É uma sexta-feira. Num
acolhedor dia de sol, espero pelo meu neto que vem, da Secundária, das
Palmeiras. Enquanto no carro leio o jornal vou ouvindo à retaguarda, que depois
passa por mim, o barulho do rolar dos tróleis dos jovens e moças estudantes a
caminho da Central de Camionagem.
Num rasgo de memória
retrospetivo, em instantes, o que fora o ensino do meu tempo, dos anos 50 e 60
do século passado – o século XX.
Ainda tenho a felicidade de
algumas vezes poder cumprimentar o meu professor da 4.ª classe – José Eduardo Tendeiro.
E o humor vai-se traduzindo naquele pedido que lhe faço ironicamente: “não diga
que foi meu professor porquanto, com essa sua juventude, ainda irão pensar que
fiz a Primária nos Cursos de Adultos…” Era o tempo de decorar, e saber na ponta
da língua, toda a tabuada; somar muitas parcelas quão saber que numa divisão
existe o dividendo, o divisor, o quociente e o resto. A prova dos noves já era
mais para os merceeiros, como o José Soares Cruto, verificarem se o que
apontavam nos livros de deve e haver estava correto, que, da Primária, exigiam
mais a prova real. E de geometria, o que à mesma tudo dissesse respeito. Com
cuidados especiais na gramática, para evitar pontapés na mesma, como ainda hoje
por aí existe, não só no ensino básico, como no secundário e até no superior,
onde o h é a letra mais inconsistente na sua utilização, com grande dificuldade
em saber aplicar o há, como forma conjugada do verbo haver na 3.ª pessoa do
singular do presente do indicativo; e o à, como contração da preposição a com o
artigo definido feminino a (a + a = à). Depois, os reis e rainhas de Portugal, e
eventos dos seus reinados, assim como os bravos da história, de menor ênfase: Viriato,
Egas Moniz, Martim Moniz, O Lidador, D. Fuas Roupinho, Nuno Gonçalves, Deuladeu
Martins, Brites de Almeida – a Padeira de Aljubarrota, Duarte de Almeida – o
Decepado; os rios e as serras e os sistemas montanhosos; as linhas de caminhos-de-ferro…
Como também as funções do corpo humano. Já as regras de três simples e composta
eram destinadas para o Ciclo Preparatório, terminado o qual, entrando no
chamado 3.º ano dos cursos comerciais, levava-se com um saco de disciplinas, que
podiam chegar às onze, com o iniciar do francês e do inglês. E terminava-se a
saber escrever corretamente várias cartas comerciais nestas línguas, que eu o
diga pois saíram-me num exame teórico para acesso a um Banco.
Nesses tempos, de inexistentes
tecnologias, nem ainda se conhecendo sequer uma simples calculadora, só mais
tarde, já na Câmara Municipal, usava uma obsoleta máquina de somar. Acoplava-se
um extenso rolo de papel e só havia duas ou três na edilidade, pelo que a tínhamos
que pedir emprestada aos colegas da Secção de Contribuições e Impostos, na
altura liderada pelo Hermínio Gonçalves Soares. Também aí trabalhava o Fernando
Pedrosa Gonçalves, bom companheiro de velhas lutas. Serviam para a conferência
das verbas inseridas nos enfadonhos orçamentos municipais, com o velho Manuel
Matias de Figueiredo atento às mesmas, e, quantas vezes, solucionar um lapso
que não podia passar no rigor da Tesouraria a cargo de Miguel de Freitas Pinto
de Paiva. O tesoureiro adorava escrever poesia, e botava a mesma para o jornal
da sua terra, sob o pseudónimo Gim Satova.
Depois, nas unidades
militares, ainda se utilizavam os stencils para elaborarem as Ordens de
Serviço, portadoras do diário, desde as notícias das mobilizações para o
Ultramar, às muitas punições e poucos louvores.
Numa unidade industrial, no
Sabugal, comecei a utilizar, pela primeira vez, as primitivas máquinas de
contabilidade, mais para a faturação.
Depois, ainda que duma forma
envergonhada, foram surgindo as novas máquinas de escrever algo sofisticadas,
aproximando-se dos computadores, e, depois, as impressoras, em que já se
dispensava o papel químico.
Mas as novas tecnologias foram
avançando, começando com o PC-DOS, antigo sistema operacional da IBM, com a sua
primeira versão lançada em agosto de 1981. Com a evolução do hardware e do software a continuidade do PC-DOS acabou por morrer. E surge o
Microsoft Windows.
Hoje os jovens estudantes já
não se conseguem dissociar da televisão ligada enquanto estudam para uma prova
e fones nos ouvidos ao redigir um trabalho escolar. São cenas bem comuns na
atualidade. Nasceram sob o advento da Internet e do boom tecnológico. Para eles estas maravilhas da pós-modernidade não
são estranhas: videogames super modernos, computadores cada vez mais velozes e
grandes avanços tecnológicos, inimagináveis há duas décadas e meia. Esta é a
rotina dos jovens de hoje, para além de andarem com os telemóveis
constantemente nas mãos: em casa, mesmo durante as horas de refeição, quando
vão para a escola, nas ruas enquanto se deslocam, enfim, em todo o lado.
(In "fórum Covilhã", de 08-03-2016)
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