8 de novembro de 2023

A INVASÃO DOS BÁRBAROS

 

Autêntica barbárie a ocorrida no do dia 7 de outubro, inesperadamente, em território israelita, próximo da fronteira da Faixa de Gaza. Estava-se na manhã de sábado. Um ataque sem precedentes por ar, mar e terra foi lançado pelo grupo palestiniano Hamas que combinou a infiltração de terroristas armados, que passaram a massacrar civis.

Israel, apanhado de surpresa, e o Hamas a utilizar o lançamento de foguetes e a tomada de dezenas de reféns. No início da noite, já Israel contabilizava centenas de mortos e mais de 2.000 feridos.

Aconteceu então durante a festividade judaica de Simchat Torah, situação que ocorreria 50 anos e um dia depois da Guerra do Yom Kippur, considerada o último grande episódio que ameaçou a existência de Israel.  Na ocasião forças egípcias e sírias lançaram uma ofensiva durante o feriado judaico do Yom Kippur, num esforço para recuperarem território que Israel havia tomado durante a Guerra dos Seis Dias, travada em 1967.

Este ataque marca a mais ambicionada ofensiva já lançada por um grupo palestiniano. Nem mesmo a Segunda Intifada, no início dos anos 2000, que deixou mais de um milhar de israelitas mortos em quatro anos, foi palco deste tipo de incursão em massa no território israelita.

O líder do braço militar do Hamas disse que a ofensiva foi uma resposta ao bloqueio de 16 anos a Gaza, aos ataques israelitas nas cidades da Cisjordânia no ano passado, e, entre outros, ao aumento dos ataques de colonos israelitas aos palestinianos e à expansão dos assentamentos israelitas em território palestino.

Os serviços de inteligência de Israel falharam todos: Mossad, que recolhe informações e realiza operações no estrangeiro; a Agência de Segurança de Israel, que controla a segurança interna e nos territórios ocupados; o Aman, responsável pela inteligência militar. Não é normal tanto falhanço e até foram avisados pelo Egipto que o Hamas estava a preparar uma ação em grande escala. Netanyahu considerou que o aviso era uma fake news. Enfim.

Agora Israel está prisioneiro de um dilema. Segundo Jorge Almeida Fernandes, in Público, “após o selvático massacre de 7 de outubro, a opinião pública israelita exprime duas exigências: garantir a libertação dos reféns, a qualquer preço; destruir o Hamas de uma vez por todas”. Mas numa análise dum jornalista do diário Haaretz refere que “O governo israelita deve dizer aos cidadãos, e especialmente aos reféns e suas famílias, a insuportável verdade; não podemos realizar os dois objetivos, libertá-los e destruir o Hamas.”

“O resgate dos reféns é a máxima prioridade”, diz Ayraham Sela, professor de Relações Internacionais na Universidade Hebraica de Jerusalém. “Israel tem uma obrigação para com eles. Já não basta deixar que tenham sido capturados?”.

Michael Milshtein, diretor do Fórum de Estudos Palestinianos na Universidade de Telaviv diz que personalidades do Hamas “são ideólogos que acreditam na jihad e o declaram abertamente. O seu autêntico objetivo a longo prazo é destruir Israel. Eles planearam este ataque desde 2014. Têm um culto pela morte e pelo martírio. Não é por acaso que usam o termo ‘judeus’ e não ‘sionistas’. O Hamas recusou sempre a solução ‘dois estados’.”

Na prática, o 7 de outubro suscitou comparações com a Al-Queda e o Estado Islâmico.

Já Fernanda Câncio, na sua coluna habitual do DN refere que “Israel está então a fazer tudo de acordo com o plano do Hamas, e é impossível que até Netanyahu, o irresponsável, o sem-vergonha, o sangrento, não o saiba. É impossível que o homem que desguarneceu de tropas a zona sul do país, junto a Gaza e ao seu governo de terroristas, para garantir a segurança dos colonatos ilegais, ocupados pelos seus apoiantes de extrema-direita, na Cisjordânia – a ponto de não só permitir um ataque como o de 7 de outubro, mas também de não haver, durante horas, socorro para as comunidades martirizadas –, não saiba que está a fazer tudo segundo a cartilha dos atacantes”.

Mas vejamos o Hamas e Israel à luz da lei internacional. Segundo Patrícia Akester, in DN, “Tanto Israel como a Palestina são signatários das quatro Convenções de Genebra de 1949. Nestas Convenções e nos seus Protocolos Adicionais reside o cerne do Direito Internacional Humanitário, pelo que tanto Israel como a Palestina estão obrigados a cumprir os ditames básicos de um ramo de Direito que visa, no âmbito dos conflitos armados, limitar as barbáries da guerra. Quanto ao Hamas, desde 2007 que governa de facto a Faixa de Gaza e por lá comanda um Exército, encontrando-se indissoluvelmente ligado ao Estado da Palestina e tendo, por extensão, de cumprir as Convenções de Genebra. Além disso, sendo a Palestina signatária do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional (TPI), a conduta do Hamas cai sob a égide da jurisdição do TPI, que tem competência para julgar certos crimes que ‘chocam profundamente a consciência da Humanidade´”.

António Guterres, secretário-geral da ONU, condenou os “atos de terror” e “sem precedentes” de 7 de outubro perpetrados pelo Hamas em Israel nas frisou que “esses ataques terríveis não podem justificar a punição coletiva do povo palestiniano”. O discurso não foi bem recebido por Israel.

“Os ataques do Hamas não acontecem do nada. O povo da Palestina tem sido sujeito a anos de ocupação (...). Mas as reivindicações do povo palestiniano não podem justificar os ataques terríveis do Hamas. E esses ataques não podem justificar a punição coletiva do povo palestiniano”.

É um tema extraordinariamente sensível, de paixões desabridas, na opinião de José António de Sousa, “em que é preciso saber andar descalço sobre cacos de vidro. António Guterres sempre foi cuidadoso e moderado, e como máximo responsável das Nações Unidas tem de saber unir, não tomar partido. O Hamas é um grupo terrorista que tem de ser erradicado, a população árabe na Palestina não é o Hamas, tem de ser protegida, não pode ser um ‘dano colateral’ no processo de erradicação do Hamas. Israel está na posição difícil de ter de lutar contra um inimigo que utiliza populações civis, crianças, etc. como escudos humanos. É uma luta que Israel tem que lutar com inteligência, e não força bruta, para que o Hamas não ganhe a opinião pública mundial. Acredito que fosse isso que António Guterres quis dizer, e com o qual eu concordo.”. Eu também concordo.

 

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

 

(In “Jornal Fórum Covilhã”, de 08-11-2023)


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