22 de julho de 2010

A ACTA

Umas breves férias. Notícias do País, pela RTP Internacional. Tempo também para a leitura de um livro que é mais difícil fazer ao longo do ano – desta vez um de Saramago.
No barco, conseguimos ver o Portugal-Espanha, numa sala só para o nosso grupo de portugueses. Não invalidou, no final, uma ligeira provocação de um pequeno grupo de espanhóis; afinal iriam ser os campeões do mundial de futebol.
No regresso, já no avião, um ligeiro olhar por alguns jornais – La Tribune e El País. Sobre Portugal, só no espanhol se viu uma referência às divergências no norte do País com fotos de bandeiras de Espanha em Valença do Minho. Mas também uma notícia sobre o filho de Cristiano Ronaldo, com uma foto deste.
Uma observação nos fica dos motivos por que também os gregos se encontram em situação difícil: os seus campos de cultivo maltratados e uma indisciplina nas estradas, onde até nem o uso do capacete para os veículos de duas rodas é exigível, e, nos semáforos, o sinal vermelho é pouco respeitado. Mas a sua riqueza monumental é enorme, assim como os valores das figuras da sua antiguidade. Ficou-me na memória aquela expressão de Sócrates: “Só sei que nada sei”.
No meu carro fui encontrar o “Vida Económica”. Numa leitura em diagonal, registei algumas linhas do texto de António Vilar: “Compreende-se que os tempos não estão de feição para grandes alegrias e felicidades. Mas também é verdade que nós, portugueses, temos uma queda nefasta, permanente, para a depressão. (…) Esta realidade evidencia-se, designadamente, na leitura dos jornais e das notícias da comunicação social em geral, sobretudo dos artigos de opinião que se vão publicando. (…) Ora, é na pia em que todos andam a chafurdar que se cria a depressão da generalidade do país, de resto também pouco interessado, enquanto sociedade civil, quanto ao nosso destino colectivo e alheio. (…) Os portugueses só se mexem e apenas se mobilizam, ou reagem, perante a festa ou a tragédia. No entretanto cultiva-se o medo e a resignação por entre dias de crescentes dificuldades. (…) Vivemos num tempo de decadência. Um novo paradigma de vida há-de, porém, nascer, tem que nascer. Talvez das cinzas, no final, de uma vida a “fazer de conta”, egoísta e sem valores onde só contam interesses individuais ou corporativos, o lucro a qualquer preço e a gratificação imediata”.
Foi por isso que sugeri o título desta crónica. Por vezes, o medo ou a displicência levam a pouca reflexão, sobre os actos que devem ficar em registo para a posteridade.
Efectivamente, uma acta, segundo o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia de Ciências de Lisboa é o registo escrito dos actos ocorridos e das deliberações ou determinações tomadas numa sessão de qualquer assembleia.
Nos trabalhos de pesquisa, ao longo dos anos, sempre me debati com o grande problema de enormes omissões, sobre assuntos importantes, registados duma forma sintética, algo despercebida, por vezes contraditória, outras vezes sem princípio nem fim, o que deixa ao sabor dos ventos e das interpretações, os poucos registos existentes.
Uma acta deve registar com rigor o que se passou numa determinada reunião ou assembleia e, depois, aquando da sua aprovação, o registo das alterações julgadas pertinentes.
Também a acta tem por obrigatoriedade ser objecto de autenticidade, sendo sustentada pelo número de
elementos que dão lugar ao mínimo para que a mesma possa ser aprovada.
Vejamos o exemplo, hilariante, da elaboração de parte de uma acta (sem qualquer valor) durante o tempo de uma das várias crises por que passaram, neste caso, os nossos Bombeiros Voluntários da Covilhã, então no ano 1977: “Existindo vários assuntos para serem tratados, foi esta reunião deliberada somente pelo Director-Tesoureiro: (… ) pontos a deliberar: a), b),c),d), e), f), g), h), i), j)”. Como se pode verificar, foi efectuada uma reunião fantasma, pois não pôde ter qualquer valor, por falta de quórum. Existência de um único elemento da Direcção entre as paredes da sala onde foi redigida… Mas as suas deliberações, de um único e exclusivo elemento, presente na reunião, pelo mesmo marcada, não tiveram qualquer repercussão, já que, na acta seguinte, não foi feita qualquer rectificação.
A acta é, pois, um documento de primordial importância, para a história de um determinado organismo, pelo que os seus registos, além de mostrarem a face dos acontecimentos, devem também ser revestidos de autenticidade.


(In Notícias de Gouveia, de 20/07/2010, Notícias da Covilhã, de 22/07/2010, e Jornal “O Olhanense”.)