Com este mesmo título
publiquei um artigo em 23 de março de 2006. Vem a propósito, para esta crónica,
o que então escrevera há mais de uma década.
Falemos então de Mário Soares
e António Costa que, indubitavelmente, irão ficar nas páginas da História de
Portugal, por motivos diferentes.
A geração que hoje se situa
entre os 40 e os 50 anos não esteve à altura do legado do 25 de Abril. Não
correspondeu às expetativas emanadas deste movimento depois de a Europa ter
também deixado de ser o sonho após a perda de África.
É que o lugar do sonho
depressa foi ocupado por uma geração sem sentido, fascinada com o novo-riquismo
do dinheiro a crédito e no facilitismo bancário. O resultado de hoje foi deixar
aos filhos um país menos esperançoso.
Mário Soares ensaiou um
caminho em busca de um Portugal aberto, moderno e cosmopolita. Foi um lutador
antes e após 25 de Abril, na firme convicção de que só se curariam as feridas
do fim do império e de eliminar a pobreza de âmbito material e moral do
salazarismo se o seu destino se fixasse ao das democracias do Ocidente. Ele e
os democratas que inspiraram o 25 de Abril ajudaram a derrotar as tentativas
totalitárias do Verão de 1975. Neste sentido muito bem ilustrou Manuel
Carvalho, na sua “Memória futura”, do Público.
Quase tudo já se escreveu e se disse sobre Mário Soares, o qual inequivocamente
se irá perpetuar nos anais da história portuguesa. O povo português soube
responder, em várias vertentes, no seu último adeus: “Obrigado, Mário Soares!”.
Sendo laico e agnóstico esteve na defesa da Igreja. E, dando grande exemplo a
muitos católicos, esteve casado com a sua única mulher, Maria Barroso, quase
sete décadas.
Não tive contactos com Mário
Soares mas algumas vezes estive perto dele. Na sua primeira visita à Covilhã, e
à porta da sede do Partido Socialista, então sediada na Rua Comendador Campos
Melo, depois de muitos abraços e beijos, onde não faltava a popular Seabra,
falava num acontecimento importante, que não recordo, que dizia vir publicado
no Diário de Notícias desse dia, o qual ainda não tinha comprado. Como eu
levava o jornal debaixo do braço, apressei-me a oferecer-lho.
Naquele ano de 2006, no meu
aludido artigo, registava o facto de que Portugal atravessava a crise mais
prolongada dos últimos 25 anos, pois que, em vez de uma doença súbita, a então
crise era de uma agonia prolongada. Os anos foram passando e os receios
mantiveram-se. Vamos respirando um pouco melhor.
Memorizando algumas efemérides
da altura, saltei para o ano 1961 com o pretexto de recordar o líder soviético,
Nikita Krustchev, que denunciou Estaline, com o seu “discurso secreto” deixando
sementes que germinaram com Gorbatchov. Vivia-se a guerra fria com o presidente
americano John Kennedy a manter os Estados Unidos mergulhado no pântano
vietnamita e no fracasso da Baía dos Porcos, em Cuba, na crise dos mísseis
nucleares.
Naquela década de 60, do
precedente século, em Portugal vivia-se a ditadura e o mundo exigia, na ONU
(hoje com o português António Guterres como seu secretário-geral) a
independência das colónias portuguesas. Nikita Krutchev, que era a favor da
libertação das mesmas (então designadas províncias ultramarinas), numa ida às
Nações Unidas, para se fazer ouvir, proporcionou um espetáculo cujas fotos
correram as capas dos jornais portugueses, ao bater com o sapato, que
descalçara, na tribuna donde pretendia falar. Em Portugal, cada vez mais
pressionado para entregar as colónias, viu-se confrontado com Nehru a mandar
invadir Goa. Surgiram assim, por todo o País, grandes manifestações patrióticas
contra a invasão da Índia Portuguesa. Também as houve na Covilhã. Da Escola
Industrial, o diretor Ernesto de Melo e Castro dava ordens: “Todos à
manifestação ao Pelourinho!”. Eu também lá estive no meio da multidão que, num
ápice, se aglomerou. Bandeiras e cartazes improvisados serviam para a
manifestação contra a invasão da Índia Portuguesa, em cuja possessão
ultramarina se encontravam muitos militares portugueses a tentar resistir.
Recordo-me, no Pelourinho, de alguns colegas estudantes da Escola Industrial,
do Liceu e do Colégio Moderno, no meio daquele maralhal. Entre eles havia um
cartaz empunhado pelo estudante João Rosa Lã (anos mais tarde viria a ser
Embaixador de Portugal em Madrid, Paris e Marrocos) que dizia: “Deem Toddy ao Krustchev!”. Nesse tempo
passava todos os dias pela televisão (de um único canal a preto e branco) a
publicidade ao Toddy.
É aqui que surge agora António
Costa, numa visita histórica à Índia, incluindo Goa donde tem a sua origem. É,
de facto, “uma ocasião política que nos permite entrever o arco que vai da
primeira globalização – quando Vasco da Gama chegou à Índia em 1498 – até à
crise da globalização presente”, nas palavras de Rui Tavares. De facto, é esta
em que um político português com origens em Goa e no antigo Estado Português da
Índia visita a República da Índia.
As relações entre Portugal e a
Índia não foram fáceis. Curioso é que, no mesmo ano em que o primeiro-ministro
português, António Costa, nasceu, em 1961, Goa foi anexada pela Índia, junto
com os outros territórios portugueses no subcontinente indiano.
A Índia é o segundo país mais
populoso do mundo, com uma das economias mundiais que mais cresce.
A grande esperança é que desta
visita venham vantagens acrescidas para Portugal.
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