Existe um extenso rol de
expressões que, quase sem darmos conta, usamos com frequência. Na sua
generalidade são de longa data. Ainda hoje existe alguma publicidade que não perdeu
a sua oportunidade. E ainda é atraente. Outras já não passam de memórias do que
já desapareceu.
Para muitos ficou-nos entranhada. Torna-se agradável
a sua recordação.
Lá vai o tempo, para os mais
velhos, nos anos 60, 70 e 80, em que a RTP (inicialmente não havia outros
canais) tinha uma publicidade que procurava resistir aos ventos da
concorrência.
Recordo estas: “Pois, Pois, J.
Pimenta, Lda”; “Tody, todo o mundo vai tomar”; “Palavras para quê? Trata-se de
um artista português e usa Pasta Medicinal Couto”. Tal como a Desgarrada do Fado do Peixe
Congelado, da recém-nascida SAPP – Serviço de Abastecimento de Peixe ao
País, anos 60. Não só na televisão como na rádio, a publicidade aos detergentes
TIDE (responsável pelo “branco
mais branco não há”) e ao OMO, este com a saída de “OMO lava mais
branco”; ou, já nos anos 80, a dona de casa nas memórias da infância com os
“Glutões do Presto”. Quem foi criança nesta altura provavelmente terá
acreditado que existiam mesmo uns bonequinhos verdes que saiam da embalagem do
detergente para dar conta das nódoas mais difíceis. “Acreditar nos glutões”
passou a ser sinónimo da ingenuidade de acreditar em coisas pouco razoáveis. Sem
ter em atenção datas, recordo-me de, nos produtos, como as farinhas: “Depois
de uma maleita, Farinha Amparo o endireita”.
Já o sabão Sonasol teve
momentos interessantes, pois no meu tempo de estudante, na Escola Industrial,
enquanto nos agrupávamos à porta da sala de aula aguardando a vinda do
professor(a), um divertido colega, o falecido João José Silva Coelho, servia de
maestro ao coro gritante que incutíamos naquela publicidade que dava nos anos
60, ao Sonasol, entre outras: “A Maria... não conseguia... da roupa o
encardido tirar..., mas a Maria agora já sabia que havia o sabão Sonasol !!!” Era
uma risada entre todos e os colegas de outras turmas, ao longo dos corredores,
ouvirem cantar-nos com estas brincadeiras; e até os professores entravam na
sala em risos, nessa altura já nós todos caladinhos... Alegria estudantil. Outros
tempos... Entretanto, a marca deste detergente daria um anúncio em 1997 que
terminava “O algodão não engana”. É que há anúncios que entram na
memória coletiva e passam a fazer parte da cultura popular. O zeloso mordomo
descobre toda a sujidade invisível a olho nu, através do infalível teste do
algodão. A expressão é usada sobretudo quando queremos desmascarar aquilo que,
à primeira vista, parecia muito limpinho.
Mas também as campanhas
institucionais nos fizeram fixar um anúncio surgido em 1986 e que continuamos a
repetir: “Se conduzir, não beba”.
E, das várias pesquisas, como as
de Tiago Taveira, in Lifestyle/Nostalgia, do Observador, também nos
podemos voltar para anúncios encomendados a pessoas da cultura, como os poetas.
E aí temos a expressão “Há mar e mar, há ir e voltar”. Devemos esta
frase a Alexandre O’Neill, elevada a provérbio, criada para uma campanha do
Instituto de Socorros a Náufragos para prevenir os afogamentos nas praias
portuguesas.
Já o anúncio que marcaria a
entrada da Coca-Cola em Portugal foi encomendado à agência Hora, onde
trabalhava Fernando Pessoa, nos finais dos anos 20. O poeta foi responsável
pelo slogan “Primeiro estranha-se, depois entranha-se”, mas a campanha
não saiu do papel e a bebida foi proibida por intervenção do médico Dr. Ricardo Jorge, diretor da Saúde de Lisboa.
Havia um duplo motivo: se o produto continha coca, da qual se extraía a
cocaína, não podia ser vendido ao público; se não tinha coca, então anunciá-lo
com esse nome seria publicidade enganosa. A marca só começou a ser vendida em
Portugal em 1977, mas a frase ficou para a história.
“Aquela máquina”. Podemos
até já nem nos lembrar do que fazia o “Homem da Regisconta” mas certamente que
nos repercute na memória a voz forte de Fernando Girão a cantar “Aquela
máquina!”, num anúncio repetido entre 1974 e meados dos anos 80. E todos
nós, seja em que tarefa for, gostamos de ser “aquela máquina”.
E, socorrendo-me ainda de Tiago
Tavares, vem a propósito “O que é Nacional é bom”. Muito antes de
Scolari nos encher as janelas e os carros de bandeiras portuguesas, já a
secular marca de massas, farinhas, cereais e bolachas apelava ao nosso
patriotismo. No léxico comum, o slogan extravasou o âmbito da marca nascida em 1849
e serve hoje para exaltar a qualidade de todo o tipo de produtos portugueses.
“Vá para fora cá dentro” –
O slogan lançado pelo então Ministério do Comércio e
Turismo em 1995, numa campanha que desafiava os portugueses a passear pelo seu
país, tornou-se tão natural.
“Falta-te um bocadinho assim” – Esta é uma expressão com gesto
incorporado. Quando estamos quase a conseguir atingir um objetivo, mas ainda
falta o quase, há sempre alguém que aproxima o indicador do polegar...
- Há uma linha que separa...” – Esta expressão é mais recente, embora a marca de telecomunicações já
tenha entretanto mudado de nome. Andou na boca de todos no início da década de
2000 e até então o líder do PS, António José Seguro, comentava o slogan: “Há uma linha que separa a austeridade da imoralidade”, disse em 2012,
em relação à proposta do Governo para descer a TSU.
- “Poder, podia, mas não era a mesma coisa” – Poucos anos antes, aquando da introdução da fibra na sua oferta de
serviços, a Zon teve uma campanha com figuras públicas, cujo mote foi
repetido vezes sem conta, substituindo o nome da marca por aquilo que se
quisesse, como por exemplo: “Podia viver sem o Lifestyle do Observador? Poder,
podia, mas não era a mesma coisa.”
Muitas, mas muitas mais
expressões existem, como as do Gato Fedorento, inspirada num desabafo de um
concorrente do Big Brother. Foi usada imensas vezes. Quase sempre para acusarem
outros de falarem e não fazerem nada. Ricardo Araújo Pereira naquela expressão
de “Eles falam, falam, falam e não dizem nada” fazia uma caricatura dos
que desprezam a palavra.
Por último, deixo a publicidade
já com muitos aninhos, que adoro, recordando-me dos muitos Natais: – “Apetecia-me
tomar algo”. O pedido feito pela madame ao motorista Ambrósio entrou
para a história da publicidade orelhuda em 1995, prestando-se a algumas
conotações menos ortodoxas no imaginário popular das relações patroa-motorista.
João de Jesus Nunes
(In “O Olhanense”, de 15-02-2023)
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