda” desbarataram oportunidades, não tiveram, ou não souberam encontrar caminhos para a reconstrução deste país. Como no futebol há os treinadores de bancada, também agora surgem vários salvadores da pátria amada.
Quase todos somos de acordo que tem que haver sacrifícios, embora alguns os atirem somente para os seus vizinhos.
Nesta vivência, também na Covilhã, onde já não há só covilhanenses, mas gentes de outras partes do globo, vamos encontrar os “teimosos” na persistência das suas actividades, tentando dar sopros fortes à já enfadonha crise.
Casa Diniz, Casa Fael, Casa Cardona, Casa Lenita, Pastelaria Lisbonense, Casa João Duarte, entre outras, são estabelecimentos de décadas na cidade, que honram a Covilhã pela sua tenacidade.
Face às indústrias de confecções que surgiram por toda a região, agora em sérias dificuldades, houve outrora uma indústria personalizada que quase foi desaparecendo, surgindo apenas dois “teimosos” na Covilhã, e é José Ascensão Mendes o costureiro mais antigo que mantém ainda a sua arte, em grande aventura para os dias de hoje.
E aqueles que se encontram na última rampa da vida? Gostosamente vemos uma pessoa, nonagenária, pouco faladora mas de um coração bom, ainda a caminhar pela cidade, indiferente a outra “crise”, esta da longevidade. É João Matias Ranito, há mais de cinco décadas a residir na Rua Vasco da Gama. Optámos por, na sua pessoa, dos mais antigos reformados covilhanenses, saudarmos todos quantos já assistiram a várias gerações e ainda conseguem sorrir.
Na Covilhã, de cinco paróquias (onde há uns bons anos atrás houve um “quinteto” de párocos saudosos, os padres José Andrade, Domingues Carreto, Morgadinho, José Batista Fernandes e José de Oliveira Pita, e depois, em S. Pedro, o padre Lacerda, todos falecidos) tem o seu pároco mais antigo, Fernando Brito dos Santos, da paróquia da Conceição, que tem sido um incansável pastor, depois de muitos anos em prol dos jovens e da classe operária, e de uma excessiva humildade.
E, para que muitos leitores da imprensa diária possam adquirir o seu jornal, é Fernando Lopes da Silva, na Tabacaria do C. C. da Estação, o mais antigo, não esquecendo também a Papelaria Neves, pela sua antiguidade.
Mas o título desta crónica repercute-se em todos aqueles que, exercendo as suas actividades profissionais, ou já nas suas reformas, conseguem dedicar-se, de alma e coração, décadas sem fim, ao serviço dos outros, em várias vertentes, ou souberam encontrar o caminho de uma mente sã, em movimento.
Algumas são pessoas anónimas que exercem trabalho profícuo, há décadas, na cidade. Outras haverá que, não sendo do nosso conhecimento, se poderiam também incluir no rol de quem merece o reconhecimento deste espírito de cidadania.
Na solidariedade, não podemos esquecer, há várias décadas, o Dr. José Luís de Brito Rocha, à frente dos destinos do Lar de S. José; e, nos BVC, o bombeiro mais antigo da Corporação, no activo, é Honorato Nogueira Berto (Chefe), a par de Adolfo Gomes Bernardino Gato (2.º Comandante).
Na cultura, Manuel Dias Henriques, homem simples mas culto e de forte personalidade, é o leitor mais antigo da Biblioteca Municipal da Covilhã, a qual frequenta há mais de 50 anos!
Maria Ivone Manteigueiro Vairinho, embora radicada em Lisboa, é a poetisa mais antiga da Covilhã que nas suas poesias não a esquece a sua Terra; mantém-se activa, e é, há já alguns anos, a Presidente da Associação de Poetas Portugueses.
Na religiosidade, João de Matos é o confrade mais antigo da Conferência de S. Vicente de Paulo (instituição mundial que na Covilhã desenvolve uma acção muito importante junto dos mais desfavorecidos), contando com a sua participação há mais de 60 anos; e Maria Odete Inácio, a catequista mais antiga da cidade, há mais de 40 anos.
Poderá haver muitos mais, e noutras vertentes, como o associativismo, mas são elementos como estes que constituem, muitas vezes, despercebidos, as pedras basilares da nossa sociedade onde nos encontramos inseridos.
(In “Notícias da Covilhã”, de 04/11/2005)