25 de setembro de 2013

ÊXTASE POLÍTICO


Já muita coisa se escreveu, se debateu; fez agitar muitas águas e turvar correntes de informação, com ou sem sentido; por vezes, de uma embriaguez denodada, na tentativa do acertar na muche.

Na “revista 2”, de 15 de setembro, do “Público”, lê-se, em grandes parangonas a toda a capa: “Em terras onde já fecharam as escolas, os centros de saúde e os postos dos CTT, cabe aos presidentes das juntas de freguesia fazerem de assistentes sociais, taxistas, contabilistas e conselheiros. Mas, com o novo mapa, desapareceram 1165 freguesias. E com elas o último resquício da presença do Estado”.

Parece assim o regresso aos tempos de outrora, das décadas de 40 e 50 do século passado.

Tempo em que o barbeiro também fazia de dentista; as mulheres que tinham jeito e serviam de parteiras, deslocavam-se aos domicílios, mormente nas aldeias, onde nasciam os bebés; o professor fazia de jornalista; os farrapeiros deslocavam-se às casas para comprar farrapos, peles de coelho e metais; os homens dos cabritos vendiam-nos à porta e aí os esfolavam; e, afiar tesouras e facas era com o homem característico do seu apito; assim como os tachos e panelas de barro partidos acabavam por ser colados e, com uns agrafos, ainda serviam para mais algum tempo…

Os automóveis não eram para toda a gente… e até o Padre Pita, dos Penedos Altos, para ir para Aldeia do Carvalho, deslocava-se na sua moto; os da cidade, ao tempo, nem sequer possuíam carta de condução. Mas dava muito jeito para o transporte de alguns haveres, a carroça, com o cavalo, do Painço.

Neste setembro em que é habitual o país regressar à vida normal, com o retorno dos estudantes às escolas, é também o momento em que as famílias voltam às rotinas e se despedem das férias.

Temos à porta as eleições autárquicas. Na perceção das perdas que cada eleitor tem vindo a sofrer, com a atual coligação governamental, representa uma relevante razão para uma muito possível transferência do voto para as candidaturas dos partidos que têm vindo a opor-se a esta política, e olha-se geralmente de esguelha para os intitulados “independentes”, eles que integram ou integraram os partidos das gestões autárquicas…

E, neste frenesim da tentativa de aderência ao voto, os apaniguados desfazem-se no lançamento da isca por todos os que podem andar mais ao largo, e são atraídos pelos arraiais populares, com “comes e bebes” para o encontro das boas vontades.

É que isto já não vai com a promessa eleitoral. Segundo o pensador Daniel Innerarity, professor nas universidades de Zaragoza e Sorbonne que entrou na lista dos “25 grandes pensadores do mundo”, “É impossível governar as pessoas sem compreender as suas razões. Em muitos casos, os que são mandados sabem muito mais do que quem governa” e “Os políticos não podem fazer grandes promessas porque a situação política não é estável e eles passam a vida a improvisar”.

É indubitável que em qualquer organismo, instituição, coletividade ou associação, seja ela pública ou privada, existe sempre o espectro da adulteração das intenções e as intimidades exacerbadas porque os humanos sofrem deste pecado, por mais que se queiram afastar. Por isso, urge que haja os vigilantes a todo o tempo, e não só quando se zangam os comparsas.

Nalgumas “guerras frias” que antecedem o ato eleitoral, há que extrair cuidadosamente as ilações para que se façam emergir as verdades e se dissipem as inverdades, nalgumas destas guerras sem armas de fogo mas servidas pelas armas da intimidação e do embuste.

“Os governantes nada mais são que representantes do povo. Se, ao abrigo do seu estatuto de governantes, adquirem benesses, trocam favores, se movem nas zonas cinzentas da desconfiança e da ausência de transparência, então deixam de representar esse povo e perdem o direito de o representar” – Ana Luísa Amaral (escritora).

Neste entusiasmo esfuziante para muitos, os que chegarem ao clímax, procurem o engenho e a arte para serem merecedores dos créditos de quem neles votaram, e, de mãos dadas, possam fazer a paz e levantar a taça para o brinde da fraternidade no desenvolvimento da sua/nossa Terra.

 (In "Notícias da Covilhã", de 26.09.2013)

11 de setembro de 2013

A NOSSA DEMOCRACIA


Neste Portugal de hoje, a caminho de quatro décadas da Revolução dos Cravos, vai o povo português ficando cada vez mais desiludido, não só com a condução deformada dos ideais por que surgiu este grande acontecimento, mas também porque já lhe falta aquela segurança e coragem proveniente da convicção no próprio valor, aquela fé que se deposita em alguém e numa firme esperança, que, segundo os dicionários, se designa por confiança.

Embora esta época estival seja propícia a notícias sem grande interesse, duma certa frivolidade em relação a outras épocas do ano, foram no entanto os incêndios o grande tema do quotidiano. Esperemos que a silly season venha dar lugar ao rebentamento das correntes que amarram os ânimos de todos nós, onde os valores da vida são cada vez mais escassos.

Se atentarmos ao que se tem passado neste último governo (tenhamos em conta que os anteriores governantes também não resolveram os problemas dos demais portugueses, mas antes, trataram das suas vidinhas), os intervenientes na governação conseguiram mentir, de per si ou com outros, descaradamente, e a falta de palavra tem sido de grande tónica nas suas ações. Se o partido ou partidos que formam o Governo estivesse somente limitado ao cumprimento do seu programa de Governo e, no seu incumprimento fosse deposto, talvez a situação atual fosse outra. Se os meios de comunicação preenchessem os seus espaços com informações mais aprofundadas e fidedignas, e mais independentes dos grandes grupos financeiros, o seu contributo para a tal confiança raiava de outra forma. Nenhum indivíduo poderá representar bem todos os outros, pelo que o individualismo que ainda grassa na nossa sociedade terá que forçosamente passar pelo trabalho em equipa.

Se houvesse uma verdadeira justiça logo seriam devidamente punidos, todos quantos, independentemente da sua condição, de governantes ou não, roubassem ou defraudassem o Estado. Só assim se poderia englobar o princípio básico que abrange direitos, respeito, legalidade e igualdade.

Com tudo o que se está a passar, de bradar aos céus, haveria que, conscientemente, distinguir o essencial do acessório, com o olhar para a frente e não para a esquerda ou para a direita.

E que me perdoem os senhores do poder, dos destinos de Portugal, ou das autarquias, deveria haver uma classe política mais culta, informada e humanizada. Com mais amor a Portugal e menos à sua autopromoção. E, acima de tudo, acabar com o monopólio dos profissionais da política. Quando não nos revemos nos órgãos de soberania, nas empresas e nas comunidades, em que as decisões vão ter ao compadrio e ao aleatório, perde-se a noção do valor da vida e também a esperança.

Sabemos que os oportunistas, uma vez no poder, tudo fazem para que o esclarecimento das maiorias votantes não ocorra. É que, no tempo presente, a democracia foi tomada de assalto, por meio de mentiras e falsas promessas, por um bando de medíocres mas obstinados serventes dos senhores do poder.

A desolação é tanta que hoje, muitos não sabem se Portugal é uma democracia ou um caso de loucura, tal é o alheamento e a importância dos cidadãos face à balbúrdia dos pequenos e grandes poderes.

Deveriam os responsáveis por este pobre Portugal controlar o enriquecimento excessivo de governantes e ex-governantes e deixar cair na falência os bancos fraudulentos, e investir na agricultura em vez de campos de golf vazios.

Segundo o que refere a escritora Lígia Jorge, “aquilo de que enferma a Democracia Portuguesa provém da imperfeição das suas instituições ou da debilidade dos seus intérpretes”, e acrescenta que “o coração do futuro do mundo, tem de encontrar entre nós intérpretes à altura. Nesse campo, e no estado da selvajaria em que nos encontramos, semelhante combate vai precisar não só de heróis mas de leis”.

Se houvesse menos preocupação pela conquista, exercício e manutenção de poder mas mais com a resolução de problemas urgentes, menos programas mas mais planos estratégicos, menos mandar mas mais consultar, mais métodos , menos “fazer obra”, menos leis, menos monopólios do poder e mais pluralismo, mais responsabilidade e menos culto do sucesso, mais reorganização o otimização, menos jobs for the boys, mais competência e mérito, menos corrupção e mais ética, este Portugal seria uma verdadeira democracia.

O modo como os cargos públicos são ocupados por gente com todo o tipo de compromisso nas mais variadas empresas privadas é indecoroso. Deveria haver o levantamento do sigilo bancário para todos os responsáveis políticos (de presidentes de juntas de freguesia, Câmaras, governantes e presidentes da República).

E, porque não podemos abusar deste espaço, ficamos por aqui.

(In "Notícias da Covilhã", de 11.09.2013)

10 de setembro de 2013

SUBMISSAMENTE INDEPENDENTES


Este torrãozinho da Europa, à beira-mar plantado, como nos meus tempos de menino e moço ouvia dizer, nos primeiros livros da Primária, hoje, denominada ensino básico (é que, para além desta palavra significar fundamental, essencial, no meu tempo de tropa obrigatória, “básico” era aquele soldado que, não sendo nada inteligente e, não conseguindo tirar uma especialidade, era destinado para serviços secundários: plantão, faxina, e outros et ceteras militares), está retido, há já demasiados meses, àquilo que eu detesto em televisão – as telenovelas –, em redor das eleições autárquicas.

Mas, vai desta para melhor, aí estão uns quantos sabichões da política, na mesma já tão viciados pelo tempo que julgavam ad aeternum, tal como os que necessitam já de desintoxicação dos seus cérebros, de tão politizados, a persistirem na interpretação da lei, à sua maneira, com o conluio interpretativo de alguns tribunais de várias praças deste Portugal torturado.

E, como de Justiça nem quero falar mais, já que a mesma, a par do défice, é hoje o principal motivo de preocupação dos portugueses de bom senso, está a colocar em causa a própria democracia. Lembro só o burlesco caso, com o pensamento jurídico completamente desarticulado, entre outros casos caricatos, na insólita decisão judicial de três juízes a obrigarem a indemnizar e reintegrar um trabalhador da limpeza, despedido por ter sido acusado duma elevada taxa de alcoolémia, após um acidente de trabalho, numa ”interpretação” jurídica de que o álcool até pode ser útil para suportar as agruras do trabalho.

E, apenas com três mandatos; seja em que Câmara for, conforme o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, ou a limitação é apenas territorial e o impedimento a uma quarta candidatura violaria a Constituição; há quem queira mandar às malvas o que está escrito e borrifar quem seja contra as suas vontades, querendo lá saber da democracia, talvez numa opção pela oligarquia.

Por isso, num tempo em que tanto falamos da necessidade de recuperar a ética na política, os portugueses deveriam refletir sobre a necessidade de mudar as regras da nomeação de titulares de cargos políticos, e não estar agora o País confrontado, quase em cima das eleições, a julgar casos de interpretação da lei.

Será que a lei de “limitação de mandatos” pretende extinguir os chamados dinossauros autárquicos ou tão só promover a migração dos mesmos duma freguesia ou concelho para outro?

Como sempre, não há mal que venha só, e, aí está, em cima duma enorme crise económica e social surgem-nos eleições descredibilizadas.

Incompetência dos políticos? Talvez, de muitos, mas a imaginação dos mesmos é fértil quando lhes interessa.

É que, quando o serviço público democrático, que, por natureza, “deve ser” temporário, se vem tornar num meio de subsistência, e numa profissão para a vida, é como o vício de que atrás falei. E transformá-lo num modo de vida, como a droga ou na corrupção, o que se inicia como experiência ou uma oportunidade depressa envereda numa vil existência. Assim vem acontecendo na política.

Surgem em todo o mapa português, de norte a sul, do litoral ao interior, os chamados “independentes", que, na verdadeira aceção da palavra, deveria corresponder àquele “que goza de independência; livre; autónomo; que não se submete a qualquer dependência ou sujeição; ou que se governa por leis ou estatutos próprios”, mas, realmente, na sua generalidade, tal não acontece.

E, assim, são submissos a uma vontade previamente definida, continuadores dos trabalhos e diretivas dos seus antecessores, ou de forças ofuscadas, mas numa de interesses comuns.

E, em redor destes interesses, estão os que se encontram em cima do muro, espreitando a oportunidade para o salto sem partir os tornozelos. E, assim, mudam imediatamente de camisola. São os homens e as mulheres, com desejos pessoais que não os da Comunidade, que dizem servir “sem interesses…”, aqueles cujos contornos já o povo conhece, porque, areia para os olhos, o Zé Povinho já não deixa, e, desta feita, faz-lhes o seu real manguito.

(In "fórum Covilhã", de 10.09.2013)