29 de outubro de 2010

REMINISCÊNCIAS

 
1 – Contrariamente ao que se passa, na sua generalidade, por este País fora, e no estrangeiro, as igrejas da Covilhã encontram-se encerradas após as liturgias matutinas – excepção quando existem funerais. Fugindo à regra, nesta excepção, estão as igrejas da paróquia da Conceição – a de S. Francisco e a do Rodrigo – proporcionando, assim, aos covilhanenses, a sua frequência, mas também aos turistas as suas visitas.

Compreendemos que actualmente existem perigos acrescidos fruto da marginalidade e do vandalismo que surge por estas paragens.

Vejamos a Igreja de Santa Maria, com muitos altares dignos de ser vistos. Algumas vezes, quando por ali passo, verifico alguns visitantes a olharem para o ar, enquanto que outros procuram localizar um possível horário de abertura daquele templo.

O assento da primeira pedra da Capella Mór da Egreja de Santa Maria Maior de Covilhan (com a grafia do seu tempo) teve a sua inauguração no dia 17 de Março de 1873. O programa da festividade que a inauguração encerrou, dizia assim: “Far-se-há annunciar a cerimonia às 7 horas da manhã, por uma girandola de foguetes, repiques de sinos da Egreja e Camara, e toque de phylarmonicas. Ao meio dia toque de sinos e outra girandola. Serão convidados – a Camara Municipal com os seus empregados, o Administrador e seus empregados, o Juiz de Direito e empregados do Juizo, o Delegado, sub-Delegado de Saude e Facultativos do Partido, o Commandante e Subalterno do Destacamento e subscriptores. A`s 4 horas e meia sae o prestito da Camara Municipal para o local da inauguração, indo em ultimo logar a Commissão. Chegados ao local da inauguração, se dará começo ao acto com a benção da primeira pedra, depois o Presidente da Commissão, dirigirá algumas palavras aos srs. convidados, e offerecerá a colher ao Presidente da Camara, ao Administrador do Concelho, ao Juiz e ao subscriptor Visconde da Coriscada: depois do que, se cantará o hymno da festa, e em seguida as phylarmonicas tocarão o hymno de Pio IX. Segue o prestito para a Egreja, onde, com as mesmas precedencias, se assistirá ao Te-Deum.

HYMNO

Exultai Ledos! Anjos Celestes! Ledos cantos da terra partindo

N’este acto em que Deus se compraz Vem unir-se do Céo ao folgar;

Novo gozo, prazer, alegria Correi Anjos, cantando á porfia

Este dia – festivo nos traz! Com a harmonia – que a terra soltar!”


 
2 – Memorizar o passado e afastando assim uma certa nostalgia, tem dado lugar a encontros organizados, regulares, geralmente anuais, entre grupos – os antigos alunos, os antigos professores, os antigos combatentes do Ultramar.

Mas também existem amigos de infância, dos seus tempos de adolescência e juventude, de determinado bairro, rua ou travessa, que, nos tempos de outra vivência, em que não se conheciam as novas tecnologias, e ainda não tinha surgido a televisão, viviam-se entretanto períodos de mais paz e menos turbulência social. Havia contudo as guerras coloniais mas desconhecia-se a marginalidade, a toxicodependência, e, numa certa paz (por vezes balofa) saboreavam-se mais os prazeres do campo e os passeios da juventude, em redor das paróquias.

Assim nasceu um encontro – há muito desejado – o Primeiro Encontro de Amigas da Travessa do Viriato da Covilhã, realizado no dia 2 de Outubro, no Entroncamento. Foi um dia inolvidável para as amigas de há mais de cinquenta anos, que ali se reuniram, num almoço, vindas da Covilhã, Castelo Branco, Abrantes, Vila Franca de Xira e Lisboa.

A permuta de fotografias antigas e as memórias do “Ecos da Paróquia”, do Padre Carreto, de S. João de Malta, freguesia de S. Pedro, foi deslumbrante.

Depois, terminou em Torres Novas, e com uma visita à feira dos frutos secos, ficando a esperança que, no próximo ano, se verifique o segundo encontro, mais ampliado.



(In Notícias da Covilhã, de 28/10/2010; Notícias de Gouveia, de 29/10/2010, e Jornal Olhanense)

12 de outubro de 2010

CONTENDA FORA DOS ESTÁDIOS

Pela primeira vez, a principal colectividade desportiva desta região beirã, vai apresentar-se a eleições, com dois candidatos. Realça-se assim a maior importância dedicada ao histórico Sporting Clube da Covilhã (SCC).

Que seja um acto dignificante para a nossa Cidade, já que de tudo o que se passar é o nome da Covilhã que ganha ou perde.

As atitudes indignas de alguns intervenientes, na última Assembleia-Geral do SCC, vieram a passar de “bestial a besta” o Presidente da Assembleia-Geral.

O SCC foi o meu Clube de sempre, desde os tempos em que, gaiato, não tinha dinheiro para ir ao futebol e aguardava pelos vinte minutos finais de abertura dos portões para entrar no “Santos Pinto”. Cá fora sofria com o resultado, e, depois, aguardava que os jogadores forasteiros saíssem. Era o tempo da antiga Primeira Divisão.

Como covilhanense, e sócio do Clube, não devo alhear-me dos seus problemas. Tenho pena que este desentendimento, que não é crise, tenha acontecido, já que sou amigo e tenho consideração pelas duas partes envolvidas – Presidentes da Assembleia-Geral e da Direcção do SCC.

Tenho a minha visão própria do Clube em geral e das suas pessoas. Não somos todos iguais. Vivemos em democracia e em democracia se devem resolver as questões.

Um dos actos que sei estar presente na mente dos Homens da contenda é a manutenção e desenvolvimento da formação das camadas jovens do SCC, pelo que há esperança.

O SCC merece voos mais altos direccionados para a I Liga, com pedras basilares que sejam activos do próprio Clube para poderem vir a ser mais-valias no futuro. Não podemos andar com situações latentes entre a manutenção e a descida de divisão do SCC. Será nesta visão que vou escolher o candidato.

É, no entanto, de lamentar que um Homem que deu muito ao Clube, em termos financeiros, nos tempos que correm – e poderá continuar a dar – tenha sido “apedrejado”, num esquecimento de que estes Homens não surgem com facilidade. E ele, do clube, nada necessita.

Quando eu procurava arranjar fundos para satisfazer a despesa tipográfica com o meu quarto livro sobre o SCC, foi António Lopes que, espontaneamente, se dispôs assumir o pagamento das suas despesas. Pagou as verbas em falta e o produto da venda reverte a favor do SCC.

António Lopes será sempre sócio benemérito, por mais escorraçado que seja, apesar de ter devolvido ao SCC todas as distinções que lhe foram concedidas.

Outros clubes, como soe dizer-se, andariam com o Homem nas “palminhas das mãos”.

E, como também é hábito dizer-se que “Santos da porta não fazem milagres”, cumpre-me, entristecido com a última Assembleia-Geral, apresentar parte do currículo de António Lopes:

- Conhecido sindicalista na Covilhã, aquando da grave crise por que passaram as Minas da Panasqueira, com grande actuação, alguns dias, junto á Câmara Municipal da Covilhã, durante a greve daquele sector mineiro; passou depois a empresário de sucesso, e é reconhecido pelo governo brasileiro – Estado do Rio de Janeiro –, com a atribuição da Honorífica Medalha Tiradentes – a mais alta condecoração do Estado brasileiro –, em 2001, registando mesmo a expressão de “humilde em sua grandeza e grande em sua humildade”, “importante cidadão do mundo”; título de “Cidadão do Estado do Rio de Janeiro”, em 2001; título de “Cidadão Campista de “Campos dos Goytacazes” – Brasil; sócio Benemérito da “Associação de garantia ao Atleta Profissional/RJ (Rio de Janeiro); reconhecido pelo Governo da Madeira, de Alberto João Jardim; Presidente da Assembleia Municipal de Oliveira do Hospital. Podem ainda ver o seu nome numa rua – Rua António Santos Lopes – Vila Franca da Beira.

Enfim, para além de muita acção benemérita noutros clubes e associações, nomeadamente de Unhais da Serra (e actualmente na Associação de Futebol de Castelo Branco), a sua benemerência estendeu-se também a algumas Associações de Bombeiros Voluntários.

E, com tudo isto, é este Homem desprezado e insultado?

Não consigo comentar tais condutas.

Aqui fica a minha contribuição para o esclarecimento das mentes desinformadas.


(In “Tribuna Desportiva”, de 12/10/2010 e “Notícias da Covilhã”, de 14/10/2010)

1 de outubro de 2010

Dignificação do Mediador Profissional de Seguros


(In Vida Económica – Separata de Seguros, em 1 de Outubro de 2010; e no Boletim Digital “Essencial Seguros”, respeitante ao mês de Outubro 2010)

AS MINAS DA PANASQUEIRA, SITAS NO CONCELHO DA COVILHÃ, EXISTEM HÁ 115 ANOS

O trabalho das minas é um dos mais difíceis e de grande perigosidade, em qualquer parte do mundo.

E, de vez em quando, surgem as notícias catastróficas em minas, com a perda de muitas vidas.

Há já algumas semanas que mais de trinta mineiros chilenos aguardam, num sopro de esperança, que possam ser salvos, a mais de setecentos metros de profundidade, enquanto que, por um pequeno tubo, e face às novas tecnologias, vão recebendo alimentação, roupa e o que é possível fazer lá chegar, já que são necessários alguns meses para que, com a perfuração para uma abertura, possam ser retirados, um a um, num acto hercúleo, todos os mineiros.

E, independentemente destes perigos, outra situação atraiçoa os mineiros, através das doenças inerentes a esta actividade, como a silicose, que afecta os pulmões destes trabalhadores, incapacitando-os para o trabalho, pois é a mais antiga e mais grave das doenças pulmonares, sendo a mais predominante à inalação de poeiras minerais.

Nas freguesias do concelho da Covilhã, vizinhas das Minas da Panasqueira, como São Jorge da Beira, Aldeia de S. Francisco de Assis, Sobral de Casegas e Casegas, e, por isso, com muitos dos seus habitantes a trabalhar naquela actividade, viam-se muitas famílias, nos primeiros anos da década de setenta, confrontados com a incapacidade, e até a morte, de muitos dos seus familiares, que ali ganhavam o sustento da família. Lá iam aguardando que chegasse o fim do mês para receberam as pequenas pensões vitalícias das Seguradoras, onde então as doenças profissionais se incluíam no âmbito dos acidentes de trabalho. Isso depois acabou e passou a Segurança Social a ser a responsável pelas pensões.

Após o 25 de Abril, com a reivindicação dos trabalhadores, não só da indústria de lanifícios, como de toda as outras actividades, chegou também a altura de forte contestação, com uma grande greve, prolongada, dos mineiros das Minas da Panasqueira, tendo-se deslocado à sede do concelho, e, junto da Câmara Municipal da Covilhã, permaneceram alguns dias, chegando a dormir em frente ao município, com a RTP, de um único canal (ainda aqui não chegava o 2.º canal) a fazer a reportagem. Ainda não existiam as televisões privadas, mas havia muitos jornalistas não só nacionais como estrangeiros.

À frente desses mineiros encontrava-se um forte delegado sindical, de nome António dos Santos Lopes. Esta figura haveria de ser, mais tarde, um grande empresário, tendo partido para a Madeira e Brasil, onde exerceu o seu negócio, sendo um empresário de sucesso, nos tempos difíceis que se atravessam.

Na Madeira chegou a ser presidente do clube de futebol, União da Madeira, e, actualmente, é o Presidente da Assembleia-Geral do Sporting Clube da Covilhã e seu segundo sócio benemérito.

Além do SCC, também aos bombeiros e outras colectivas, desportivas e não só, tem apoiado financeiramente, num acto de benemerência.

As Minas da Panasqueira haviam encerrado no ano de 1993 mas, após dias difíceis, surgiram novas perspectivas laborais, precisamente no ano em que completaram um século de laboração, em 1995, tendo reaberto uma vez que o valor do tungsténio, no mercado mundial de volfrâmio, atingiu um preço compensatório e favorável à exploração do minério.

Segundo um interessante trabalho de Fabião Baptista, inserido no “Notícias da Covilhã” de 21-04-1995, verificamos como tudo começou.



Com o Carvão vem o Volfrâmio



Decorria o ano de 1895.

O Inverno ia agreste. Lufadas de vento siberiano eram coadas pelas acerosas agulhas dos frondosos pinhais. Bátegas de água, fustigadas pela ventania, tamborilavam nas vidraças das janelas quase a desconjuntar-se. O rio Zêzere, esse apresentava enorme cheia, alargando as courelas e tapadas adjacentes ao leito do rio.

Indiferente a tudo isto, Manuel dos Santos, com os pés estirados em direcção ao calor acariciador que vinha da braseira, lia atentamente o “Diário de Notícias” .

A leitura era interrompida pela abrupta entrada de uma das suas filhas, que lhe anuncia a chegada do carvoeiro, o Pescão de Casegas. Manuel dos Santos manda entrar de imediato o homem, pois tem grande necessidade de falar com o Pescão.

“Olha lá, ó Pescão, nas terras onde costumas fazer carvão, nunca encontraste pedras reluzentes?”

- “Por sinal, patrão – retorquiu o carvoeiro – tanto na Panasqueira, como no Cabeço do Pião, tanto na Madorrada, como no Vale Torto, quando faço as “torgas”, aparecem sempre uns calhaus negros, lascados, muito luzidios e pesados e outros transparentes como o vidro. Todos eles brilham bastante à luz do sol. Se o patrão quiser, posso trazer-lhe uma “taleigada” deles, quando voltar com a nova saca de carvão”.

Manuel dos Santos, que vivia numa solarenga casa na Barroca do Zêzere, ao fundo do Povo e muito próximo da capela de S. Romão, indagou deste modo o seu solícito fornecedor de carvão, porque momentos antes havia lido no “Diário de Notícias” um anúncio chamando a atenção para a provável hipótese de existência em solo português de importantes jazigos de minérios, ainda por explorar.

Deste modo, no próximo fornecimento de carvão, o Pescão de Casegas lá trazia a prometida sacola, repleta de pedras negras, esverdeadas, amareladas, translúcidas, brancas, brilhantes e transparentes.

Manuel dos Santos era um abastado proprietário rural, homem muito vivido, deveras perspicaz e sempre metido em negócios.

Logo que teve na sua posse as tão ambicionadas “pedras”, foi de imediato a Lisboa, à direcção que vinha indicada no anúncio do “Diário de Notícias”, tendo-se avistado com o eng.º Silva Pinto, professor catedrático em mineralogia.

Procedendo às necessárias análises clínicas e laboratoriais, veio a saber-se que se estava na presença de enorme riqueza, pois o subsolo daquela região da Panasqueira escondia no seu seio um precioso jazigo de volfrâmio (as pedras negras, pesadas, lascadas e reluzentes), cassiterites, pirites e calcopirites (os penedos amarelo-esverdeados) e quartzo hialino (os minerais transparentes e parecidos com o vidro).

Aconselhado pelos analistas, Manuel dos Santos, ao regressar à Barroca do Zêzere, trata logo de comprar uma boa porção de terreno, registando de seguida uma concessão de minérios, em seu nome, com a denominação de Minas da Panasqueira.

Seria interessante ver o desenvolvimento desde grande negócio, que transcendeu Manuel dos Santos, deu trabalho a milhares de mineiros, por esses anos fora, com períodos áureos, mas temos que respeitar o espaço deste jornal.

No entanto, não quero deixar de registar que, no sítio designado “Mina Cimeira” se rasgaram as primeiras galerias, antes de 1910, e se em 1934, o número de operários era de apenas 759, subiu rapidamente para 2000. Em 1942, já era de 4457 e em 1943, de 5790. Se somarmos a estes números mais 4780 operários que se empregavam nos trabalhos do “quilo” (trabalhadores por conta própria, vendendo depois o minério à mina), as Minas da Panasqueira chegou a empregar 10.750 trabalhadores.

De 1942 a 1944, altura da II Grande Guerra Mundial, novamente a volframite conhece uma procura nunca dantes vista. O mercado mineiro desenvolve-se. É a época do “salta-e-pilha”.

Depois foi a grande crise. No dia 12 de Julho de 1944, o Governo proíbe, em território nacional, toda a exploração e exportação de volfrâmio. É o despedimento geral. Apenas ficam alguns operários para vigilância, conservação e reparação de todo o espólio que ficou inerte e paralisado.

Posteriormente, até aos dias de hoje, as minas voltaram a funcionar em pleno, com os “homens toupeiras” a arrancar às entranhas o precioso mineral, seguindo-se novamente crises e períodos de alguma estabilidade, como já foi referido.

(In Jornal O Olhanense, de 1 de Outubro de 2010)