Agosto quente não deu oportunidade a uma fluidez mental para uma crónica menos esforçada.
Numa breve semana de férias, estivemos no norte com o amigo Fernando Pedrosa que serviu para colocar em dia o desenferrujar da língua sobre os tempos passados na Covilhã, que não deixa de recordar. Os dois casais mostraram o rol de emoções duma amizade antiga.
A gripe A continua a ganhar terreno e não vemos grandes preocupações da população, numa passividade a que já nos vamos habituando. Se há cinquenta e dois anos a gripe asiática também nos veio bater à porta (fui um dos atingidos), deveria, previamente, não se consentir, à velocidade com que esta epidemia se desenrola, a tolerância incutida por muitos indiferentes à situação.
O mundo avança vertiginosamente nos meios tecnológicos. Já não toleramos o que chegou a ser inovação nos nossos tempos – os mais de sessenta anos. Vejamos, por exemplo, as páginas das listas telefónicas, onde cabia um país inteiro, substituídas pela Internet e telemóveis; cassetes VHS que revolucionaram o cinema em casa, substituída pela Internet e os downloads; a televisão, quando nem havia comando, surgida em Portugal no ano da gripe asiática, substituída por plasmas e LCD, com imagens de alta definição; a luta entre o papel e o digital, com a crescente digitalização do mundo, alguns suportes mais antigos a serem ameaçados de morte. Não raras vezes o livro e o jornal são dados como mortos; a máquina de escrever, dactilografando ao som das teclas, que chegou a ser a imagem emblemática de alguns escritores, a ser substituída pelo computador; o telefone, sem fio era impossível falar e as cabines telefónicas já quase desapareceram, por oposição à crescente massificação dos telemóveis; bilhete de avião, sem papel não se voava, foi substituído pelo electrónico; tanque da roupa, até se convivia na hora de lavar a roupa à mão. Acabaram os lavadouros públicos. Surgiu a máquina de lavar roupa; disquete, trouxe o primeiro vírus, substituída pelas pens, CD e DVD. Um registo inserido no Diário de Notícias.
E a modernidade, pula e avança. Já não é estranho falar de twitter, facebook, you tube, google, GPS, wikipédia, e-mail; ipphone, playstation.
Nesta silly season, à beira de eleições, continua a ser um país au ralanti. Promessas, muitas promessas. Como nas palavras de Batista Bastos, é preciso haver memória contra o esquecimento.
Conforme refere Francisco Sarsfield Cabral, depois da crise global está a nossa crise. “Começou a recuperação económica mas a recessão deixará profundas cicatrizes”. “Tudo indica que a recuperação económica mundial será difícil, lenta e irregular, e o crédito fácil não voltará tão cedo”. “A nossa crise, que nos tolhe o crescimento económico, nos endivida perante o estrangeiro e nos empobrece, tem pelo menos uma década”. “O fim da crise global, a concretizar-se, não resolver os nossos problemas estruturais”.
Quem não tolerou o record mundial, no atletismo, foi o jamaicano Usain Bolt, cujo feito ficará para a eternidade, ao atingir o patamar do inimitável nos campeonatos mundiais de atletismo.
Não aspiramos a ser assim tão bons. Depois de três décadas após o 25 de Abril, as esperanças de todos vivermos bem estão longe de serem atingidas.
Enquanto houver diferenças abissais nos desideratos de cada um de nós, independentemente do esforço individual ou colectivo, não vamos a lado nenhum.
E a vontade implícita de cada português, no seu trabalho, vai sendo esbatida pelos exemplos que vêm dos próprios governantes, independentemente das cores partidárias.
São sobejamente conhecidos os casos de corrupção, e cada vez mais nos surpreendem, pelo menos aos honestos.
Efectivamente, o País sofre, o País tem os bolsos rotos, mas há muita gentinha com bolsinhas de prata e carteiras de excelente couro para guardar os muitos cartões bancários.
Por cá também vamos ter eleições. Não vamos discuti-las, tanto mais que, pelo trabalho feito, Carlos Pinto já ganhou as eleições. Nem precisa de cartazes.
A cidade pinga de obras a inaugurar.
Mas também há tolerâncias intoleráveis. Vejamos os almoços a um euro que o Município despende, há vários meses, com os portadores do cartão social do idoso. Acreditamos que não estaria no espírito da edilidade a sua extensão global, independentemente do rendimento de cada um, mas tão só aos mais necessitados, e, se foi essa a intenção, vai o nosso apreço. Mas sabemos que não é assim, e, pior que isso, é ver todos os dias, antes das dez horas, um grupo de utilizadores, sentados no muro em frente à ADC, não retirando pé, para serem os primeiros a ser servidos.
Isto extravasa a tolerância e, de intolerância, chega antes à ganância.
(In Notícias da Covilhã de 03/09/2009)
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