10 de agosto de 2022

O TEMPO QUE PASSA

 

Terminaram as minhas férias veraneias. De Andaluzia à Serra da Estrela vão consideráveis diferenças. Se dum lado há os encantos do mar, das colinas e dos rios, na vertente de cá existem os cambiantes da montanha, com tudo o que à mesma se liga, da flora à fauna, das maravilhas paisagísticas e de respeitabilidade até aos seus ares saudáveis.

No avanço da minha idade já estou naquela de me enfadar por longas viagens. Mormente quando o “bicho” se faz por convidado. Entrei um pouco mais naquela opção da proximidade de estar no local mais cómodo.

Regressado, vou dar uma volta pelas inúmeras recolhas de informação que avolumei no meu escritório, com a minha secretária num aconchegado ninho de folhas de apontamentos, recortes de jornais, impressões, diversos apontamentos redigidos no resumo de muitos livros lidos. Alguns destes, dispersos, que consultei, e já não necessito. Local arrumado. Resultado: mais um saco cheio de papel a caminho do Banco Alimentar. Um alívio. Mas a falta de memória é que persiste. Até nas coisas mais banais, no imediato, que só surgem com algum esforço após algum tempo. Aquela de codificarem a situação ser devida à PDI já é velha. Vale-me a persistência e o meu gosto pelas buscas, investigação e criatividade.

Fico feliz quando encontro algum documento julgado perdido, ou aquele outro de que já não me recordava. Afinal, o número de amigos é superior ao que imaginava.

Os dias que ainda remanescem para este ano, se Deus quiser, vão ser para mim empolgantes. Penso eu que tal venha a suceder, com a apresentação do meu livro, na Covilhã – DA MONTANHA AO VALE – As Viagens de um Grupo de Tertulianos – já que a primeira edição logo se esgotou quase ainda estava no prelo. Foi então apresentada em Seia e em Lisboa. Os que já se manifestaram interessados, com encomendas para esta segunda edição, limitada a 100 exemplares, poderão agora aproveitar a única oportunidade, no dia 3 de setembro, no Salão Nobre da Câmara Municipal da Covilhã, às 15 horas.

Aguardando a sua entrega, encontra-se também o meu último livro – RECORDAR É VIVER – que foi, paradoxalmente, o primeiro escrito na minha vida, em 1967, aos 21 anos, sem nunca ter sido publicado. Ficou no segredo dos deuses, durante 55 anos, datilografado e por mim encadernado, um único exemplar, altura em que o escrevi quando trabalhava na Câmara Municipal da Covilhã. Muito alterado vão agora surgir 50 exemplares, oficiais, que não serão colocados à venda.

Ainda não conhecíamos o ambiente digital. Conhecíamos, sim, o que era comum neste País de olhos vendados: entre os perigos dos informadores da PIDE, das prisões políticas, dos que procuravam na emigração legal uma forma de dar uma nova vida à sua de emagrecimento. Mas também, em Portugal, os que procuravam passar a fronteira de assalto, como ainda os contrabandistas. Mas aquele perigo maior para os jovens rapazes, depois de terem ido às sortes, era a Guerra do Ultramar. E não se podia escrever como hoje, onde a censura imperava.

Isto é sobejamente conhecido de todos nós e é quase como chover no molhado.

Temos a revolução tecnológica e cultural em velocidade alucinante. No século XXI, o homo sapiens vai converter-se assim, a olhos vistos, em homo digitalis, pois na vida da maioria das pessoas faz parte a utilização de telemóveis, computadores, internet, redes sociais, etc.

Mas neste tempo que passa, não posso esconder que aquele outro “meu tempo” de antigamente me parece, em muitos aspetos, mil vezes mais interessante do que este “meu tempo” de agora, pegando nas palavras de Jorge Morais, diretor do Tal & Qual, de 08-09-2021. E aqui vão alguns exemplos: “nesse tempo em que não passávamos o dia a escrever mensagens inúteis nos smartphones; nesse tempo em que os cantores tinham voz e os escritores Gramática; nesse tempo em que os telejornais davam notícias e os locutores não gaguejavam a lê-las; nesse tempo em que viajar não era navegar na net, as malas não tinham, rodas e os carros elétricos eram transportes coletivos; nesse tempo em que à chuva, ao vento e ao frio chamávamos simplesmente inverno, e não ‘alerta laranja’; nesse tempo em que conversávamos uns com os outros sem precisarmos de zoom; nesse tempo em que mandávamos cartas de amor com pétalas secas entre as páginas. Nesse tempo, talvez não tivéssemos ao nosso alcance tantas maravilhas da técnica, talvez não estivéssemos aconchegados em tantos códigos, politicamente corretos e talvez não pudéssemos andar à pesca do Nada em tantas ‘redes sociais´. Mas éramos, parece-me, muito mais autênticos”.

 

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmal.com

(In “Jornal Fórum Covilhã”, de 10-08-2022)

 

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