Neste mês de maio do ano da
graça de Nosso Senhor Jesus Cristo de dois mil e dezoito, como se escrevia nas
atas municipais de outrora, já para além da Idade da Pedra e dos Metais, deu-me
na tola de evocar expressões que, usadas pela minha avó materna, que partiu há
muito quase centenária (o que hoje já não é novidade, mas naqueles tempos era),
fazem momentos de humor entre amigos, quando sentados à mesa, principalmente de
lautos apetites.
- “Anda côme, que isto não
está ruim!”. Dizia a avó Rita. E, pelas bandas da Pousadinha algumas vezes a
acompanhei ao curral (que isto de pocilga é mais para os tempos modernos) para “botar
a vianda aos bácoros”, com o “Vaidoso” e o “Malhado” que eram também dos nossos
melhores amigos, mas já esticaram o pernil, salvo seja, as patas, a
contentarem-se com os dias de sol, descansando à sombra duma figueira, enquanto
as galinhas e os marrecos aproveitavam o farelo que lhes davam para além do
milho. Cinco mil réis talvez não
custasse um bácoro (e era preciso ver se não tinha grainha) mas o dinheiro não
dava para tudo e era preciso pagar a décima, quando alguns também arrotavam com
a taxa militar porque haviam ficado livres da tropa. Livraram-se, sim, porque
até podiam ir parar a algum quartel longe da famelga que não fosse o Batalhão
de Caçadores 2 da Covilhã, para já não falar dos desgraçados que foram
obrigados a embarcar para a Índia, com Goa muito falada.
Eram os anos 50 da nossa era, mas
do outro século. E entre “bota aí mais uma pinga que a comida não está somenos”,
que isto de comeres e beberes é que nos dão vida, porque a própria vida são
dois dias, havia por vezes aquele grito:
- “Esse bandido do Salazar é
que é o culpado!...”. Lá levava um raspanete o atrevidote, que, um pouco mais
avinagrado, lançava o bode expiatório da miserável féria que não dava sequer
para comprar o milho painço para as pombas, quando até aos coelhos lhes chegou
a malina.
E dizia o avisador cauteloso:
- “Tu não sabes que por ter morrido o Carmona e lá estar o Craveiro Lopes,
ainda há por aí muitos bufos?!... Ainda vais parar às grades!”
É que isto também não é para
todos terem vivido em dois séculos.
E agora, já que os herdeiros
bateram a bota, coube-nos a desgraça de termos de limpar o pinhal.
Mas, Ripa na Rapaqueca, porque
fez agora treze anos, no dia 6 de maio, que faleceu o jornalista e locutor
desportivo Jorge Perestrelo. Uma das figuras do jornalismo desportivo mais
importantes da rádio portuguesa. São dele esta expressão que se tornou célebre,
assim como “É disto que o meu povo gosta”, e “O que é isso, ó meu?” Relatou
dois mil e um golos à boleia de gritos, de entusiasmo e de um ritmo que dava o
dom de cativar todo e qualquer ouvido. Era aí, no golo, no momento em que o
futebol celebra, que mais encantava. Como fez em 2004, no Estádio da Luz,
quando viu Ricardo, um guarda-redes, a marcar a outro, ao da Inglaterra, quando
a Seleção Nacional ganhou nos penáltis nos quartos de final do Europeu.
Jorge Perestrelo era assim
mesmo: vivia e relatava tudo de alma cheia, como se de um adepto se tratasse.
Fosse qual fosse a equipa. No dia anterior ao de se lhe calar definitivamente a
sua voz, ainda estava de headphones na
cabeça e de microfone na mão, a relatar, sem saber, o último golo da sua vida,
o que Miguel Garcia marcou em Alkmaar, na Holanda, que apurou no último minuto
o Sporting para a final da Taça UEFA. Aí, sim, não se cansou de gritar “Golo!”,
antes de dizer “Te amo Sporting!”.
Usava a voz como um pincel para
colorir o que via. Foi na SIC e na TSF onde passou largos anos da sua carreira,
que celebrizou expressões como as atrás referidas. Quando via no relvado alguém
a falhar um golo feito ou a fazer algum disparate, era comum questionar: “O que
é isso ó meu?”, a que já aludimos.
Tinha um estilo emocionante,
vibrante e muito alegre. A maneira de narrar o futebol, as palavras que
inventou para descrever toda a emoção no futebol. E ainda se lhe conhecia mais
esta expressão: “Eu com a minha barriguinha chegava e faturava”. Foram inúmeras
as expressões evidenciando o seu fulgor.
Do 25 de Abril, do 1º de Maio
e dos 50 anos de Maio de 68 já muito se falou. Voltamo-nos para política? Sobre
os fantasmas do PS? Os venerandos José Sócrates, Manuel Pinho e quejandos que também
participam na festa dos espertos?
Agora até temos a Coreia do
Norte com a Coreia do Sul a procurarem a paz! Felizmente!... Que seja uma
realidade!...
Mas desta vez não estou
disposto a falar destes temas. Bonda! – Como dizia a minha avó, e Ripa na Rapaqueca!...
como se expressava Jorge Perestrelo.
Entretanto, não posso deixar
de me congratular com o facto do Papa Francisco ter nomeado bispo de Viseu, o
padre António Luciano dos Santos Costa, que chegou a paroquiar na Covilhã e a
exercer outras funções, pelo que formulo os melhores votos de sucessos
pastorais, com muita pena de não passar a ser ele o Bispo da minha Diocese – a
Guarda. O meu abraço amigo.
(In "fórum Covilhã", de 08-05-2018)
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