28 de junho de 2021

DO EQUINÓCIO DA PRIMAVERA AO SOLSTÍCIO DO VERÃO

 

Entre estes dois momentos do ano, dou início a este editorial para os estimados Camaradas Antigos Combatentes e Leitores em geral. Depois do que tantos de nós temos passado, será reconfortante que a encantadora primavera nos entregue ao tentador verão, que quase todos esperamos.

Outros momentos foram surgindo desde o último número deste periódico. Por exemplo, muitos já fomos vacinados contra a Covid 19. Outros continuam ainda a aguardar pela segunda dose da vacina. O desejo é de que todos nos sintamos mais protegidos e possamos voltar aos pontos de reuniões diversificadas, incluindo os convívios no espírito dos eventos tão desejados.

Na sequência do Estatuto do Antigo Combatente aprovado pela Lei n.º 46/2020, de 20 de agosto, a que fizemos referência na edição d’O Combatente da Estrela, nº. 120 de setembro de 2020, surgiu em abril a aprovação do protocolo que isenta os antigos combatentes de taxas moderadoras nas consultas, exames complementares de diagnóstico e nos serviços de urgência do SNS, estendendo-se também às viúvas e viúvos dos mesmos.

Segundo um estudo do americano John P Cann, financiado pelo Kings College de Londres, especialistas ingleses e norte-americanos estudaram comparativamente o esforço das nações envolvidas em vários conflitos em simultâneo, principalmente no que respeita à gestão desses mesmos conflitos, no campo da logística geral, do pessoal, das economias que os suportam e dos resultados obtidos. Assim, John Cann  chegou a várias conclusões, entre as quais, que em todo o mundo só havia dois países que mantiveram três teatros de operações de guerra em simultâneo: a Grã-Bretanha, com frentes na Malásia (a 9.300 Km, de 1948 a 1960 – 12 anos); no Quénia (a 5.700 Km, de 1952 a 1956 – 4 anos); e em Chipre (a 3.000 Km, de 1954 a 1959 – 5 anos); e Portugal, com a frente na Guiné (a 3.400 Km), Angola (a 7.300 Km), e Moçambique (a 10.300 Km), de 1961 a 1974 (13 anos).

Os especialistas chegaram à conclusão de que Portugal, dadas as premissas económicas, os seus recursos, a sua pequena dimensão, as dificuldades logísticas para abastecer as três frentes, bem como a sua distância, a vastidão dos territórios em causa, e a enormidade das suas fronteiras, foi aquele que melhores resultados obteve.

Consideraram por último, que as performances obtidas por Portugal, se devem sobretudo à capacidade de adaptação e sofrimento dos seus recursos humanos, à sobrecarga que foi possível exigir a um grupo reduzido de quadros dos três Ramos das Forças Armadas, com comissões atrás de comissões, com intervalos exíguos de recuperação física e psicológica e às centenas de milhares de jovens que durante 13 anos combateram naqueles territórios. Baseiam-se estas afirmações com base em observadores internacionais.

Por várias vezes foi referido, que estes homens que serviram durante estes anos na Guerra do Ultramar, só pelo facto de aguentarem este esforço sobre humano que se reflete necessariamente em debilidades precoces de saúde, mazelas para toda a vida, invalidez total ou parcial, e morte, tudo ao serviço da Pátria, merecem o reconhecimento da Nação, mas jamais lhes foi dada essa justa oportunidade. Algumas referências em momentos como nos dias 10 de Junho, não são suficientes.

Por todo o Mundo se veneram, recordam, imortalizam e se homenageiam os soldados que combateram em teatros de guerras, sejam eles vencedores ou vencidos. Mas muitos dos nossos mortos foram abandonados nos territórios africanos. Valeu o trabalho de excelência da Liga dos Combatentes, diligenciando, tanto quanto possível, que todas as ossadas dos nossos Antigos Combatentes, com as inerentes dificuldades, fossem armazenadas nos respetivos cemitérios, sob devido registo, colocando-as assim à disposição das suas famílias.

Na opinião muito racional do antigo Combatente que nos facultou estes elementos muito pertinentes, refere, e muito acertadamente, “que somos os únicos que não seguem os exemplos generalizados do tratamento diferenciado aos que serviram a Pátria em combate. E pior ainda. O cúmulo dos cúmulos. Quem combateu é censurado, vilipendiado e ostracizado. Pelo contrário, os traidores/desertores, muitos dos quais fugiram e foram viver com mordomias de príncipes e outros que ainda pululam no sistema político vigente, apelavam à morte dos soldados portugueses.”

Muitas memórias foram escritas em livros, alguns dos quais foram objeto de apresentação na Biblioteca Municipal da Covilhã (BMC), por via deste Núcleo da Covilhã da Liga dos Combatentes.

Refiro alguns que constam da minha biblioteca pessoal e que já tive o ensejo de os ler:

- A Tropa vai fazer de ti um Homem (Guiné 1971 – 1974), de Juvenal Sacadura Amado. Apresentado na BMC em 21-04-2016.

- Cartas do Mato, por Daniel Gouveia.

- Danos Colaterais – Angola 62/64, de J. Eduardo Tendeiro.

Apresentado na BMC em 2017.

- Memórias Combatentes na guerra do Ultramar, de João Peres, Edição da Liga dos Combatentes Núcleo de Olhão, de 02-04-2016.

- Cambança Final (Guiné – Guerra Colonial) – Contos, de Alberto Branquinho. Maio de 2013.

- Filhos d’outrem ou d’algures, de Alberto Branquinho. Maio de 2015.


Outros nomes que foram objeto de informação pública, como Gente Acenando para Alguém Que Foge, romance da expedição de Paulo Faria a Moçambique; ou Memórias de um desertor, de Sérgio Palma Brito, são sempre obras a ler por quem quiser melhor conhecer realidades demasiado esquecidas, “mas que foram componentes essenciais para compreender os anos de 1969/70 do salazarismo, do colonialismo e do exílio portugueses”.

(In "O Combatente da Estrela", nº. 123-JUL/2021)

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