22 de novembro de 2006

O HÚNGARO PUSKAS

Os menos jovens recordarão, certamente, este talentoso futebolista húngaro, que, nestes dias, deixou o mundo dos vivos. No futebol espanhol evidenciou fortes recursos futebolísticos, tanto ao serviço do Real Madrid como da selecção espanhola. Também os benfiquistas, e todos os portugueses, amantes do futebol, certamente não esquecerão o memorável dia 2 de Maio de 1962. Como eu, vibraram com a excelente vitória do emblema encarnado, conseguida no Estádio Olímpico de Amesterdão, por 5-3; num jogo pouco propício a cardíacos, muito por influência de Ferenc Puskas, que, aos 17 e 23 minutos da primeira parte, já havia marcado dois golos; para, após o empate, com os golos aos 25 e 34 minutos, de José Águas e Domiciano Cavem; Puskas voltar a desempatar, com um golo que deu o hat-trick, aos 38 minutos.
Por ironia do destino, todos os autores dos primeiros golos já descansam no sono da eternidade; pois os restantes haviam de ser marcados por Coluna e Eusébio (2 golos).
Já lá vão 44 anos e eu recordo bem, no início da minha juventude, ter visto este jogo na antiga Casa da Mocidade Portuguesa, ao fundo do Mercado Municipal, no último prédio do lado esquerdo da Rua Conselheiro António Pedroso dos Santos, que faz esquina para a rua de acesso à UBI .
Com o relato, penso que de Artur Agostinho ou Nuno Brás, via rádio, como opção de alguns colegas; todos nós (só rapazes porque não era hábito, nessa altura, as raparigas se juntarem para este efeito), estudantes de Escola Industrial, do Liceu e do Colégio Moderno; vimos o único canal televisivo, existente nesta zona, a preto e branco, com a casa repleta (nem todos, nessa altura, possuíam televisor nos seus lares).
Apesar do orgulho de ser sportinguista de sempre, fui um dos que gritei, em uníssono, pelos golos do Benfica; recordo o fortíssimo pé esquerdo de Puskas, como as grandes corridas do já careca Di Stefano e do Gento; como, depois, a excelente exibição do capitão José Águas e restantes elementos; a correria do baixinho Simões; o “baile” à turma madrilena, onde os defesas Casado, Miera e Santamaria sentiram enormes dificuldades com a penetração dos avançados benfiquistas, furando as redes de Araquistain.
O frenesim era enorme e a televisão mostrava os milhares de espectadores, como num cacho, e a assistência a um português, acometido de uma síncope, assim como o desfraldar de uma enorme bandeira encarnada.
Puskas deliciava os espectadores com as suas fintas e dribles; os golos foram temidos.
Representou a selecção húngara até ao momento em que a revolução de 1956 na Hungria acabou com uma lendária geração de atletas de alta craveira, onde se integrava Ferenc Puskas – o “Major Galopante”, como ficou conhecido. Marcou 83 golos em 84 jogos pela selecção do seu país, sendo considerado o melhor jogador húngaro de todos os tempos. Foi então para Espanha e é no Real Madrid que firma o seu nome, ao lado de outra lenda do Real, Di Stefano, na altura em que os “merengues” mandavam na Europa do futebol. Em Espanha representou a selecção espanhola. Passou então a ser alcunhado de “Pancho Puskas”, o “Canhão”, pois tinha um remate poderoso e uma aceleração incrível.
Serve também este apontamento para recordar outro húngaro, naturalizado francês, que, no nosso país, jogou no Sporting da Covilhã – André Simonyi – que lhe havíamos perdido o rasto, mas fruto da colaboração da Embaixada de Portugal em Paris, acabamos de saber que já faleceu em 2002.
André Simonyi, designado o “jogador modelo” e o “homem canhão” foi um dos maiores goleadores do SCC, surgindo no topo da listagem dos futebolistas de eleição, tendo jogado nos Leões da Serra, de 8/10/1949 até final de 1954.
No próximo livro sobre a colectividade serrana – “O Sporting Clube da Covilhã na Taça de Portugal – Cinquentenário da Sua Participação na Final” – a ser apresentado em Junho de 2007, os interessados poderão verificar que Simony foi o atleta dos leões serranos que marcou mais golos na 1.ª Divisão – 74 em 86 jogos; depois, a honra de o SCC ver inscrito um seu atleta – Vitoriano Suarez, como o primeiro maior goleador de todos os tempos, na Taça de Portugal, com 15 golos, mantendo-se, até aos dias de hoje, em terceiro lugar, que viria a ser igualado por Iaúca; ultrapassado, em segundo lugar, por Mascarenhas, do Sporting; e para o primeiro lugar, por Eusébio, do Benfica.
Mas, na leitura desta obra, que se encontra já no prelo, não podermos também esquecer um homem simples, que percorre as ruas da nossa cidade, goleador nato que foi nos tempos das 2ª e 3ª Divisões – António José Fazenda – e que vê o seu nome inscrito como o maior goleador da Taça de Portugal, na época de 1974/75, à frente de Yazalde, do Sporting, e outros.
E, nesta passagem efémera pelo mundo, vão desaparecendo aqueles que, para uns, foram ídolos; e, para a generalidade, deixaram marcas da sua vivência e na arte de jogar bem futebol.

8 de novembro de 2006

DA PROMISCUIDADE À CORRUPÇÃO

O estado a que Portugal chegou fruto, mormente, da incapacidade dos últimos governos, que desbarataram oportunidades, depois de terem sido eliminadas duas ditaduras (uma antes, outra no pós 25 de Abril), é confrangedor, algo mesmo revoltante.
Não obstante o direito à indignação, vimo-nos rodeados de muitos incompetentes, oportunistas, de fictícias caridades; aproveitando-se duma justiça fragilizada e displicente; homens ridentes dum escárnio por quem não se soube, ou não se pôde “safar”; homens e mulheres que reivindicam direitos (e por vezes omitem os deveres) exclusivamente para si mas se esquecem que em Portugal há muitos mais portugueses e portuguesas; assim vai, ou tentava ir, este País – que procura agora saber quem foi o melhor português de todos os tempos.
Quem passa as fronteiras verifica a diferença que existe na rigorosidade dos actos dos seus cidadãos, em relação aos portugueses.
Os que detêm a melhor “profissão” da actualidade – a política – podiam, e deviam, servir o País de todos nós, e não a sua “vida” partidária, deixando de excluir os competentes que não são da sua laia, em vez de darem um ninho aos desentendidos que pegam na caldeirinha quando na Páscoa das campanhas eleitorais ainda escovam o fato do candidato convertido em ganhador.
Não se compreende como se desejou dar guarida à continuidade de governos ineficazes, medricas, chegando ao ridículo de termos tido um governo circense; e o seu antecessor, quando se ria do precedente de dar ás de vila-diogo, o mesmo, subtilmente, vaidoso, seguiu os seus passos, depois de ter cuspido para o ar.
Valha-nos a maioria absoluta para as reformas de fundo que era necessário serem feitas, por mais que custem os berros de quem se sente bem nos sofás, porque ainda há muita gente de pé, porque não tem sequer umas tábuas para se sentar.
O trabalho que agora está a ser feito, já deveria ter sido iniciado há uma ou duas décadas atrás, para agora desfrutarmos de algum alento como alguns dos nossos parceiros da UE dele já beneficiam, qual bálsamo ou lenitivo do tempo de sacrifícios por que passaram.
Conforme diz Vasco Pulido Valente, “não existe um partido, um ministro, um autarca que se possa considerar inocente do que se passa hoje. O défice e a dívida são um sintoma, não uma causa. O regime fabricou um Estado inviável, com o dinheiro que não tinha, ou esperança de vir a ter, para cumprir promessas que sabia de ciência certa pura fantasia ou puro cinismo”.
As contestações ao governo eram esperadas; mas Sócrates tem sabido superá-las. Valha-lhe a sua rija têmpera e a de alguns dos seus ministros. Conforme refere Eduardo Prado Coelho, “o país respirou de satisfação quando viu que José Sócrates tomou uma atitude exemplar em relação à Madeira. Teve a coragem – que nenhum Governo até hoje tinha tido – de dizer que era preciso tratar a Madeira segundo a lei e que era preciso dizer a Alberto João Jardim que as coisas iam mudar radicalmente. Porque Jardim estava convencido que podia fazer o que queria e que, depois de explorar descaradamente a metrópole, podia dar-se ao luxo de dizer que os governantes actuais eram “loucos” e que deviam ser demitidos (quando foram eleitos democraticamente e continuam à frente de todas as sondagens). Ao vê-lo, sentimos uma repulsa por esta personagem não apenas demagógica mas rasteira e medíocre”. Eu mesmo diria, que Sócrates tomou a atitude que devia, como Mouzinho de Albuquerque com Gungunhana.
Mas, afinal, no combate à corrupção, tão falada e aproveitada para o discurso de Cavaco Silva do dia 5 de Outubro, onde está o desfecho dos casos tão badalados, duma enorme morosidade, em silêncios ensurdecedores?
Muito haveria para se falar, por todos os cantos do nosso País, e na nossa própria cidade.
Corrupção é também a forma como muitas vezes se exerce a lei do mecenato; corrupção poderá ser a subtileza como um presidente de direcção duma instituição absorve para si negócios que não foram a concurso, com a anuência do restante elenco directivo; eventual “candidato” à corrupção poderá ser, por exemplo, um engenheiro camarário, ou outro qualquer funcionário público, com um escritório aberto a uma actividade comercial em seu nome, o que outrora era altamente proibitiva, e que agora é “abusivamente” de uma autêntica anuência.
Outrora, eram os guarda-rios a conceder benesse na extracção de areias, por favores que lhes faziam os interessados; como os técnicos ou fiscais da Segurança Social a avisarem previamente os “doentes” com baixa, que no dia tal iam ser por ele visitados; como a GNR a perdoar flagrantes infracções e a alvitrarem como deviam dar a volta às Seguradoras.
Muito haveria que falar dos mil rostos da corrupção, mas, conforme diz Jorge Coelho, “a luta contra a corrupção exige mais discrição e mais resultados. Em Portugal há muito espectáculo e depois nada de concreto acontece.”

(In "Noticias da Covilhã", de 08/11/2006)