Sobre este assunto me referi, neste
mesmo espaço, no verão de 2014 (“Dos oito
séculos da Língua Portuguesa à pobre diplomacia”).
Volto ao tema face à Cimeira da
Comunidade dos Povos da Língua Portuguesa (CPLP), realizada em Brasília, na
República Federal do Brasil, nos dias 31 de outubro e 1 de novembro.
Como é sabido, esta Comunidade
completou, em julho, 20 anos e a personalidade inspiradora da sua criação dá
pelo nome de Jaime Gama, então Ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal,
ainda que já tivesse sido sonhada por muitos ao longo dos tempos, mais de uma
década antes do seu nascimento. Pois tal aconteceu aquando de uma sua visita
oficial a Cabo Verde, em 1983, para uma reunião dos membros dos PALOP (Países
Africanos de Língua Oficial Portuguesa), na qual se referiu nestes termos: “O
processo mais adequado para tornar consistente e descentralizar o diálogo
tricontinental dos sete países de língua portuguesa espalhados por África,
Europa e América seria realizar cimeiras rotativas bienais de Chefes de Estado
ou Governo, promover encontros anuais de Ministros de Negócios Estrangeiros,
efetivar consultas políticas frequentes entre diretores políticos e encontros
regulares de representantes na ONU ou em outras organizações internacionais,
bem como avançar com a constituição de um grupo de língua portuguesa no seio da
União Interparlamentar”.
O mundo vivia tempos de Guerra
Fria e o Brasil estava no processo de transição democrática. A diplomacia
portuguesa vivia momentos eufóricos e de grande atividade na sequência da
assinatura do Tratado de Adesão de Portugal à CEE.
O processo evoluiu e ganhou a
dinâmica decisiva na década de 90, mas já então, em novembro de 1989, no
Brasil, no primeiro encontro de Chefes de Estado e de Governo dos países de
Língua Portuguesa (Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique,
Portugal e São Tomé e Príncipe), a convite de José Sarney, Presidente
brasileiro, se decidiu criar o Instituto Internacional da Língua Portuguesa
(IILP), cuja instituição se ocuparia da promoção e difusão do idioma comum da
Comunidade.
Com a evolução na continuidade,
depois de vários eventos realizados, e decisões tomadas, em 17 de julho de
1996, em Lisboa, na nova Cimeira é criada a Comunidade dos Países de Língua
Portuguesa (CPLP). O número de países aderentes passou a oito, em 20 de maio de
2002, com a independência de Timor-Leste. Entretanto, depois de um
circunstanciado processo de adesão, em 2014, surgiu o nono membro da Comunidade
– a Guiné Equatorial.
Tendo em conta que a CPLP se rege
por princípios entre os quais o “primado da paz, da democracia, do estado de
direito, dos direitos humanos e da justiça social”, têm vindo a surgir
incompatibilidades com a Guiné Equatorial, desde do seu início, em virtude do
seu presidente Teodoro Obiang não abolir a pena de morte, refugiando-se em
subterfúgios; assim como não se fala o português (ainda que tenha mencionado
ser acolhida como a terceira língua falada no país), no ridículo advindo de um
país em que sabe que, para integrar a Comunidade, a primeira razão de ser é a
língua portuguesa; e cuja página oficial da Internet está apenas disponível em
espanhol, inglês e francês. A adesão da Guiné Equatorial, em 2014, teve
patrocinadores fortes como Angola, São Tomé e Príncipe e Guiné-Bissau; e o
Brasil, com a sua carta de interesses.
Esta organização internacional
parece estar em declínio face a opiniões diversificadas de cidadãos dos vários
países integrantes, numa deceção com que encaram o presente e o futuro de uma
comunidade cuja existência parece dizer cada vez menos aos milhões de cidadãos
que dela fazem parte, onde a crise, que atingiu vários países, e as
consequências da globalização, são fatores influentes nas tomadas de posição.
Depois, foi o abrir de portas a
novos membros, como a Guiné Equatorial, que não partilham os valores
democráticos e a defesa dos direitos humanos.
Ora, nas negociações desta última
Cimeira, em Brasília, em que o Primeiro-ministro português, António Costa,
propôs “liberdade de fixação de residência” na CPLP, sendo uma boa ideia e
justa não deixa de ser despropositada já que, penso, jamais passará pela
peneira dos parceiros do espaço Schengen, os quais já sentem na pele os efeitos
com os migrantes que teimam com a Europa para poderem viver com tranquilidade.
Nas mesmas negociações tratou-se da entrada de cinco novos países como
observadores associados – República Checa, Eslováquia, Hungria, Costa do Marfim
e Uruguai – que assim se juntam às Ilhas Maurícias, Namíbia, Senegal, Turquia,
Japão e Geórgia.
Pois bem, em vez da Guiné
Equatorial, preferia a admissão do Uruguai, que, embora falando o espanhol, não
tem idioma oficial; e também pela razão história “de que a República Oriental
do Uruguai, como é seu nome constitucional, foi criada para servir de tampão
entre o Brasil e a Argentina, sucessora do império português e do império
espanhol. Muita gente já ouviu falar da uruguaia Colónia do Sacramento, que foi
a mais meridional das cidades portuguesas e se situa em frente a Buenos Aires.
Todo o Uruguai foi, no início do século XIX, parte do Reino Unido de Portugal,
do Brasil e dos Algarves, com o nome de Província Cisplatina. Após 1822, o
Uruguai passou a fazer parte do Império Brasileiro. Em 1825, o Uruguai
tornou-se independente”. E a língua portuguesa é de ensino obrigatório nas
escolas do país. A pena de morte foi abolida em 1907.
Sabemos, contudo, que é enorme o
potencial da CPLP já que se prevê que o número de falantes de português em todo
o mundo ultrapasse os 300 milhões, em meados do século. Por outro lado, metade
das novas reservas de gás e petróleo recentemente descobertas situam-se no seu
espaço.
Esta crónica não nos permite
inserir mais conteúdo importante, como é óbvio, pois daria pano para mangas,
como sói dizer-se. No entanto referir que nesta XI Conferência de Chefes de
Estado e de Governo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) houve
a congratulação com a escolha de António Guterres para o cargo de Secretário-Geral
das Nações Unidas, “o primeiro cidadão de um Estado membro da CPLP a ocupar tão
elevada posição”.
(In "fórum Covilhã", de 08-11-2016)
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