12 de junho de 2018

OS “MORTOS” QUE AINDA VIVEM


Não me estou a referir, como crente, à vida além-túmulo. Não estou a fazer referência à memória dos que partiram e que estão vivos na perenidade das nossas mentes, enquanto viventes deste planeta.

Não tenho a pretensão de fazer reviver a lenda de D. Sebastião, naquela que fora a falta de certezas sobre a sua real morte, o que na altura redundou desesperadamente na esperança de que o rei pudesse retornar ao trono de Portugal, numa manhã de nevoeiro. Aceito, contudo, que o covilhanense Aires Teles de Meneses, Alcaide-mor da Covilhã que serviu na Índia e acompanhou posteriormente D. Sebastião, na Batalha de Alcácer Quibir, onde ficou prisioneiro, tivesse sido resgatado e regressado à Covilhã, encontrando-se sepultado na Igreja de Nossa Senhora da Conceição.

Mas também não posso deixar de manifestar a minha repulsa pelo facto de na altura em que escrevo esta crónica, tivesse sido objeto de um ato provocado por um vivo mas morto de espírito, aquando duma ação solidária de transporte de bens alimentícios do Banco Alimentar para uma instituição de Caridade, conjuntamente com mais dois colegas, ao ser abordado rispidamente e fora da habitual educação dos seus camaradas, polícias, com ar de excessiva autoridade para se fazer notar publicamente, quando terminávamos em correria o nosso trabalho voluntário, com a anuência e compreensão de dois ou três condutores à nossa retaguarda, que aguardavam com compreensão o términus do nosso trabalho. É que aquele vivo, mas morto de imaginação, certamente estaria com o estômago bem satisfeito enquanto nós, voluntariamente, procurávamos ir ao encontro de estômagos vazios. Ao invés desta sua conduta, já outros seus colegas, em situações similares, procuraram ajudar-nos na solução do trânsito.

No Público de 3 de junho, era dada a notícia de que o piloto russo desaparecido há 30 anos no Afeganistão, dado como morto, encontra-se ainda vivo e pretende regressar a casa. A aeronave havia sido derrubada durante a intervenção das tropas da ex-URSS no país, em 1987. É um facto que, por enquanto, não se sabe exatamente por que é que não deu sinais de vida durante estes anos. É, indubitavelmente, estranho!

Sobre os mortos da Primeira Grande Guerra e, depois da década de sessenta, no que diz respeito aos antigos Combatentes do Ultramar, houve casos insólitos de indivíduos dados como mortos e que, mais tarde, surgiram vivos. Recordo numa reportagem dum dos canais televisivos, um antigo combatente, numa das terras deste Portugal, a reclamar que ele estava ali vivo, era ele mesmo e não o que constava com o seu nome e datas de nascimento e falecimento,  na tabuleta duma sepultura que indicava. Erros da história. E os problemas com a rejeição das suas famílias, algumas já tendo reconstituído as mesmas com outros parceiros?!

Tenho um amigo que integra o nosso grupo de casais que se reúne frequentemente. Conforme contei em tempos, é um outro dos que fora dado como morto, mas que depois se verificou estar vivo. Aquando dum acidente de viação conjuntamente com outros colegas que se faziam transportar na mesma viatura, durante uma deslocação no tempo do serviço militar obrigatório, um grave acidente era noticiado nos jornais sobre a situação de três feridos graves e um morto, que era este nosso amigo. Já se encontrava na morgue para ser autopsiado quando o funcionário da mesma que ia recolher o considerado “cadáver” lhe vê cair o braço da mesa de pedra onde se encontrava depositado, dando sinal de vida. Afinal, descuidadamente, não havia um morto. O suposto morto estava vivo e é hoje um grande companheiro na nossa amizade.

Há tempos também nos foi dada indicação de uma pessoa que havia falecido. Todas as indicações recaiam nesse indivíduo. Qual o meu espanto quando consultava a necrologia num dos locais habituais, já próximo da noite, e, olhando para o lado, vejo essa pessoa, supostamente a encontrar na necrologia, sentada numas escadas, de telemóvel na mão…

Há, de facto, situações estranhas, mas sempre é bom o grito de alegria pelos vivos que “deixaram” de estar mortos.

É pena que hoje, por este nosso país, ainda nos deparemos não com mortos que felizmente “ressuscitaram”, só tendo surgido o acontecimento por lapsos profissionais ou de outra vertente qualquer, mas sim, sem surpresa a existência de muitos mortos-vivos.

(In "fórum Covilhã", de 12-06-2018)

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