3 de janeiro de 2018

NATAL NO TEMPO DO PADRE CARRETO E O ASILO COM D. GONZAGA

Ainda em época natalícia e no surgimento de um novo ano, proporcionam-se sempre algumas memórias da ancestralidade das nossas vidas, num ambiente ameno entre familiares, antigos colegas e amigos, daqueles idos tempos da década de 50 do século XX. Era a catequese, que geralmente se designava de doutrina; e a escola primária, hoje ensino básico.
A diferença abismal entre a inexistência de meios de distração, para além dos cinemas paroquiais, e do Teatro do Pina, para os mais velhos, e o futebol no Santos Pinto, quando o havia aos domingos, com os relatos na Emissora Nacional, muito ouvidos pelas tabernas; e a falta da televisão que só em 1957 surgiu no nosso País, e o que hoje envolve esta era digital; levava a reunir-se então  a criançada na Igreja de São João de Malta, freguesia de São Pedro, paroquiada pelo padre José Domingues Carreto, para a “Novena do Menino Jesus”, de 16 a 24 de dezembro.
A rapaziada entoava então o cântico ao Menino Jesus, com uma expressão forte que ficou na memória de alguns, hoje já avós e bisavós:

Ó Infante Suavíssimo
Ó meu Amado Jesus
Vinde alumiar minha alma
Vinde dar ao mundo luz.
Ó meu Amado Jesus
Ó meu Amado Jesus
Delícias do coração
Só por vós se pode estar
Só por vós se pode estar
Toda a noite em oração.

Já a escola onde andei na primária – “Asilo – Associação Protetora da Infância”, era frequentada por alunos pobres (um deles ia descalço), por remediados e por alguns de certo modo abastados,  numa polivalência de interesses.
Esta associação que depois foi transformada em escola, foi criada em 9 de junho de 1870, no reinado de D. Luís, com o nome “Real Associação Protetora da Infância Desvalida”, destinada à criação de um asilo, cuja inauguração se verificou em 25 de julho de 1871. Teve efémera duração.
Por falta de utentes, em substituição do asilo foi criada uma escola destinada à instrução primária; e uma biblioteca (estatutos aprovados em 22 de dezembro de 1904 e regulamentos em 26 de junho de 1905).
Deixou de ser escola primária em 1968, pelas alegadas razões de existirem na cidade escolas primárias em número suficiente. Passou a ATL – Atividades de Tempos Livres.
Os principais fundadores foram Francisco Joaquim da Silva Campos Melo (Visconde da Coriscada) e José Maria Veiga da Silva Campos Melo (fundador da Escola Industrial).
Entretanto, atentemos sobre a sua biblioteca, criada numa dependência do Asilo em 4 de junho de 1882, que foi a primeira biblioteca pública aberta no País depois das de Lisboa, Porto, Coimbra e Évora. No ano de 1880, aquando das comemorações do tricentenário da morte de Camões, teve esta instituição grande preponderância no relevo dado ás comemorações. Era então Presidente da Câmara José Maria Veiga da Silva Campos Melo.
Em reunião da Assembleia Geral de sócios realizada em 19 de junho de 2000 foi deliberado e aprovado transferir para a Biblioteca Municipal da Covilhã, a Biblioteca Heitor Pinto. A transferência foi efetuada em 25 de abril de 2001, tendo sido celebrado com a Câmara um protocolo de colaboração com vista à salvaguarda, preservação e difusão do fundo documental estimado em cerca de 3 383 monografias, nomeadamente livros do século XVI.
A família Campos Melo dedicou muito carinho pela causa desta instituição. Era várias vezes visitada pelo Eng.º Ernesto de Melo e Castro, e pela sua esposa, D. Gonzaga, que algumas vezes se deslocava sozinha; muito conversadora, e disciplinadora com os alunos, por quem tinham muito respeito. Já na Escola Industrial, D. Gonzaga tornava-se uma educadora compulsiva das alunas, onde não faltavam os ralhetes, em que, qualquer desmando era objeto de forte indignação da sua parte. Respeitinho… Dos meus colegas de classe, no Asilo, recordo Rui Terenas, Carlos Fernandes, Coelho Saraiva, Albuquerque, Jorge Mota, António Chiquita, António Carriço, Mangana Nogueira, Fernandes Berto, Carlos Garcia, Luís Reis, Raul Loriga, José Bichinho, Pais da Silva, Isento, Bernardino, João Aguilar, Gil Alves, José Alberto Ruas, Duarte Brito, José Manuel Jorge, João Manteigueiro Mota e Virgílio Trindade, alguns já falecidos.
A encarregada da limpeza e da cozinha era a D. Maria Helena. Na parte da secretaria estava em par time o Sr. Belmiro, funcionário da Subdelegação de Saúde. Aos sábados de manhã, em que também havia aulas, era dividida por uma parte de Religião e Morão dada por umas freiras do Colégio das Doroteias, e, de vez em quando, pelo padre José Andrade. Seguia-se uma parte de instrução da Mocidade Portuguesa, ministrada por um sargento do Batalhão de Caçadores 2, então sediado na Covilhã, e, outras vezes, pelo João Machado, do Teixoso, já falecido, que estudava na Escola Industrial e Comercial Campos Melo.
Entretanto, o imóvel desta instituição, que foi escola, tendo sido objeto de obras de beneficiação, encontra-se sem qualquer utilidade, na Rua dos Combatentes da Grande Guerra, por parte dos seus proprietários, devoluto, quando havia muito como ser utilizado.


(In "Notícias da Covilhã, de 04/01-2018)




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