14 de maio de 2012

O TEMPO PULA E AVANÇA


Não é possível fazer parar o tempo. Ele avança, devagar, devagarinho, ou tão acelerado que nem damos por ele. Este paradoxo temporal é uma das vertentes da nossa vida. Para umas coisas, o tempo deveria ser preguiçoso, mas, para outras, desejaríamos vê-lo como num corridinho algarvio.

E até, por vezes, surgem as nortadas, e, vai daí, fazem andar o tempo para trás, tal como deveria andar para a frente – mais vagaroso ou mais ligeiro no seu passinho de criança ou nas pegadas de atleta adulto.

Só que, no meio destas formas de vermos e sentirmos, muita coisa se desfila pela nossa frente, entre ventos e marés deste peregrinar na terra, para os crentes, ou o destino, para outros; e, então, temos que preencher o tempo das nossas vidas: como devemos; como gostamos; como podemos; como nos deixam.

Mas, por vezes, uma só pessoa não consegue transportar às costas toda a montanha; e, por outro lado, há que dar colorido a todas as formas de expressão, de pensamento, de amor às causas citadinas ou de âmbito mais lato.

É assim aquilo a que se chama um trabalho em equipa. Mas, para tanto, há que aceitar as boas vontades, os que sentem por via da pena (hoje mais propriamente nas teclas dum computador), um sorriso para a escrita, e, no âmbito do meio onde se inserem, e, até, numa projeção extra muros, que vejam o reconhecimento dos seus textos numa apetência pela sua leitura.

No jornalismo, podemos ver um veículo ao serviço não só da informação como também do conhecimento, da cultura, da recreação do espírito.

Não é fácil dirigir um jornal. Quantas vezes um periódico, não obstante a boa vontade dos seus obreiros, se vê na contingência de cerrar portas, face aos problemas do tempo – lá está o tempo outra vez – em vários domínios, desde o financeiro à utilidade daquelas páginas que nos passam pela frente dos olhos, para uma só leitura rápida dos títulos, ou na apetência pelos artigos de determinado autor.

Ora, um jornal sem diversidade, e no exclusivo duma vertente desportiva ou religiosa, torna-se direcionado somente para um determinado tipo de aderente, excluindo os restantes não interessados nestas duas causas.

Sucede, porém, que o quinzenário “O Olhanense" é um periódico enraizado numa vertente de muitos colaboradores – é obra! – dispersos por opiniões variadas, onde impera uma veia pela história, não exclusivamente a desportiva, mas a da nossa História de Portugal, e não só, e na expressão colorida no entusiasmo de muitos outros temas, onde a poesia também tem assento.

Gosto de ver as curiosidades históricas de várias figuras e eventos do País e do globo.

Enfim, pode o diretor do jornal e presidente do centenário clube que lhe proporcionou a sua génese, orgulhar-se de a cidade de Olhão, a Região e o País terem um periódico agradável de leitura que honra a instituição Olhanense e a Cidade.

Mas, quem está por detrás da renovação das suas páginas e dum trabalho que não é fácil, não pode deixar de se reconhecer na coordenação muito profícua do seu chefe de redação, Mário Leonardo Proença, sucessor e forte braço direito, que foi, do saudoso diretor Herculano Valente.

É, pois, no momento em que surge o 50º ano da sua publicação, que vai todo o meu apreço e estima por quantos conseguem manter este órgão da Comunicação Social, sem perder a qualidade, e conseguindo um leque de mais de uma dúzia de colaboradores regulares.

Parabéns pois a todos quantos conseguem manter, nesta “teimosia”, há cinquenta anos, o jornal “O Olhanense”.

(In jornal Olhanense de 14.05.2012)

11 de maio de 2012

ABRIL HISTÓRICO – O ANTES E O DEPOIS

Quando nasci já se exigia o fim da ditadura. Era Presidente da República o marechal Óscar Carmona; o Papa, Pio XII. Havia terminado a II Grande Guerra e Salazar apresentava o pedido de adesão de Portugal à ONU.

Na Covilhã, os operários têxteis realizavam um movimento grevista, e, do Tarrafal, chegavam a Lisboa 110 presos políticos.

Com o meu primeiro choro contribuí para o aumento da população em Portugal, nessa altura de 8.178.360 almas. Em Portugal ainda não havia televisão (e, se calhar, foi por isso eu nasci…).

No lugar altaneiro da Pousadinha, um professor, que já havia mudado de profissão, continuava a ensinar a quem lhe pedia, geralmente adultos, numa zona mais de 90% analfabeta. Talvez fosse na sua casa onde entravam os únicos jornais de toda a população. Ouvia ler algumas notícias aterradoras, como as ocupações soviéticas na Europa de Leste, culminando com a invasão da Hungria, entre outras, e a cortina-de-ferro.

Não havia luz elétrica, água canalizada ou saneamento. À noite, só o luar e as estrelas do céu.

A escolaridade obrigatória foi feita no Asilo, onde até se aprendia a marchar, direita e esquerda volver e pela direita perfilar, aos sábados, onde um sargento do Batalhão de Caçadores 2 ganhava alguns patacos. Pelo 1.º de Dezembro e Procissão dos Passos lá nos entregavam uma farda da Mocidade Portuguesa. Exibíamo-nos assim com a rapaziada da Escola Industrial e do Liceu. O Colégio Moderno não se metia nestas andanças.

E é já na Escola Industrial que voltamos a vestir o mesmo fardamento. Também a apercebermo-nos do “impercetível”, para as nossas idades: - “Esta noite vieram buscar fulano!”; “Já chegou de Caxias, sicrano”; “Revistaram a casa de beltrano!”
Nas vitrinas da Escola, uma grande referência ao que caíra morto por se ter oposto ao assalto ao Paquete Santa Maria, naquele mês de janeiro de 1961, com Henrique Galvão – era então o homem do momento, patriota, o terceiro piloto João José Nascimento Costa.

Surge o grande êxodo dos portugueses a emigrarem, na década de 60, substituindo o Brasil e a América pela França e Alemanha. Mas também o terror do início das guerras coloniais. Pede-se, não, exige-se, anuência à chamada do grande chefe: aquele malandro do Nehru deu ordens para a invasão da Índia, mas “Angola é nossa! Angola é nossa! É portuguesa!”.

Começamos a ver a aproximação da nossa partida, e as notícias de Nambuangongo e outras terras africanas são aterradoras!

A partir da meia-noite, a Rádio Portugal Livre, de Argel, inicialmente pela voz de Stela Piteira Santos, na primeira emissão de 12 de março de 1962, dá-nos conta da situação do País.

Recordamo-nos da campanha inolvidável de Humberto Delgado, no ano de 1958, para a presidência da República, na sua passagem pela Covilhã e outras terras deste Portugal amordaçado. Com alguns receios, se vai dando vós à oposição democrática, por via da Comissão Democrática Eleitoral – recusa-se participar numa eleição fantoche. No ano 1973 é ainda a contestação pela morte do presidente chileno – Salvador Allende – às mãos do general Pinochet.
Num edifício, no Pelourinho, já demolido, onde existiu o Café Central, aí se reuniu a oposição democrática. Do outro lado, no Teatro-Cine, davam-se louvas à União Nacional, num grande entusiasmo por um dos seus homens e deputados do regime, natural do Tortosendo.

Entretanto, o substituto do ditador, Marcelo Caetano, acaba com os termos em que os funcionários públicos são forçados a redigir os seus atos de posse ao serviço do Estado –  “Declaro cumprir a Constituição da República Portuguesa de 1933, com ativo repúdio do comunismo e de todas as sua ideias subversivas” –, inicia as suas “Conversas em Família” e muda o nome de “Censura”  para “Exame Prévio”. Não tem mãos e é tornado preso às ordens do inquebrantável capitão Salgueiro Maia, nesse 25 de Abril de 1974.

Repetir o que tem sido dito tantas vezes é como chover no molhado. Os jovens de hoje, nascidos depois da Revolução dos Cravos, jamais se poderão aperceber do que foi o “antes”; por isso, ainda que respeitemos democraticamente todas as opiniões, é impensável num regresso ao passado.

Há que unir as mãos em redor dos ideais dos militares de abril, no genuíno interesse do povo.

Nós bem compreendemos as farsas daqueles parlamentares maioritários, dando cores vivas ao momento, com a voz de Paulo de Carvalho a cantar “E depois do adeus”, no início; e a “Grândola Vila Morena”, no final, nas últimas comemorações da Revolução dos Cravos.

O parlamento português é uma casa de muito pouco bom exemplo, se atentarmos nas afrontas que são feitas aos portugueses que têm que entregar as casas aos bancos; que tiverem que se desfazer de coisas que lhes foram proporcionadas pelos momentos vividos em democracia; que têm que voltar a comer uma cebola com pão porque já não têm um naco de carne para acompanhar as refeições dos seus filhos. E, entre muitos outros, porque é que a presidente do Parlamento é reformada aos 42 anos e recebe ainda, das suas funções, um generoso vencimento e ajudas de custo? “Palavras para quê? É um artista português e usa pasta medicinal Couto” – lembro-me desta publicidade de outrora…
(In Jornal do Fundão de 10.05.2012)