20 de outubro de 2012

VERDADES INSOFISMÁVEIS

Pertenço a um pequeno número de vivos que integrou as fileiras da Conferência de S. Vicente de Paulo, pela mão de meu pai, conjuntamente com um irmão mais novo, na paróquia de S. Pedro da Covilhã, nos finais da década de cinquenta do século passado.
Sairia com a chamada para o serviço militar, então nos finais da década seguinte. Mas as atividades profissionais, o casamento e os filhos, para além de ter ido residir para outro concelho, e as dificuldades próprias duma vida stressante, levaram-me a um longo interregno fora desta vida de grande solidariedade; quiçá de alguma passividade com o mundo de dificuldades do meu próximo. Voltei há uns anos a esta instituição de grandiosíssimo mérito, por influência de confrades amigos, agora na paróquia da Conceição, da cidade da Covilhã; desta vez com minha mulher e por onde também já passou o meu filho e a nora.
O preâmbulo deste meu texto serve tão só para memorizar quão longos têm sido os caminhos das necessidades básicas de muita gente, cada vez mais com o sofrimento a trazer novidades, entre as quais a pobreza envergonhada, e não só, vertentes desta mesma pobreza que outrora não se verificavam.
Não é estranho para ninguém o que escrevo, pois de casos mais inverosímeis está o País cheio, onde, não fossem as ações das instituições privadas de solidariedade, como são as Conferências Vicentinas e o Banco Alimentar, esta Terra de Cristo já pertenceria a um terceiro mundo.
Num verdadeiro humanismo – aquilo que tantas vezes falta aos nossos governantes -  alguns dos Homens e Mulheres da solidariedade lançam-se num verdadeiro “Grito do Ipiranga”, na tentativa de encontrar soluções mínimas para resolver casos graves de saúde e emprego para uma figura que se chama “Ser Humano”, e, para quem escrevo, não é estranho o que, de formas heróicas, muitos se envolvem, pondo em risco a sua própria saúde e a dos seus que o rodeiam.
Dois casos verídicos se passaram, na exemplaridade de muitos outros, de forte vontade em ajudar o seu semelhante, numa das Conferências de S. Vicente de Paulo desta Cidade da Covilhã.
Para que um trabalhador precário se conseguisse deslocar para fora da cidade, na apanha de fruta, um destes homens de boa vontade, durante vários dias se deslocava ao Pelourinho, às cinco horas da manhã, para levar o trabalhador, graciosamente, para o local onde pudesse minimizar as suas frágeis economias familiares.
Outro dos homens de boa vontade, e sua esposa, conhecedores de um reformado, ainda não idoso, que vivia sozinho, abandonado, entregue à sua sorte, conseguiram ir a sua casa dar-lhe as refeições, de conta dos mesmos, o qual, muito fragilizado, já quase não engolia. Levaram-no a consultas hospitalares, no carro do casal, e a uma última na qual foi detetado encontrar-se gravemente doente, doença de morte, que viria a surgir. O homem de boa vontade, triste pelo acontecido a um ser humano mas paradoxalmente ledo pela sua caridade, intrinsecamente sentida, quando se dirige para o seu automóvel, à porta do hospital, toca o telemóvel, com o aviso do interior do hospital para que se dirigisse ao Centro Médico no sentido de ir fazer uma despistagem, pois o doente, que entretanto falecera, estava tuberculoso.
Anda agora este amigo do próximo envolto em preocupações, e seus familiares, até que todos os sintomas sejam debelados.
Destes atos de coragem, de verdadeiro amor e dedicação extrema a quem sofre, no corpo e no espírito, passam ao lado das preocupações dos nossos governantes.
Estes, são muitos dos heróis desconhecidos dos nossos tempos.
 
(In Notícias da Covilhã de 17.10.2012 e no Jornal Olhanense de 15.10.2012)

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