Portugal indubitavelmente a acrescentar aos anais da sua
História mais umas páginas de quarenta anos, na génese de um sonho lindo.
Paradoxalmente traído, tantas vezes, na adequação de “mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”.
Atentemos a mais de oito séculos da sua existência. Várias
vezes emergiram perigos, ameaças e atos consumados na sua história bonita,
convertida de vez em quando nas lágrimas e no sofrimento “duma austera, apagada e vil tristeza”, conforme o nosso Camões.
“A montanha pariu um
rato”, quantas vezes, e, mesmo assim, não tem servido de exemplo a muitas
cabecinhas pensadoras. Não se destruindo a si mesmos, como nobres de outrora,
conseguiram colocar grande fatia da classe média em paralelo com os nossos
irmãos da “arraia-miúda” ou “ventres ao sol”, da invenção de Fernão
Lopes.
Neste sul da Europa, onde nos integramos, uma fisionomia
invernosa; em contraste, o semblante primaveril dos países da vertente norte. Já
poderíamos ter respirado dum certo desafogo. As enormes contrariedades por que
estamos a passar não existiriam se, ao longo da nossa história, muitos dos
principais governantes não se situassem no verso camoniano de “Um fraco rei faz fraca a forte gente”.
Dentre as necessidades prementes de hoje, a justiça
portuguesa. Não funciona de forma a resolver os problemas que viraram o país ao
avesso. Usos e abusos chegam ao caricato das prescrições. Atos que pedem severa
punição. Recorde-se, há mais de 900 anos, o conselho do Conde D. Henrique, no
seu leito de morte, a seu filho, ainda de tenra idade. Para o primeiro monarca
de Portugal, D. Afonso Henriques: “Se um
dia deixares de fazer justiça um palmo, logo ao outro dia se afastará de ti uma
braça”.
E “a nós pertence
fazer mercê aos indefesos e protege-los contra os poderosos”, é a decisão
das Cortes de Coimbra, convocadas por D. Afonso II. Que fique na mente dos
governantes deste País, e não daqueles que se arregimentam com a “governação”
deste pedaço europeu, que, na expressão de Eça de Queiroz, em O Conde de Abranhos, “O governo não há-de cair – porque não é um edifício. Tem que sair com
benzina – porque é uma nódoa”.
Saímos do “orgulhosamente
sós” e da “evolução na continuidade”.
Caso contrário, onde estaríamos? António de Spínola e Costa Gomes enganaram-se
nas afirmações de que “Haveremos de
continuar em África. Sim!” e “Venceremos”,
no ano de 1974. Mais acertada foi a expressão do jornalista Eugénio Alves, durante
a censura, relatando um jogo de futebol a pensar no Golpe das Caldas, que
precedeu o 25 de abril: “Perdeu-se uma
batalha mas não se perdeu a guerra”.
Após a reunião de
vassalagem a Marcelo Caetano dos últimos generais leais ao regime ditatorial – “A brigada do Reumático” – já Manuel Alegre
no “Pergunto ao vento que passa, notícias
do meu país, o vento cala a desgraça, o vento nada me diz”, pôde haurir na
sua poesia ao grande dia da libertação – 25 de abril daquele inesquecível ano
de 1974.
D’”O estado a que isto
chegou”, do saudoso Salgueiro Maia, veio a esperança. O seu indómito
entusiasmo levou de vencida todos os escaravelhos que minavam este Portugal. E uma
história louca não se concretizou, no Terreiro do Paço. Os disparos das forças do
regime, ali, frente a frente, se quedaram.
Nestas últimas quatro décadas muita coisa se passou. A
disputa do poder – “Olhe que não, doutor,
olhe que não”; “O povo é sereno. É só fumaça!”; em 1975. Uma década depois,
“Só fui fazer a rodagem”(1985) e “Nunca
me engano e raramente tenho dúvidas” (1990).
Tempos desarticulados da governação. Muitas estórias pelo
caminho de toda esta História de Portugal. Um FMI a ajudar a salvar da
bancarrota nos anos 80. Em 2011, a Troika, de grande tormento. Termo do
programa de ajustamento previsto para 17 de maio.
E foram Primeiros-ministros de Portugal a conduzir-nos para fobias:
o “monstro”, o “pântano” e a “tanga”. Cavaco, com os dinheiros da União
Europeia, fez-nos lembrar que “O ouro e
os diamantes do Brasil foram a transfusão de sangue num corpo anémico”,
conforme Oliveira Martins retratou as contas do reinado de D. João V, onde
tanto entrou e tão pouco ficou. Dois outros a fugirem. Um a ser demitido
forçosamente pelo Presidente da República, Jorge Sampaio, fazendo recordar, no
século XIII, a deposição de D. Sancho II por seu irmão D. Afonso III, por
incapacidade governativa.
Aquilo que jamais se previra algum dia, neste Portugal,
aconteceu: Bancos a serem ávidos da cobiça dos senhores da ladroagem. Brada aos
céus! Justiça transformada em prescrição!
Basta! Estamos ávidos dum Portugal renovado.
(In "Notícias da Covilhã", de 17.04.2014)
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