24 de outubro de 2018

2.º ENCONTRO DE ANTIGOS MORADORES DA RUA VASCO DA GAMA E DO SERRADO

Foram mais de uma centena, entre casais e aqueles que vinham sós. Foi no passado dia 13 de outubro. A um restaurante da Cidade, iam chegando muitos dos que já não se viam há décadas. E havia famílias daquela geração dos anos 40 do século passado, na sua maioria, em que eram muitos irmãos.
Vários encontros nostálgicos, tal como este, daqueles tempos da vivência entre vizinhos e amigos de outrora, da infância à juventude, se vêm despertando no emergir de novos encontros de amizade.
Estes vieram de vários pontos do País, tal como os irmãos Capelo radicados do Norte ao Algarve; o Galhano de Vila Franca de Xira; o Américo Ferreira e a irmã Gabriela, assim como a Maria José Duarte, de Lisboa, entre outros.
Foram sãos momentos de franco convívio, onde não faltou o fado na excelente voz de uma jovem.
A amizade, como sempre tenho dito, é uma festa. E quando ela perdura desde a infância e juventude, como em vários momentos foram recordados, independentemente das vicissitudes da vida, repercute-se de uma alegria redobrada.
É que, a partir dos anos 60 do mesmo século foi a irrevogável partida para outros pontos do retângulo português, e além-fronteiras, para as suas vidas profissionais e constituição de família.
De meninos e moços de outrora surgem agora já não como papás, mas com uma promoção superior, a de avós, neste ano da graça de 2018.
E assim se dissiparam alguns momentos que, parecendo hiperbólicos, mais não foram que resultantes da nostalgia de muitos de nós, todos no óbvio de mortais, mas procurando sempre um resquício de podermos abraçar os que ainda se mantêm no mundo dos vivos.
E o sol, antes do anunciado surgimento do furacão Leslie, disse-nos adeus até ao próximo encontro.

(In "fórum Covilhã", de 23-10-2018 e "Notícias da Covilhã", de  25-10-2018)

9 de outubro de 2018

OS CAVACOS DE CAVACO


Podia aqui voltar a falar de jornalismo, jornalistas e jornais, e da crise que atravessa este mar das letras, sejam elas por via do papel, ou pela online.
Ou, então, preambular sobre a Operação Marquês com o sorteio do juiz Ivo Rosa como escolha para a fase de instrução, na expressão da defesa de Sócrates, de que “finalmente há um juiz legal”.
Segundo o Público, “há quem considere este juiz um obstáculo por defender constantemente os direitos das pessoas investigadas, criando obstáculos às investigações”. Terá agora de se pôr a par dos 132 volumes e 903 apensos, que, tudo junto pesa mais de uma tonelada. E eu acrescento: de cavacos.
O ex-presidente Aníbal Cavaco – o Sr. Silva como uma vez lhe chamou Alberto João Jardim – emergiu duma interrupção prudencial, para sobressaltar as consciências dos governantes da “geringonça”.
Só que lançou cavacos para a fogueira, mas as faúlhas foram ter ao Presidente da República.
E é nesta investida do seu linguajar que a sua suspeição sobre o processo que conduziu à nomeação de Lucília Gago, em substituição, por termo de mandato, de Joana Marques Vidal, de Procuradora Geral da República, que lhe é endossada por Marcelo Rebelo de Sousa a resposta merecida: é que a decisão foi do Presidente da República e não do Governo de António Costa, com sentido de Estado.
Por isso, as “estranhíssimas” razões desta sua mexeriquice foi como sair-lhe o tiro pela culatra.
Efetivamente, Joana Marques Vidal cumpriu com competência e zelo o seu mandato, que ainda não terminou, e deu um “contributo decisivo” para a credibilização do Ministério Público, mas daí a que Cavaco considere que a sua não recondução é “a decisão mais estranha do mandato da ‘geringonça’”, que nem foi da sua responsabilidade, vai uma diferença muito grande.
Num ex-Presidente da República, como o Sr. Aníbal de Boliqueime foi, à profundidade das acusações é-lhe exigida, nesta especial condição, a ponderação das palavras, e não só quando ele a exigia aos outros. É preciso estar à altura do seu estatuto, como sempre o foram os seus antecessores. Como referiu Manuel Carvalho, in Público, “porque o que disse não corresponde à produção de uma qualquer ideia, à elaboração de uma crítica ou à sugestão de um caminho para o país: o que ele fez foi apenas insinuar que a não recondução de Joana Marques Vidal é consequência de ‘algo muito estranho’, tão estranho como um golpe de bastidores destinado a obstruir a Justiça e a proteger os poderosos”.
Pois é, se Cavaco vê no processo coisas “estranhíssimas”, deve revelá-las. E por que não recordar que foi Cavaco Silva, de Boliqueime, que nomeou Pinto Monteiro, o procurador da condescendência com as suspeitas dos então donos disto tudo?...
Meu Caro, Sr. Aníbal Cavaco Silva, ex-presidente de Portugal Continental, Açores, Madeira e Porto Santo, senhor da degustação do bolo-rei, e que nem um macaco a subir ao coqueiro em janeiro de 1990, de visita a São Tomé e Príncipe, se bem me lembro, na expressão, esta sim, saudosa de Vitorino Nemésio; termino esta minha crónica com excertos de Helena Sacadura Cabral, estes que valem mais ouvir que as narrativa de Vossa Excelência:
- “As criadas dos anos 70 passaram a ‘empregadas domésticas’ e preparam-se agora para receber a menção de ‘auxiliares de apoio doméstico’;
- De igual modo, extinguiram-se nas escolas os ‘contínuos’ que passaram todos a ‘auxiliares de ação educativa’ e agora são ‘assistentes operacionais’;
- Os vendedores de medicamentos, com alguma prosápia, tratam-se por ‘delegados de informação médica’;
- E pelo mesmo processo transmudaram-se os caixeiros-viajantes em ‘técnicos de vendas’;
- O aborto eufemizou-se em ‘interrupção voluntária da gravidez’;
- Os operários fizeram-se de repente ‘colaboradores’;
- As fábricas, essas, vistas de dentro são ‘unidades produtivas’ e vistas da estranja são ‘centros de decisão nacionais’;
- O analfabetismo desapareceu da crosta portuguesa, cedendo o passo a ‘iliteracia’ galopante;
- Desapareceram dos comboios as 1.ª e 2.º classes, para não ferir a suscetibilidade social das massas hierarquizadas, mas por imperscrutáveis necessidades de tesouraria continuam a cobrar-se preços distintos nas classes ‘Conforto’ e ‘Turística’;
- Aquietadas pela televisão, já não se veem por aí aos pinotes crianças irrequietas e ‘terroristas’; diz-se modernamente que têm um ‘comportamento disfuncional hiperativo’;
- Ainda há cegos, infelizmente. Mas como a palavra fosse considerada desagradável e até aviltante, quem não vê é considerado ‘invisual’. (O termo é gramaticalmente impróprio, como impróprio seria chamar inauditivos aos surdos – mas o ‘politicamente correto’ marimba-se para as regras gramaticais…).
- Para compor o ramalhete e se darem ares, as gentes cultas da praça desbocam-se em ‘implementações’, ‘posturas pró-ativas’, ‘políticas fraturantes’ e outros barbarismos da linguagem.
E assim linguajamos o Português, vagueando perdidos entre a ‘correção política’ e o novo-riquismo linguístico.
Já não se diz o que se pensa, tem de se pensar o que se diz de forma ‘politicamente correta’.
Hoje não se fala português… linguareja-se!”
Pois é, Sr. Aníbal Cavaco Silva, não é que o Senhor linguarejasse, mas, como sói dizer-se, e me perdoe por mor dos meus pecados: O Senhor meteu a pata na poça!...

(In " fórum Covilhã", de 09-10-2018)

4 de outubro de 2018

CONTE-NOS A SUA HISTÓRIA JOÃO FERNANDO ALMEIDA MOTA


Reiniciamos neste número, conforme já foi referido no editorial, várias estórias da história de antigos Combatentes, associados deste Núcleo, covilhanenses, de raiz ou de coração, que também se viram obrigados um dia a partirem para terras longínquas em missão de soberania, deixando as famílias em sobressalto porquanto jamais sabiam o desfecho duma guerra subversiva entre povos irmãos, na teimosia ditatorial dos senhores dos governos do Portugal de então.
Enquanto uns mais não podiam que aceitar as ordens de marcha para as colónias – então referidas como províncias ultramarinas – outros fugiam deste Portugal amordaçado, quer por via da emigração de “assalto” ou, então, por linhas subterfugias logo que se aproximava o serviço militar, surgindo após o 25 de Abril num apanágio ufano de exilados.
O personagem que hoje trazemos a esta página, é mais um dos milhares de Portugueses que, deste País, percorrido de lés a lés, quer seja de Melgaço lá bem no Norte, até à açoriana Rabo de Peixe, cumpriram a sua missão e hoje sentem, o que foi a nostalgia, e os medos, quando naquelas terras além-mar foram forçados a ir, mas também o terem muitos sentido na pele o stress pós-traumático, como uma ferida irreversível que o Estado português deixou, na incompreensão, num mundo de jovens, hoje septuagenários e octogenários, alguns numa autêntica psicose que quase destruiu a família.

O João Mota, covilhanense nascido em 15 de dezembro de 1951, até foi um dos bafejados pela sorte na guerra de Moçambique, como mais à frente o mesmo descreve.
Na Escola Secundária Campos Melo (na altura Escola Industrial e Comercial) obteve o curso de técnico de tecelagem e, assim, passou pela indústria de lanifícios, em várias empresas do concelho da Covilhã, durante 48 anos, vindo a aposentar-se em janeiro de 2016.
Com os amigos covilhanenses, Victor Bicho, Carlos Silva e Jorge Carvalho, o João Mota iniciara então o serviço militar, no dia 25 de abril de 1972 (quem diria que daí por dois anos, este dia e mês seria uma data assinalável na história de Portugal!...
), no Regimento de Infantaria n.º 7 - RI 7, em Leiria. Daqui partiu para o Regimento de Transmissões, no Porto, onde tirou a especialidade de operador cripto, até julho de 1972. Formou depois uma Companhia com vista à mobilização para Moçambique – CART 7255 –, em Torres Novas, no mês de novembro deste ano, embarcando no avião para Moçambique no dia 11 de janeiro de 1973.
Todo o tempo foi passado no aldeamento chamado “MUFA”, que fica a meio caminho entre Tete e Cahora Bassa (Cabora Bassa durante o período colonial português). Era um quartel em oito casas pré-fabricadas, deixado ao exército português por uma empresa italiana, que fez obras na zona relacionadas com linhas de alta tensão, vindas da barragem para a África do Sul.
O João Mota, passado pouco tempo da sua chegada ali, foi incumbido pelo capitão da sua Companhia, da tarefa de projetar filmes nos aquartelamentos próximos e também para a população de cor. Era a chamada “psico” a funcionar, que, por determinação do departamento de logística em Nampula, quartel general, decidiu que assim se realizasse. Para o efeito entregaram todo o material: máquinas de projetar, filmes antigos, pano branco, para os mesmos poderem ser vistos.
O João Mota, durante todo este tempo, era visto como o homem que trazia distração e boa disposição para o mato. Mensalmente tinha que enviar um relatório para Nampula sobre qual a impressão dos espetadores, e bem assim sugestões, para elevar a moral. E, para isso, visitava todas as semanas, as obras da barragem, de enorme grandiosidade.
Tendo sido esta a sua tarefa no Ultramar, João Mota disse-nos que não se pode queixar, tendo regressado à então Metrópole em 5 de dezembro de 1974, sem que tivesse havido qualquer baixa ou ferido na sua Companhia.
Sendo sócio do Núcleo da Covilhã da Liga dos Combatentes desde 1986, tem desempenhado vários cargos nos Corpos Gerentes desta instituição de grande mérito: Vogal da Direção, de 2014 a 2017; Secretário da Assembleia Geral, de 2015 a 2016, e atualmente Secretário da Direção.
E talvez porque a sua missão no Ultramar passou também por transmitir momentos de entretenimento, o João Mota é uma das personagens reais da ficcionada “Tertúlia Hotel Covilhã-Jardim”, a que é feita referência no editorial.

(In "O Combatente da Estrela", n.º 112 - Outubro/2018", digital)

RECOMEÇAR

É este o título que dei ao texto para este número. Efetivamente, o dicionário dá vários exemplos e para este verbo transitivo e intransitivo, quer dizer “começar de novo ou ter recomeço o que se interrompeu”. Isto é, “continuar”.
“Se bem me lembro”, na recordação de Vitorino Nemésio, foi no n.º 95 deste jornal, de janeiro a maio de 2014 que, então como subdiretor, sugeri a criação de três páginas distintas (“Entrevista a um Combatente”, “Sobre Desporto” e “Conte-nos a sua História”, de um antigo Combatente).
A “Entrevista a um Combatente” acabaria depois por se fundir na página alusiva a “Conte-nos a sua História”.
Entretanto, um convite do então CEO da Liberty Seguros em Portugal, insistiu para que escrevesse a “História dos Seguros em Portugal”, isto no dia 13 de junho de 2014, um mês depois de ter assumido a tarefa de subdiretor de O Combatente da Estrela.
Aguentei tanto quanto pude, com as duas responsabilidades, até que em 2 de janeiro de 2017 coloquei o problema à Direção deste Núcleo da Liga dos Combatentes, da minha impossibilidade de manter as duas colunas que então me propusera executar, continuando no entanto com o editorial, já que nem eu calculava que daqui para a frente iriam surgir centenas de horas de trabalho para a concretização do livro a que dei o título “O Documento Antigo – Uma outra forma de ver os Seguros”, referida no último número de “O Combatente da Estrela”.
Assim, o n.º 105, de janeiro a março de 2017 foi o último em que se mantiveram as referidas páginas, da minha responsabilidade, passando os posteriores números a ter inserida a página desportiva da responsabilidade do entusiasta pelo desporto citadino, Carlos Miguel Saraiva, mormente do Sporting Clube da Covilhã (SCC), de que eu já havia escrito quatro livros diferentes, e tive o prazer de prefaciar, e apresentar, a sua obra também sobre o SCC – “História do SCC” – tendo, para mim, a felicidade de ver alguém a dar continuidade, com assaz entusiasmo, ao maior clube da Beira Interior – o nosso SCC. Assim, o Miguel Saraiva tem-se encarregado, com muito mérito, dessa página n’O Combatente da Estrela.
Como já foi referido, sobre o livro que, com grande insistência me foi solicitado escrever, atrás referido, e para não faltar a um compromisso baseado na grande confiança em mim depositada, acabei por terminar o livro em 13 de junho passado, um trabalho de 896 páginas, comportando toda a história dos seguros desde a antiguidade até aos dias de hoje, em duas partes, conforme já referi, e, desta forma já inédito no mercado, reforcei esse ineditismo inserindo-lhe um cunho romanesco.
Na parte romanceada que originava pausas de ficcionadas tertúlias em vários pontos do País, com início em Valbom (Gondomar), Porto, Leiria, Algarve, Covilhã e Lisboa, foram inseridas várias personagens reais, na sua maioria covilhanenses, e outra fictícias, que se desenrolavam em estabelecimentos reais (confeitarias, cafés, tascas e restaurantes).
Dava assim oportunidade de falar sobre figuras e eventos históricos das localidades onde se desenvolviam as ficcionadas tertúlias. Por exemplo, na Covilhã, surgiram duas tertúlias: “Tertúlia Hotel Covilhã Jardim” e “Tertúlia do Celso”.

Na “Tertúlia Hotel Covilhã Jardim” tive o prazer de poder contar com personagens reais do Núcleo da Covilhã da Liga dos Combatentes, entre os quais os amigos João Azevedo, João Mota, Victor Oliveira, José Matias, e ainda o João Petrucci.
A apresentação do livro, a cargo do novo CEO da Liberty Seguros em Portugal, Dr. Rogério Bicho, que ocorreu no Salão Nobre da Câmara Municipal da Covilhã, foi um êxito e daqui extraímos uma foto com os elementos tertulianos, personagens reais deste Núcleo, para o livro “O Documento Antigo – Uma outra forma de ver os Seguros”, onde estiveram presentes, e agradeço.
Assim, volvido mais de um ano e meio, volto à disponibilidade para recomeçar com a rubrica “Conte-nos a sua história”, que neste número se reporta ao antigo Combatente João Fernando Mota.

(In "O Combatente da Estrela", n.º 112 Outubro/2018, digital)

3 de outubro de 2018

O ZÉ DO MEGANE


Como entrámos no Outono, o tempo de férias praticamente acabou, começaram as aulas depois dos protestos dos professores, e dos taxistas terem terminado os seus, contra a “lei Uber”, para além de outros acontecimentos que foram dando corpo à “silly season”, houve algum tempo para leitura.
Pela minha parte, coube-me o deleite de, após ter devorado dois livros, passar a folhear despreocupadamente aquele que escrevi e foi apresentado no passado dia 8 de setembro.
Os meus dedos levaram-me indiscriminadamente para as páginas 119 e 120, da parte romanesca, na tertúlia de Valbom, mas desta vez a ter lugar no Restaurante Margarida, em Leça da Palmeira:
“- Psssstt… - Chamou à atenção o Zé do Megane, para o que se estava a passar, ali bem perto, à porta do restaurante, mas bem fora dele.
Um grupo de cinco turistas visitava o Porto. A carrinha com o cicerone parou à porta. Eram três lindas moças e dois esguios rapazes.
Então dizia o cicerone: Aqui é Leça da Palmeira e o Porto é intitulado pelos ilustres da História de Portugal, como a ‘Sempre Leal e Invicta Cidade do Porto’.
Os sorrisos das moças às explicações do cicerone faziam inveja a quem passava, tal a sua graciosidade, todas de calças de ganga, curtas, a denunciarem as formas do corpo, para além dos seus cabelos compridos e uma de rabo de cavalo.
Os dois rapazes daquele grupo turista, tanto como elas, procuravam dos seus telemóveis obter as melhores fotografias.
Ao recuarem para obterem uma melhor panorâmica – cuidado com os automóveis!... – dizia o cicerone – uma das moças pisa inadvertidamente um velho que ali passava, de jornal debaixo do braço, e ainda uma caixinha de bolos, que comprara na pastelaria para o aniversário da sua Maria que fazia 80 anos, e, na outra mão, uma bengalinha, que por graça e mor do senhor doutor, o aconselhara a andar assim mais seguro.
Da pisadela, susto do velho, um pouco mais de vento, jornal para o chão, e logo duas páginas centrais voam e se enrolam num automóvel que passava.
Corou e deixou-se de sorrisos a pequena enquanto as suas colegas se riam.
Um dos rapazes corre atrás das páginas do jornal que voaram quando obriga um ciclomotorista a travar bruscamente e a estatelar-se no chão. Para além das calças rotas (rotas já elas estavam quando as comprou com aqueles buracos…) nada mais aconteceu, depois de mirar a Famel Zundap que não ficara danificada.
O rapaz do motociclo, após ter recebido pedidos de desculpa, por lhe terem ocasionado aquele susto, do turista e seus companheiros de viagem, bem como o cicerone, lá seguiu o seu caminho, tanto mais que as três gaiatas também o haviam fascinado.
Entretanto, o velho, de sua graça, Joaquim, vendo todo este espetáculo, acaba por dizer: - ‘Deixe lá o jornal, minina, era só p’rá mor de m’entreter com a minha Maria que hoje faz 80 anos. O pior foram os bolos que ficaram esborraçados!... Não viu que o rapazinho a correr atirou-me com a caixa ao chão e pisou os bolos?’
Deste episódio, o Zé do Megane que, entretanto, fizera interromper os trabalhos, e os seus companheiros tertulianos acabaram por se juntar à porta, assistindo a tudo, teve pena da moça e do velho, e não é que lhes pede para entrarem, e dá indicações ao empregado para arranjar uma caixinha de bolos, enquanto o Damasceno acabou por ir comprar o Correia da Manhã, do qual algumas páginas tinham voado e ficado incompleto…
Entretanto, o Benedito, finório, diz para o sr. Joaquim: - Olhe lá, já viu que as páginas que voaram do jornal eram estas… e apontou para aquelas em que surgiam, desnudadas, algumas celebridades…
- Olhe, Sinhor! … Não sei a sua graça… - Respondeu o sr. Joaquim ao Benedito: ‘Noutros tempos, eu binha à cidade de barco rabelo… Ainda m’alembra dos carros de bois birem carregar pipas de beinho fino, dos nabios à bela subindo’ …
E enquanto lhe servem um copo de branco, que lhe ofereceram, adianta-se: - ‘Bote aí!’
Bom, as três mocinhas, os dois rapazes e o cicerone lá seguiram o seu caminho, muito agradecidos com tudo o que lhes fizeram, com muitos pedidos de desculpa, sem que antes o Benedito conseguisse a aceitação de uma selfie com elas.
O sr. Joaquim também já se preparava para partir, enquanto o empregado foi retirar de perto da porta, para o lixo, a caixa dos bolos esmagados, quando o Manuel lhe pergunta:
- Então, a sua Maria faz hoje 80 anos? Parabéns!
- E olhe que eu, oficialmente, casei três bezes. Isso mesmo, três bezes! – Respondeu o sr. Joaquim.
Bom, e aqui terminou o drama, que não chegou a acontecer.
- Vamos continuar com o nosso programa, malta, senão também podem voar os nossos papéis – Ordenou o Fernando Gonçalves.”
E muitas, muitas mais histórias entre facto-ficção foram escritas. Fica somente esta pequena abordagem para os muitos que são possuidores do livro.


(In "Notícias da Covilhã", de 04-10-2018)