Em posições nada condizentes
com a valia que tanto o Sporting Clube Olhanense (SCO) e o clube da minha
Terra, Sporting Clube da Covilhã (SCC), respetivamente 4ª e 8ª filiais do meu
clube de sempre – Sporting Clube de Portugal (SCP), representam como históricos
do futebol português, fica aqui mais um apontamento de momentos que agitaram desportivamente
gentes deste país.
Naquele mês de janeiro de
1962, no Estádio José dos Santos Pinto, na Covilhã, confronto entre as duas
equipas para uma jornada do Campeonato Nacional da Primeira Divisão, onde a
turma algarvia havia então regressado ao seio dos maiores, depois de ter
vencido o Campeonato Nacional de 2ª. Divisão – Zona Sul, deixando atrás de si
equipas como o Farense, Vitória de Setúbal e Oriental.
Estávamos na 2ª volta da época
1961/62 e o SCO tornava-se forasteiro do SCC. Já havia vencido os serranos, no
seu reduto, na 1ª volta, numa vitória arrancada a ferros, por uma bola a zero,
golo de Armando. O guarda-redes era o Filhó (ex-Farense).
Pontificavam nesta época, na
1ª Divisão, equipas como a C.U.F., Atlético, Leixões, Académica, Beira-Mar,
Lusitano de Évora e Salgueiros, num total de 14 clubes. Uma vitória contava 2
pontos e não três, como hoje. Não podia haver substituições, a não ser do
guarda-redes, por lesão. Entre outras modificações que posteriormente se vieram
a verificar como a aplicação dos cartões amarelos e vermelhos. A expulsão dum
atleta era por gestos do árbitro, indicando o caminho dos balneários. Isso não
quer dizer que não deixava de haver castigos, segundo o que o árbitro
registasse no seu relatório.
Neste encontro, o SCC
encontrava-se a atravessar um período de castigos aplicados a jogadores, pelo
que andou três jogos a jogar desfalcado de algumas peças importantes do puzzle
serrano.
Reporto-me ao caso do jogo
Leixões – Sp. Covilhã, em janeiro de 1962, que abalou a equipa leonina, os seus
dirigentes, a cidade e até o país, como um caso inédito então vivido. O
encontro, realizado em Matosinhos, tinha o Beira-Mar também a lutar pela
manutenção na divisão maior, tal como o clube serrano. O jogo foi arbitrado
pelo aveirense Porfírio da Silva. Os Leões da Serra empenharam-se, entretanto
para não perder o jogo, e até estavam a ganhar por 1-0. O árbitro prolongou o
desafio mais sete minutos, duma forma tão flagrante que enervou os atletas
covilhanenses, porquanto nesse prolongamento excessivo surgiu o golo da vitória
do Leixões, quando o resultado se encontrava 1-1, num golo irregular por ter
sido obtido em posição de fora de jogo, como igualmente foi forjado o primeiro
golo do Leixões.
Da reação dos Leões da Serra,
surgiram pesados castigos para os jogadores do Sp. Covilhã: Rita, Couceiro,
Lanzinha, Chacho e Palmeiro Antunes, com três jogos de suspensão. Repreensão a
Adventino e 30 dias de suspensão ao treinador Mariano Amaro, com 250$00 de
multa A reação dos dirigentes leoninos e da própria população da Covilhã foi
tão forte que a Federação Portuguesa de Futebol – caso inédito para a época! –
levantou alguns castigos aos atletas covilhanenses, como ilibar o capitão
Lanzinha de qualquer culpa e o castigo de Chacho foi reduzido de três para um
jogo.
”O vasto salão de conferências
da sede encheu-se muito antes da hora anunciada e nas ruas de acesso também se
comprimiu multidão, compacta, indiferente à chuva e ao frio, olhos e coração
postos no terrível dilema criado no seu Clube: manter-se, ou não, na prova
máxima com a equipa ‘Reserva’, ou melhor, com os únicos 12 elementos que o Sr.
Porfírio deixou fora da alçada da Federação (...)” E, daqui o grito do Ipiranga
dos covilhanenses. Registaram-se ecos da imprensa local e nacional (n’“A Bola”,
por exemplo) naqueles dias de janeiro de 1962.
“Perante a gravidade da
extensão dos castigos impostos e ainda o reflexo do próprio futuro da equipa no
Campeonato, a Direção, visivelmente contristada pelo facto da FPF não ter
sequer ligado qualquer espécie de importância à exposição acerca das
revoltantes arbitrariedades cometidas pelo direto causador de quaisquer
excessos, porventura cometidos no supracitado jogo em relação ao aspeto
disciplinar, iniciou desde logo uma longa e trabalhosa série de diligências
oficiais e extraoficiais que o caso aconselhava”. Todo o desenvolvimento deste
caso encontra-se descrito no meu livro “Sporting
Clube da Covilhã” – Passado e Presente” – Bodas de Diamante – 1998.
Foi neste contexto que o SCC
recebeu o SCO, na segunda volta, em que os castigados não puderam jogar,
apresentando-se assim as duas equipas:
Sporting da Covilhã – Alves
Pereira; Patiño, Cavém e Lourenço; Lanzinha e Carlos Alberto; Manteigueiro,
Adriano, Adventino, Chacho e Amilcar. Olhanense – António Paulo; Rui,
Luciano e Nunes; Madeira e Reina; Matias, Campos, Cardoso, Mateus e Armando.
Árbitro – Dr. Décio de
Freitas, de Lisboa.
Segundo o primeiro volume do
livro “Sporting Clube Olhanense – 90 anos de História – 1912 – 1962”, de
Raminhos Bispo, “O intervalo chegou com o marcador em branco. Quer algarvios,
quer os serranos, proporcionaram, nos primeiros 45 minutos, um magnifico
espetáculo, a decorrer numa tarde amena, sem vento nem frio, sem calor, nem
chuva, antes uma temperatura ideal e convidativa para a prática do futebol.
Colocados em vantagem
numérica, lesão de Lanzinha, os donos do campo tinham de se desdobrar já que
para a muralha defensiva de tanta eficiência apenas dispunham de quatro pedras.
Logo nos primeiros minutos, o
Sporting da Covilhã altera o marcador, com dois golos de rajada. Uma jogada do
espanhol Chacho, oferece de bandeja ao seu colega Adriano, que inaugura o
marcador. Três minutos depois, Reina, ao cortar um centro contrário, faz o
esférico entrar na própria baliza”.
Estive presente nesse
encontro. Tinha então 16 anos. No final, esperávamos o regresso dos atletas
para os seus autocarros, entre sorrisos e palavras simpáticas, os votos de boa
viagem.
Foi a partir daqui, naquela esperança
de ver o meu clube a manter-se na Primeira Divisão, com os jogadores não
habituais a darem tudo por tudo para substituírem os seus colegas punidos, e,
no final, a referida simpatia dos forasteiros, que me levou a uma afeição pelo
Olhanense, que, tal como outros, já acompanhava pela leitura dos jornais, na
antiga Biblioteca Municipal, ao jardim. Mas, principalmente, pelos jogadores
que vieram do Algarve, nomeadamente de Olhão, para o clube da minha Terra.
No final desta época 1961/62
dava-se o regresso do Olhanense à Primeira Divisão e a saída do Sporting da
Covilhã, que só regressaria ao seio dos maiores volvidos 23 anos.
Espero um novo ciclo de reanimação para as
duas Coletividades Históricas, tendente ao seu regresso ao seio dos maiores do futebol
português.
João de Jesus Nunes
jjnunes6200@gmail.com
(In “O Olhanense”, de 01-11-2023)
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