15 de novembro de 2017

FÓRUM DO ASSOCIATIVISMO

Com muito agrado li a notícia no número de 9 de novembro, do Notícias da Covilhã, sobre a pretensão do Município na recolha de contributos para a elaboração de um regulamento, a aprovar em 2018, definindo a atribuição dos seus apoios às agremiações do concelho.
Que efetivamente o fórum do associativismo se realize, e se prepare, com rigor, daí saindo prescrições para quem pretenda levar o associativismo a sério, e não mais a existência de uma associação ou coletividade de fachada, sem ações em proveito dos associados e demais populações covilhanenses interessadas.
É na realidade o concelho da Covilhã que detém o maior número de agentes culturais do distrito, considerando os mesmos inseridos em quase três centenas de associações e coletividades de todo o Concelho.
E a sua longevidade é assaz importante, pois muitas delas, várias já centenárias, tiveram origem no operariado dos lanifícios, outras das agremiações patronais, outras ainda do desejo de também se inserirem na locução latina mens sana in corpore sano, onde o desporto, principalmente na vertente do futebol, teve um manancial de alegrias que levou o nome da Covilhã bem alto para além das suas portas.
Uma palavra de apreço para a proposta do vereador da oposição, Adolfo Mesquita Nunes, que deu origem a esta decisão, e acrescenta para “uma maior eficácia e transparência”, palavra que muitos dirigentes não gostam de ouvir. Penso que já o anterior vereador da oposição, José Pinto, havia também tomado posição nesta desejada conduta.
Em nenhum momento se pode ver o Município a despejar dinheiros pelas várias associações e coletividades, sem ter a certeza, sob comprovativos, ainda que em futuro imediato, de que os mesmos vão servir para causas em prol da sociedade, por que as mesmas associações e coletividades têm o dever de contribuir, nas várias formas por que se geraram; tão-pouco para
cobrir despesas com as suas sedes, sem um real sentido do mesmo ser bem empregue.
Muitas coletividades houve que outrora foram referência na Covilhã, e tiveram iniciativas inéditas, depois continuadas por outras ainda vivas, mas hoje já não existem, não deixando, contudo, de ser memorizadas, e, nalguns casos, celebradas as suas efemérides.
As gentes que nos anos 50 e 60 eram jovens e se envolviam no dirigismo citadino e concelhio, vivendo as agruras da vida e sem os meios de distração de facilitismo como os de hoje, sentiam prazer na reunião em redor dessas associações e coletividades, e trabalhavam com afinco. No tempo presente, em idade de reforma, muitos veem mais o associativismo como um meio de aproveitar muitas das coletividades transformadas em autênticas agências de viagens que, mal acaba uma já está outra no seu seguimento, levando alguns associados a sentirem-se preteridos porque já não foram a tempo de se inscreverem no quase secretismo. Outras, tão só para manter o seu bar aberto.
Hoje, falta aquela vontade indómita para inovar, gerar ideias, retirar das gavetas e dos sótãos o
que pode ser visto, em iniciativas várias, pela sociedade. Poder-me-ão dizer que a Cidade já tem museus, teatro, cafés acolhedores onde também se passam momentos culturais, ranchos folclóricos, vários escritores. Mais uma razão para que as associações ou coletividades se embrenhem na inovação, no acarinhar os associados, no desempenho das missões que lhes cabem.
Reconhece-se que, nos dias que correm, é mais fácil, face às comodidades e facilidade existentes, fruto da modernidade, passar mais tempo com a família, sossegados, que inserir-se no dirigismo associativo; mas tudo depende como se abordam para projetos para o bem-comum, deixando o lugar a outros menos saturados, porque há sempre ideias inovadoras, há sempre a possibilidade de juntar juventude a mais experientes. Não é fácil, mas é possível. Então por que estão cada vez mais a surgir eventos nostálgicos dos tempos de outrora?
Não tem qualquer sentido manter os mesmos dirigentes anos sem fim, sem renovação, muitas vezes com a desculpa da apatia dos restantes associados quando não se contribuiu para os acarinhar, e, nalguns casos, com a formação elitista de grupos no seio dessas associações.
Cada vez se vê mais o surgimento de escritores e alguns poetas nesta Cidade. Importante. Mas, para além da apresentação das suas obras, deixou de se ver um encontro de escritores nacionais, para além dos convidados em “cafés literários”. Na minha secretária tenho uma separata do quinzenário O Olhanense dando grande destaque ao III Encontro Internacional Poesia a Sul, de Olhão 2017 (3 a 12 de novembro). São 55 poetas (portugueses, espanhóis, cubanos, irlandeses, marroquinos, chilenos, turcos, brasileiros, mexicanos, porto-riquenhos, da República Dominicana, venezuelanos, holandeses, australianos, vietnamitas; de médicos a advogados; de professores universitários a pintores e artistas plásticos). O organizador, olhanense Fernando Cabrita, advogado e poeta, tem o apoio da Câmara de Olhão. Um evento verdadeiramente notável, que já vai na sua 3ª edição.
Com o desaparecimento recente do saudoso bispo, D. Manuel Martins, recordo um evento cultural importante quando presidi a uma associação cultural e recreativa da Covilhã, no dia 17 de junho de 1995. Foi então ele, a quem me dirigi, que me indicou um grupo de timorenses que depois vieram à Covilhã atuar e proporcionar uma excelente exposição temática sobre Timor, contribuindo assim para uma tomada de posição a favor da ajuda ao então massacrado povo maubere, antes da independência.  

Uma casa que não apresenta obras, ainda que tenha poucos associados, não merece ter as portas abertas, ao sabor dum apoio que sai do bolso dos munícipes.

(In "Notícias da Covilhã", de 16-11-2017)

14 de novembro de 2017

A FERRUGEM

Umas cervejas no Celso. Acompanham umas moelas ou umas palitadas. E, vai daí, o tempo que passa vai desenferrujando a língua com o José Augusto, e outros de companhia ou de ocasião. Por vezes, o telemóvel vem desassossegar. Ou interromper a conversa da ferrugem que por aí vai grassando: no país, na região, no nosso meio.
Até se fala da oxidação que, imaginados bem-falantes desta terra, vão deixando nas redes sociais; pensando que os seus escritos no Facebook estão providos da “solarine” que limpa as suas palavras ferrugentas, como metais, mas de grossos erros ortográficos, de pontuação, de iliteracia. Como sói dizer-se: de caixão à cova. Mas surgem imponentes no meio social, sem vergonha. Qual quê? Os ensinamentos não foram o suficiente, os cuidados com o oxigénio e a água foram poucas. Resultado: a ferrugem!...
Mas, atenção, é que o trigo está mesmo a ser ameaçado pelas ferrugens de todo o mundo. Em Portugal, esta doença fúngica – ferrugem-negra-do-trigo – não ocorre com frequência, mas a Península Ibérica já sofreu uma epidemia de ferrugem-amarela-do-trigo, que também afeta este cereal. É uma ameaça à produção de alimentos e aos meios de subsistência de pequenos agricultores. Já em 2013 e 2014, Portugal havia sofrido uma epidemia causada por uma outra estirpe de ferrugem-amarela. A FAO já alertou para a necessidade de vigiar os países da Europa e do Norte de África, para se evitarem epidemias das ferrugens do trigo.
Mas, um outro tipo de ferrugem aconteceu, melhor, foi retirada, volvidos cem anos, do soldado João Ferreira de Almeida, condutor do Corpo Expedicionário Português, fuzilado aos 23 anos, em 1917, em teatro de guerra, julgado incorretamente por traição à Pátria. Foi agora reabilitado o último condenado à morte, como militar, pelo Estado português, permitindo a reintegração entre aqueles cuja memória é recordada nas cerimónias da evocação da 1.ª Guerra Mundial, revelou o Conselho de Ministros, em comunicado recente (O Combatente, setembro 2017).
A este respeito, é oportuno recordar que foi há 150 anos que Portugal dava o exemplo que a Europa iria imitar. Em 1867, o rei D. Luís oficializava a abolição da pena de morte, tornando Portugal o primeiro grande Estado europeu a fazê-lo. O último condenado, assim como o padre que o confortava, acabariam por morrer no dia 16 de março de 1842, ou seja, 25 anos antes da abolição da pena de morte, face à “ferrugem” que não largava a sentença da justiça dos europeus em situações consideradas mais graves. Mostrava-se, assim, que este tipo de acontecimento já chocava a população portuguesa e estava abolida na consciência social. Eram uma hora e um quarto daquela data, segundo o Diário de Lisboa, em 1922, quando estava o condenado Matos Lobo, de frente para o rio Tejo com a corda ao pescoço, preparado para a sentença que lhe fora aplicada, quando se dá “um incidente singular”, segundo relatam cronistas da época. “O prior de Marvão procura reconfortar o condenado, mas, subitamente, cai morto. Fulminado por uma apoplexia. Eleva-se um grande clamor na multidão e o corpo do sacerdote é imediatamente retirado na cadeira onde viera o condenado” (Público, de 24/4/2017).
Quem das palavras se desenferruja, e se abrilhanta nos afetos, é o presidente Marcelo, contra o populismo. Que, lá isso da oxidação, não se consegue livrar Sócrates, acusado de mais de 30 crimes. Vejamos nesta que foi a construção de uma rede de influências até às mais altas instâncias do Estado, sem que houvesse qualquer mecanismo de controlo capaz de detetar e eliminar em tempo útil a ferrugem que já se ia acumulando, como a nomeação de gente sem currículo para a administração da CGD. E não havia ninguém no Governo, na própria imprensa, na oposição ou na procuradoria que as conseguisse deslindar.  E, segundo Pacheco Pereira, “o mundo é hoje mais perigoso do que era porque a qualidade dos que mandam baixou significativamente”.
Para algumas gentes além-fronteiras, mesmo as já inexistentes, Portugal ainda não é conhecido, imagine-se! O português mais conhecido no mundo continua a ser um jogador de futebol. Sou testemunha disso, por duas vezes, em Israel, quando nos perguntavam, quer judeus, quer palestinianos, donde éramos, e referíamos o nome de Portugal, encolhiam os ombros. Ao falar no Cristiano Ronaldo, esse era, num ápice, sobejamente conhecido. Sem pensamentos enferrujados!...
E não é que a sonda da NASA, Cassini, depois de recolher dados na órbitra de Saturno e enviado
imagens inesquecíveis dos seus anéis e luas, durante 13 anos, se despediu em definitivo, destruindo-se, em 15 de setembro deste ano, depois de em 15 de outubro de 1997 ter partido da base espacial de Cabo Canaveral, na Florida (EUA) em direção a Saturno. Não oxidou, cumpriu a missão que lhe destinaram.

Não falarei mais de ferrugem, mas agora só de lixo. Portugal já não é “lixo”. Volta aos mercados e paga taxa mais baixa da História a 10 anos, e com o desemprego do terceiro trimestre deste ano a descer para 8,5%. O que é preciso é sair do “lixo” e não continuar sujo. “Que se lixe o lixo”, assim eu me referi numa crónica em 13-07-2011, e, como já o mandámos às malvas, e para o rating que os parta, depois de cinco anos e meio enferrujados (lá voltei eu, desculpem!...), vamos estar atentos e conscientes da missão que nos cabe de podermos passar a ser europeus de primeira, e não sulistas de segunda. Termino, com as palavras de Carlos Pereira da Silva, in Público, de 18 de setembro: “Porque será que a mesma qualidade de povo, quando emigra, se torna miraculosamente produtiva? Lá fora somos bestiais, cá dentro somos bestas!”.

(In "fórum Covilhã", de 14-11-2017)

9 de novembro de 2017

FEIRA DE SÃO MIGUEL – NA COVILHÃ E EM LISBOA

A Feira de S. Miguel realiza-se no Tortosendo-Covilhã, no dia 29 de setembro, desde os tempos ancestrais. Há já alguns anos que a Casa da Covilhã em Lisboa, com o apoio das Câmaras Municipais da Covilhã e da capital, e Junta de Freguesia dos locais do evento (desde há dois anos com a de Alvalade), organiza uma réplica da mesma. Este ano realizou-se no domingo, 29 de outubro, no Mercado de Alvalade.
Para além dos nossos produtos regionais, também o folclore e as tradições são e foram presença em Lisboa, neste evento. Mas a maior, a que trás calor ao nosso âmago, e faz transbordar de alegria os corações dos covilhanenses, é o encontro de amizades nostálgicas, de familiares ou amigos que ali se radicaram, alguns com várias décadas longe das vistas dos que optaram por se manter nas faldas da serra; de semblantes já alterados pelas vicissitudes do tempo, mas de almas reconfortadas, num lenitivo momentâneo da saudade. São as gentes da nossa gente.
Mas outros há, os bons amigos, que se tornaram verdadeiros covilhanenses pelo coração, na Manchester Portuguesa, há muito Cidade Universitária; de passagem efémera ou mais prolongada; que, depois, deixaram à mesma muito do seu labor em várias vertentes na sociedade covilhanense, como nos lanifícios, nos serviços, ou por via do maior embaixador da região – o Sporting Clube da Covilhã (SCC).
É de louvar o entusiasmo, e calor emanado dos dirigentes da Casa da Covilhã, na forma como organizaram os vários serviços, acolhendo os forasteiros e locais, proporcionando assim momentos inolvidáveis passados na capital. Dessa simpatia do acolhimento é responsável o seu Presidente da Direção, Manuel Vaz Rodrigues, e todo o seu séquito de colaboradores.
Desdobrei-me no abraço a alguns que há décadas não via, como os irmãos Mouta, e outros, proporcionado, em parte, pela exposição que o Miguel Saraiva ali levou a efeito, sobre o seu livro “História do SCC”. Foi assim o recordar figuras dos leões da serra, através dos seus familiares, como as filhas do guarda-redes António José, já falecido; ou da simpática quão amável Regina Livramento, filha do Fernando Cabrita e viúva de António Livramento. Dos vivos, os cumprimentos efusivos aos antigos atletas serranos: Germano, Jorge Tavares, Coureles e Palmeiro Antunes. Este último, desde que saiu do SCC nos meados da década de 60, ainda não se tinha encontrado comigo. Num ápice, a minha pergunta: “Recorda-se daquele golo que marcou no Santos Pinto, ao Zé Maria, da Cuf, para a Taça de Portugal, passando-lhe a bola por debaixo das pernas, tendo ele depois vindo cumprimentá-lo?” Recordou-se perfeitamente. Como Palmeiro Antunes veio da CUF para o SCC, era também amigo do Zé Maria. Tem agora 81 anos e aquele encontro para a Taça de Portugal realizou-se na tarde do domingo de 26 de novembro de 1961, ou seja, há quase 56 anos!... O Sporting da Covilhã, então a militar ainda na I Divisão Nacional, foi eliminado pela CUF porque perdeu os dois jogos (na Covilhã, por 2-1; e no Barreiro, por 3-2, jogo este realizado no último dia do ano 1961). Já na época anterior, também ainda na I Divisão, o SCC havia sido afastado da Taça de Portugal, pelo Olhanense, da II Divisão, com os resultados de 1-1, na Covilhã; e 3-1, em Olhão. Ainda não havia a utilização dos cartões amarelo e vermelho, e, muito menos, o vídeo-árbitro…E, o campo, era pelado.
Já perto do final do evento, o entusiasta da organização da Casa da Covilhã, José Rodrigues, dá-me a conhecer a presença do covilhanense Simões David, com quem convivi na Covilhã, então integrando uma instituição de solidariedade social, na década de 60. A partir daí, nunca mais o havia encontrado. Era filho do antigo jogador do Montes Hermínios, Francisco Teixeira David.

São estes momentos de saudade por que vale a pena dar continuidade a este evento da Casa da Covilhã. Animaram o mesmo, grupos de bombos e cantares do Concelho da Covilhã. Estiveram presentes ao ato, e visitaram e pronunciaram algumas palavras, para além do Presidente da Casa da Covilhã, já referido, também o Presidente da Junta de Freguesia de Alvalade, o Presidente da Câmara Municipal da Covilhã e o Vice-Presidente da Câmara Municipal de Lisboa.

(In "fórum Covilhã", de 07-11-2017 e "Notícias da Covilhã", de 09-11-2017)