Os incêndios florestais não são um fenómeno
novo das últimas décadas em Portugal. A partir de 1970, segundo o ensaio de
António Bento-Gonçalves, “com a profunda transformação verificada no país,
dá-se um aumento da frequência, da dimensão, da intensidade e da capacidade
destruidora dos incêndios, o que veio a culminar nas tragédias de 2017, que
feriram 320 pessoas e ceifaram a vida, em apenas dois dias (17 de junho e 15 de
outubro) a 116 pessoas”.
Os incêndios são alimentados, na minha
opinião, pela ferocidade dos tempos que correm, com as alterações climáticas em
que todos somos responsáveis por assobiarmos para o lado. Sim, quando se fala
na ação que urge tomar sobre as condutas para resolver este grave problema, existe
aquela apatia do deixa andar, outros resolverão por mim, não sou só eu a atuar,
o que redunda nas nefastas situações que todos os anos vivemos, no verão (isto
quanto a incêndios), em todo o planeta.
Mas também são os descuidos voluntários ou
involuntários de todos os que passam e provocam a combustão.
Dentre muitos outros fatores, como as
plantações de árvores e reflorestação indevidas, falta de limpeza dos terrenos
envolventes, deixo para último os piromaníacos que uma legislação judicial, deste
país à beira-mar plantado, o mantém nos brandos costumes.
Se o que rouba uma galinha para dar de comer
aos filhos é punido com facilidade, porque é que não se exerce uma rigorosa
aplicação das penas aos pirómanos, seus sequazes ou mandantes? Sem apelo nem
agravo, para que sirva, na exemplaridade da ação judicial, que outros não
venham a ser encorajados a repetir o crime abafado.
As observações ao que se passa em nosso
redor, e as denúncias, devem ser acolhidas com muita atenção pelos responsáveis
a quem nos dirigimos.
Corri grande parte do país, na minha vida
profissional de então, e desloquei-me na tranquilidade de muitas noites, no
regresso para casa, com a mulher com os meus filhos pequenos a aguardar ansiosa
que eu chegasse bem, sem ainda se conhecerem os telemóveis e quando sentíamos o
lenitivo de encontrar um posto telefónico para telefonar para casa (geralmente
instalado num café ou outra casa comercial) ou então a simpatia de um cliente
que nem aceitava o custo da chamada, muitas vezes interurbana, aguardando que
do lado de lá autorizassem a chamada telefónica.
Algumas vezes perguntei aos guardas-florestais,
em Figueira de Castelo Rodrigo, por que é que me pediam os documentos do carro
se a missão deles era sobre as florestas e a caça.
Duma outra vez, uma indignação pela
indiferença que observei na GNR de Belmonte, sobre uma denúncia de um possível
fogo posto que nascia perto da estrada da Vela ou Gonçalo, com um Mercedes Benz
de luz apagadas junto ao mesmo. Resposta daqueles militares de Belmonte, lá
para os anos 1975 ou próximos: Se era um Mercedes não deveria ser o dono do
carro a pegar o fogo... Nós vamos lá ver. Mas como à meia-noite já vinham da
cama, certamente para ela regressaram.
Hoje as autoridades policiais estão mais
evoluídas, com outro grau de instrução, e dão-nos mais confiança.
Só que o País não parece ter aprendido muito
com os incêndios de ano para ano. Os nossos Bombeiros sempre num esforço
hercúleo e a Proteção Civil procurando o melhor. Mas, como agora sucedeu com o
incêndio na Serra da Estrela, parece ter havido inicialmente uma
descoordenação, com muitos a mandar e as populações espavoridas sem apoios imediatos,
retardando a intervenção dos soldados da paz, o que, compreensivelmente, nem
sempre é possível.
Mas onde é que está o busílis da questão?
Como cortar este nó górdio?
Por que não colocar os militares que exercem
o serviço militar não obrigatório a fazerem o serviço de vigias? Com armas como
no tempo da Guerra do Ultramar, que, esses de então hoje sofrem de stress
pós-traumático, mas agora não existe esse perigo, antes pelo contrário, seria
um ato patriótico, caçar esses terroristas incendiários, com o tratamento
devido.
Depois da década de 70 do século passado,
muitos fogos surgiram no País e nesta região da Beira Baixa e Serra da Estrela.
Num deles, em agosto de 1990, faleceu um meu antigo Colega da Instrução Primária,
João José Manteigueiro Mota. Seis anos mais tarde, também em agosto, faleciam
três bombeiros covilhanenses na queda de um helicóptero que combatiam um
incêndio na Serra da Estrela: Ricardo Bruno Jesus Cardona, António Miguel Vaz Marques
e Fernando Manuel Sousa Xistra. Mais tarde, em agosto de 2013 falecia, apanhado
pelas chamas, o bombeiro, da Corporação da Covilhã, Pedro Miguel de Jesus
Rodrigues.
Outrora, antes da década atrás referida,
pouco se ouvia falar de incêndios florestais, e a História dos Bombeiros
Voluntários da Covilhã, no seu I volume, regista muitos incêndios em habitações
e fábricas de lanifícios, sobrando os florestais após os anos 70 do século XX,
conforme já referido.
“Ao longo dos anos, muitas foram as vítimas
mortais dos incêndios florestais em Portugal. Sem sermos exaustivos (não foram
aqui contabilizados os bombeiros falecidos em acidentes rodoviários, a caminho
ou no regresso de incêndios florestais) contabilizam-se 257 vítimas mortais
entre 1961 e 2018, sendo que 65 eram bombeiros, 7 especialistas estrangeiros,
25 militares, 4 funcionários florestais e 156 populares, verificando-se que nos
38 anos do século XX faleceram 64 pessoas, enquanto que apenas em 19 anos, no
século XXI, já perderam a vida 189 pessoas, sendo o ano de 2017 responsável por
61% do total das vítimas mortais no presente século.”
João de Jesus Nunes
(In “Jornal Fórum Covilhã”, de 07-09-2022)
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