O mês de agosto deste ano veio
tórrido e, contrastando com o ano anterior em que estava a ter uma época de
incêndios mais pacífica, acabaria por surgir uma semana funesta com o incêndio
de Monchique, a alterar tudo, para ao fim de uma semana passar a ser o maior
incêndio do ano na Europa. E outros
foram surgindo, com menor dimensão, como os de Benespera e Seia.
Longe vão os tempos – aqueles dos
candeeiros e fogareiros a petróleo, e, no inverno, braseiras de carvão ateadas
a carqueja – em que não se via esta calamidade dos incêndios florestais.
Recordo apenas, desses tempos,
quando tinha os meus vinte anos, e já depois de ter ido à inspeção militar,
para cujo cumprimento do serviço militar obrigatório fiquei apurado, de ter
ocorrido o grande incêndio da Serra de Sintra, de 6 a 12 de setembro de 1966, no
qual morreram 25 militares do R.A.A.F. que operavam no local e foram
surpreendidos e cercados pelas chamas.
Mas também na altura em que
escrevo esta crónica recordo o incêndio do Chiado, ocorrido há precisamente 30
anos, no dia 25 de agosto de 1988, cujas chamas devoraram vários edifícios do
Chiado e deixaram em ruínas aquela zona história de Lisboa em menos de cinco
horas. Se Marina Tavares Dias, no Diário
de Lisboa, dizia que “os prejuízos e as perdas para o património de Lisboa
são apenas semelhantes às provocadas pelo terramoto de 1755”, eu atrever-me-ia a compará-lo, numa fase inicial, ao dramático
grande incêndio de Londres, ocorrido na madrugada do domingo 2 de setembro de
1666.
Nessa altura ainda se sentiam as
quatro estações do ano bem definidas. Nos tempos que correm, face às alterações
climatéricas, quase que já não damos pela Primavera e pelo Outono, passando
quase só a existir três estações: Verão, Inverno e a estação dos caminhos-de-ferro…
Quase que se deixou de passar
pelo período da silly season.
Mas já que Eduardo Sá, psicólogo
clínico, psicanalista, professor e escritor desenvolveu na sua interessante crónica
in Público, de 25-07-2018, o tema “São os homens que falam menos ou as
mulheres que falam de mais? “, vai daí, perante umas férias neste oitavo
mês do ano, com um casal amigo, onde o descanso se combinou com a distração, e
a gastronomia a jeito de satisfazer o nosso palato, lançámos fora as tristezas
e acolhemos mais os momentos de hilaridade.
Para evitar pensar no terror da
efeméride que aí vem, do 11 de setembro de 2001 (mais um famigerado setembro…)
preferi recordar a canção “Setembro” que Madalena Iglésias cantou em Barcelona,
em 1966, no Festival do Mediterrâneo, e no qual se classificou em 2.º lugar.
“É que já tenho menos tempo para
viver daqui para a frente do que já vivi até agora, tenho por isso mais passado
que futuro e já não tenho tempo para lidar com mediocridades. Não podendo fugir
da minha mortalidade, quero caminhar perto de coisas e pessoas de verdade
porque o essencial faz a vida valer a pena, isto, para nós, que já temos mais
passado que futuro”. (adaptação do escritor Mário de Andrade).
E já que falei de tropa, o meu
amigo Carlos tinha vindo de Moçambique, no cumprimento da sua missão naquele
ano de 1969, conjuntamente com o seu camarada e amigo João Abelha. O Carlos
estava então em Sacavém em casa de uns familiares, regressado do Ultramar há
dois meses. Resolve ir visitar o seu amigo. Apanha um autocarro em Sacavém até
Alenquer. Aqui, um táxi leva-o até Labrujeira. Pelo caminho, conversa com o
taxista que desejou inteirar-se sobre o que é que o Carlos ali ia fazer.
- Venho ver um amigo que esteve
comigo em Moçambique – o João Abelha.
O taxista conhecia o homem, que
morava na Labrujeira. Aqui chegados, entram num café e o taxista informa o dono
da amizade entre o seu cliente e o João Abelha.
- O João Abelha?! Grande
amigalhaço! Respondeu de imediato o dono do estabelecimento. Quando soube que o
Carlos era amigo dele não lhe deixou pagar a despesa e disponibilizou-se a
levá-lo a casa. Durante o percurso, apareceram vários conterrâneos que
conheciam o João Abelha e que o fizeram entrar nas adegas, convidando-o a beber
do seu néctar. É amigo do João Abelha, não paga nada!
Com o dono do café chegam
finalmente a casa do João Abelha, depois da gentinha querer saber o que o
Carlos estava ali a fazer. Amigo do João Abelha?! Tem que entrar na minha adega
e provar o vinho. A despesa que se fazia continuavam a não a deixar pagar ao
amigo Carlos. Não, porque é amigo do João Abelha!
O Carlos lá teve que ficar uma
noite em casa do amigo, já bem aviado da vinícola e depois lá partiu para a
casa dos familiares em Sacavém.
Tempos duros em que a juventude
fora lançada às feras por terras longínquas, muitas vezes sub-repticiamente
para evitar alarmes que provocassem o palácio governamental salazarista e
marcelista. Depois, claro, o grito aliviado naquela liberdade ainda que em
tempo de ditadura.
(In "Notícias da Covilhã", de 30-08-2018)