12 de novembro de 2014

QUANDO O TIRO SAI PELA CULATRA

Timor faz parte das notícias enfáticas mais recentes. Foi em 1512 que lá chegaram os portugueses e passaram a colonizar este território, que o utilizaram durante quatro séculos. Nos meus tempos da primária, era a última província ultramarina a ser estudada nos compêndios de geografia. Era uma parte de Portugal, que, lá para as profundezas do Planeta, servia não sei para quê. Mas, entretanto, surgem as guerras coloniais, subversivas como os governantes desse tempo as apelidam. Também para lá se deslocam contingentes militares para a defesa do Portugal multirracial que integra o Império Português. E os militares, hoje antigos combatentes, para aí deslocados do Continente, encontram um dos territórios ultramarinos onde ainda não há guerrilha a sério. Ali, e também em São Tomé e Príncipe e Cabo Verde não se vislumbram os receios do que aconteceu a muitos que tombaram nas Colónias da Guiné, Angola e Moçambique.
Mas o ano de 1961, para além de fazer agitar o País, para as bandas do Atlântico, com as notícias das guerrilhas em Angola e a invasão de Goa, e, depois, Guiné e Moçambique, faz acordar também os outros territórios um pouco mais sossegados.
Enquanto pode, Timor Português mantem-se sem incomodar o colonizador, até que surge o 25 de Abril em Portugal. A independência do território do solo nascente, entre uma guerra civil, surge duma forma temerária, em 28 de novembro de 1975. Mas só depois de se terem livrado das garras da dominação indonésia, que considerou a sua 27ª província, e originou grande mortandade, não obstante muitas denúncias de vários países e de fortes pressões de Portugal, a Organização das Nações Unidas (ONU) decide criar uma força internacional para intervir na região, o que acontece com a sua entrada em Díli, a capital, em 22 de setembro de 1999. É então que o líder da resistência timorense, Xanana Gusmão, sai da prisão onde se encontra, na Indonésia. Este país, que entretanto, deixa o controle de Timor, vai proporcionar que os timorenses, em 20 de maio de 2002, ergam um novo País – Timor-Leste – sendo o primeiro novo Estado soberano do século XXI.
Portugal é incansável ao lado e na defesa do povo timorense, durante o período crítico do jugo indonésio. Estabelece relações de grande amizade, reconhecendo a justa luta, ao lado do seu povo, de figuras proeminentes, desde o tempo em que, como Xanana Gusmão, atual Primeiro-Ministro, e que fora já o 1.º Presidente da República, dura a chefia da resistência, largos anos, que passa entre o mato e a prisão.
Todo o Portugal se enternece com os sacrifícios e muitas torturas por que passa o Povo Maubere. Quando presido à “Apae Campos Melo”, diligencia-se a vinda à Covilhã, para o aniversário da associação, dum grupo de timorenses – “Taci Feto Taci Mane” –, a residir em Lisboa. Participa com as suas danças tradicionais. E uma interessante exposição alusiva a Timor, em 17 de junho de 1995, em colaboração com a Biblioteca por Timor, em Lisboa, é proporcionada aos Covilhanenses. Altura em que lutam fortemente contra a dominação indonésia. Em 19 de junho de 1996, também segue uma carta para Xanana Gusmão, na prisão em Jakarta (L.P. Cipinang – Jalan Raya Bekasi), aquando do seu 50º aniversário natalício: “Parabéns pelos 50 anos de vida, parte dela na luta pela causa do Povo Maubere (…) Mas fique ciente que um dia a sua coragem e determinação há-de servir para a libertação do seu povo. Pela nossa parte, estaremos sempre atentos à vossa justa causa e daremos todo o apoio possível, dentro das nossas possibilidades, como o reforço da divulgação que fizemos por um Timor livre e independente (…)”.
Entretanto, o poder geralmente corrói e altera comportamentos e atitudes, colocando, quantas vezes, os valores, por que se debatiam, esfumados, e denegridos.
Efetivamente, não gostámos de ver Xanana Gusmão, no dia 23 de julho de 2014, aquando da Cimeira da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), realizada em Díli (Timor), ironia da história, a levar o ditador Teodoro Obiang, da Guiné Equatorial, de início, pela sua mão, contrastando com aquilo que foi a sua luta contra a ditadura.
Agora, é Xanana Gusmão e o Conselho de Ministros do seu Governo, que determina a expulsão de Timor, num prazo de 48 horas, dos funcionários judiciais internacionais, incluindo cinco juízes e um oficial da PSP de nacionalidade portuguesa, invocando “falta de capacidade técnica” para “dotarem funcionários timorenses de conhecimentos adequados”. Atitude que não está em conformidade com tudo o que Portugal fez pelos timorenses.
A Ministra da Justiça de Portugal, e muito bem, fez cessar, de imediato, todas as contratações existentes e renovações contratuais dos funcionários judiciais internacionais, a exercer funções nos vários órgãos judiciais daquele país, e a cooperação existente, neste âmbito.

Chegam agora notícias do envolvimento de figuras, e do próprio Xanana, em casos de corrupção. Muita tinta ainda vai que se gastar com esta conduta, qual ingratidão. Depois do país ter saído das cinzas, emerge a preocupação timorense pela reação portuguesa. Chega-se à conclusão que, afinal, o tiro saiu pela culatra.

(In "Notícias da Covilhã", de 13.11.2014)

11 de novembro de 2014

CULTURA BEIRÃ

Das exaltações surgidas na leitura de algumas notícias dos semanários regionais deste último fim-de-semana, ao ponto de alguns protagonistas não olharem a meios para atingir os fins, foram evidentes algumas bofetadas de luva branca.
Já lá vai o tempo que quando um autarca largava o poder em democracia, lobrigava-se, quase sempre, um caminho a percorrer sem que houvesse obstáculos de maior, na prossecução das tarefas municipais que são sempre muitas.
A partir do momento em que não se aceita a democracia, se assalta o povo num adjetivar pensante de burro e estúpido porque não votou na pessoa que o ditador deseja, mas votou de sua livre vontade, então perde-se o tino.
Isso já aconteceu há uns anos, em que a cor política vencedora da edilidade covilhanense mudou e, então, vai daí, nenhum dos que se haviam apresentado ao eleitorado quiseram tomar posse e apresentaram, então, uma equipa B, que eu, na altura, designei da segunda divisão.
Desta vez, novamente com a alternância de poder autárquico verificada, democraticamente, surgem ventos ciclónicos duma corrente de ar poluída de calúnias cobardes em blogues anónimos, que, ingenuamente, circulam na Internet. Se é verdade, há que dar a cara, mas não!
A bofetada de luva branca foi dada na aprovação dos orçamentos municipais, de todas as Câmaras desta região, e, no que concerne à da Covilhã, os homens da governação concelhia viram a aprovação do orçamento sem um voto contra, incluindo da oposição, que teve apenas em um dos elementos a abstenção. Há muito tempo que isto não acontecia! Certamente porque os vereadores da oposição, na mente de certos senhores fora da corrida, são também burros e estúpidos. Será?
As restantes Câmaras mais próximas, desta região, também viram os seus orçamentos aprovados sem dificuldades: Fundão e Belmonte.
Vamos à cultura. É assaz importante verificar que a região está a dar à cultura um espaço que a mesma merece, contra ventos e marés de outros tempos. A região carece da mesma, e já que começou a ser levantado o véu da interioridade, é nos homens do leme das governações locais que se encontra a força para levar por diante o conhecimento e a cultura.
O 1.º Festival Literário Gardunha 2014, realizado nos dias 22 a 28 de setembro, no Fundão e Gardunha, promovido pela Câmara do Fundão, foi um autêntico êxito. Foi o primeiro festival literário temático focado na literatura de viagens a ser criado em Portugal. Durante alguns dias, cerca de trinta escritores e ensaístas embarcaram na viagem pela Gardunha, nos caminhos da imaginação, rompendo assim o isolamento cultural da região.
Ainda sob a égide do município fundanense, e com o apoio da Universidade da Beira Interior (UBI) e Jornal do Fundão, foram atribuídos os Prémios de Jornalismo Jornal do Fundão.
Na Covilhã, o Teatro das Beiras, anteriormente designado GICC, foi fundado em 7 de novembro de 1974 e comemora agora 40 anos, numa ação louvável da cultura teatral na Covilhã e Região, tendo já percorrido outras zonas do país. É obra! Estão de parabéns todos os obreiros desta instituição, já sobejamente conhecida, principalmente na pessoa do seu diretor e fundador, Fernando Sena.
E os festivais literários vão continuar com força pela região beirã, sob a dinâmica dos edis locais.
Mas, antes, quero recordar, já lá vai quase uma década, o que ocorreu também na Covilhã, em 16 de julho de 2005, no Pólo das Engenharias da UBI – um Congresso Literário, designado como Primeiras Jornadas de Literatura, onde estiveram presentes meia centena de notáveis escritores. Foi, talvez, o maior evento, realizado na Covilhã, depois de recuar mais de sete décadas, para encontrar um espaço com um acervo cultural importante como foi o III Congresso Nacional dos Bombeiros, também realizado na Covilhã, em julho de 1932.
No momento em que escrevo esta crónica, ainda não se realizou a Diáspora, que irá acontecer neste fim-de-semana, em Belmonte; é o Festival Literário de Belmonte, a realizar nos dias 7, 8 e 9 de novembro, com mais de uma dezena de escritores portugueses. Segundo as palavras do Presidente da Câmara de Belmonte, António Dias Rocha, “Belmonte foi desde sempre uma terra de chegadas e partidas, marcou um sem-número de pessoas espalhadas por todo o mundo. Podemos lembrar Pedro Álvares Cabral, que alargou os horizontes deste povo ao descobrir o Brasil, (…) podemos falar de tanta e tanta gente…e, se foi sempre terra de chegadas e partidas, é também um ponto de visita de todos os que gostam de celebrar a história e a cultura. É com este espírito que decidimos criar o Diáspora – Festival Literário de Belmonte, esperando despertar neste território fértil um manancial de novas ideias, sentimentos, ligações: literatura”.
A Região Beirã está, de facto, numa viragem cultural, depois de participações individuais de escritores, como por exemplo, na Covilhã, com o convite feito a diversos escritores para a sua participação nos interessantes Cafés Literários.

(In "fórum Covilhã", de 11.11.2014)