18 de maio de 2023

SESSENTA ANOS

 


É um número redondo. São 720 meses. Não faço os cálculos às semanas, aos dias e mesmo às horas. O suficiente. É um tempo que perdura em muitas estórias da história das Pessoas. Mas também de uma Instituição. Pública ou de cariz privado. Não existem instituições sem Pessoas.

Estas necessitam de ser informadas. Mas também de encontrar espaços onde a cultura lhes abra horizontes. Em afastar aqueles défices cognitivos que a idade não perdoa. Aquelas memórias temporariamente dissipadas.

O meu contacto com este meio da comunicação social, de âmbito regional, e não só, sob o título de jornal “O Olhanense”, não é recente. Já tem umas décadas.

E tudo começou na envolvente dos nossos dois Clubes, de amor às Terras que nos viram nascer. Amor esse, seja de raiz ou mesmo de coração. Numa dualidade da mesma letra do alfabeto – M – Montanha e Mar. Pelo lado da Montanha, o Sporting Clube da Covilhã (SCC), do qual já fiz referência no último número deste quinzenário. Na perigosidade dum naufrágio, na iminência de vir a acontecer. Pela vertente do Mar, o Sporting Clube Olhanense (SCO). A sua descida mais profunda, também referido no último número. Ambos são históricos do futebol português. Ambos singraram pelos caminhos da I Divisão Nacional (hoje I Liga). Ambos se defrontaram entre si, nos Campeonatos Nacionais, na Taça Ribeiro dos Reis e na Taça de Portugal.

Mas o que estamos a comemorar nestes sessenta anos, não é exclusivamente inerente ao SCO, pois esse, em menos de uma década completará, em dobro, o tempo do que agora queremos enaltecer.

Queremos registar, por que não homenagear, significativamente em letras douradas, seis décadas da vida deste quinzenário algarvio. Ininterruptamente, mesmo no longo período da pandemia, não só transmitiu a vivência como tudo o que em redor do seu clube se passou neste espaço temporal. Assim como trouxe para as suas páginas, memórias e figuras da vida local. Não só de outrora, como dos tempos que correm: artigos de opinião, notícias jurídicas, crónicas, entrevistas, poesia, e sobre a vida da coletividade que está na génese deste periódico. Uma publicação que tem um mentor que consegue gerir as dificuldades emergentes do que se passa com o jornalismo regional.  Há que louvar a pertinácia do Homem certo no lugar certo. Não olhando a dificuldades. Incluindo as de saúde. E aqui, e na tenacidade, há dual entrega do que tenho vindo a salientar – as Pessoas. Aquelas que dão o corpo ao manifesto, como sói dizer-se. Sem opção de posarem para a fotografia.

Mário Proença e Isidoro Silva Sousa permutaram as suas posições para Diretor e Diretor Adjunto, respetivamente, há poucos meses. As pessoas que têm mantido este Jornal em continuidade. Um exemplo para muitos periódicos regionais que atingiram também metas interessantes no seu espaço temporal. Mas não aguentaram a pressão do desenvolvimento. E então dão-se ao luxo de os colocar gratuitos, após uma “ressurreição”, a ver se pega. Como surgiu na cidade serrana. E, assim, é vê-los em tristes sobras. Contrastando com outro que a Cidade já possui há 12 anos, mas com Pessoas da Terra, ou aqui radicadas, é vê-lo crescer. Quem lê e se interessa pelos eventos mas também pela diversificada opinião dos seus colaboradores, não está a olhar para os eruditos da capital, mas ombreia pelos que transmitem intrinsecamente a popularidade que lhes vai na alma.

Foi com Herculano Valente, que há 15 anos nos deixou, que eu iniciei o meu contacto com o quinzenário “O Olhanense”. Mais por via de cartas de apreço e de informação, e das apresentações dos meus livros. Mas também de comentários entre as nossas duas Coletividades. A primeira referência a uma minha publicação e carta enviada, foi inserida neste Jornal, então designado “O Sporting Olhanense”, em 15/08/1993, a caminho dos 30 anos. Mas, sem dúvida, é após o falecimento do Diretor Herculano Valente, que, após a minha perplexidade, quase em jeito de despedida da continuidade em colaborar com este excelente periódico que, pela mão do Amigo Mário Proença, que já era um grande colaborador do Jornal, me pede para continuar, já que ao Jornal iria ser-lhe incutido um cunho de melhoramento. E é assim que, por alvitre de Mário Proença, em 01-10-2010, surge a minha rubrica “Retratos da Beira-Serra” (atualmente “Ecos da Beira-Serra”), onde são publicadas as minhas crónicas sobre a minha região, na diversidade de artigos de opinião. O artigo foi então sobre “As Minas da Panasqueira”.

Já ocupei demasiado espaço deste “nosso” Quinzenário, com a minha ligação há quase três décadas, onde acabei por ter mais amigos daquela “Gente da nossa Gente”.

Os meus parabéns a todos os Obreiros do Quinzenário “O Olhanense”, muito em especial ao Homem que tem feito quase tudo por manter as suas páginas ao serviço dos Leitores, onde a maioria tem o cunho das teclas do seu computador, estimado Amigo Mário Proença Leonardo; e também ao bom Amigo, Isidoro Silva Sousa, ambos, tantas vezes, em esforços hercúleos para que não acontecesse o fim.

Longa vida para o Jornal O Olhanense e que volte bem depressa a alegria para as hostes olhanenses, para assim se poder celebrar mais um aniversário, com a cereja em cima do bolo.

 

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

(In “O Olhanense”, de 15-05-2023)

 

 

11 de maio de 2023

COMO FOI DIFÍCIL PARA HOJE SE VIVER FACILMENTE




Neste mês de maio poderia falar de muitas coisas. Para trás ficou abril, com a data histórica do 49º aniversário da Revolução de Abril, assinalando-se a liberdade que era inexistente em Portugal. Persistia a teimosia da ditadura em ver partir os jovens para a guerra subversiva. E de todos os milhares que abandonavam o País, fugindo da miséria, a caminho da emigração, de assalto, ou de comboio com malas de cartão.

Ficaram também as polémicas geradas com a vinda e receção do presidente brasileiro, Lula da Silva, na Assembleia da República Portuguesa, fruto da sua infeliz conduta sobre a  invasão da Ucrânia pela  Rússia, aquando da recente visita a este país.

Outra data importante foi assinalada no 1.º dia de maio – O Dia do Trabalhador. Maio vem de Maia, divindade romana que era celebrada nesta época. Deusa da terra e das flores, é responsável pelo crescimento das plantas que nasceram na primavera. É também a deusa romana do crescimento, mãe de Hermes ou Mercúrio. Proverbialmente, “em maio, come a velha a cereja ao borralho”, “maio claro e ventoso, faz o ano rendoso”, “maio frio, junho quente, bom pão, vinho valente”, e “maio que não der trovoada, não dá coisa estimada”.

Para os católicos romanos, mormente os portugueses, este mês é dedicado especialmente à Virgem Maria, Nossa Senhora de Fátima, a 13 de maio, sendo que o 1º dia de maio é também o Dia de São José Operário. E o Dia da Mãe celebra-se, em Portugal, no 1º domingo de maio. Foi em 3 de maio de 1455 que nasceu D. João II; e, muito para trás, D. Afonso III em 5 de maio de 1210. Em 13 de maio de 1699 nasceu o Marquês de Pombal, e, em 13 de maio de 1767, D. João VI. Em 18 de maio de 1920 nasceu o papa João Paulo II. Em 31 de maio de 1469 nasceu D. Manuel I. Assinale-se, no dia 5 de maio de 1821, a morte de Napoleão Bonaparte; e, no dia 25 de maio de 1786, a morte do rei consorte, D. Pedro III.

Mas... deixemos o mês de maio e vamos ao título da crónica.

Rebuscando os meus papéis, fui encontrar num número especial do DNA de há duas décadas, mas com grande atualidade, curiosidades sobre a origem de coisas que demoraram anos, décadas e séculos a nascer. É que nem damos por milhares de gestos de rotinas e de hábitos que diariamente fazemos, repetimos, ou vemos outros fazerem. Coisas que nada nos dizem. Banalidades, trivialidades. E, no entanto... todo aquele tempo foi necessário para que hoje possamos viver facilmente.

Noutro periódico fiz referência ao “baluarte tecnológico e imparável que, em minutos ou segundos, se faz o que levaria dias, meses ou anos para se conseguir”.

Os objetos e máquinas foram sonhos perseguidos por gerações, miragens dos nossos antepassados, futurologia há cem anos.

Pergunte-se a alguém com mais de 40/50 anos, como se vivia sem telemóvel? Sem Multibanco? Sem Internet? Pergunte-se a um avô com mais de 65 anos: e antes da esferográfica, como se escrevia? E como se via televisão sem um comando à distância?

O mais simples dos gestos diários que fazemos tem na sua origem estudo, trabalho, investigação – e séculos de escuridão. O mais banal dos produtos que usamos não existia nem se adivinhava há 100 anos. Não se vendia em massa no tempo dos nossos avós. Raras vezes falamos desses produtos. É tão óbvia a utilização de um telefone sem fios, que nem nos interrogamos sobre a sua origem ou o tempo em que ele não existia. É tão trivial usar uma máquina de fazer a barba pela manhã que não nos ocorre perguntar de onde vem, quem a inventou. Por todo o mundo, estão a ser inventados novos produtos, novas técnicas, que um dia usaremos corriqueiramente sem sobre elas nos interrogarmos. Por isso, uma homenagem aos Homens e Mulheres, e às empresas que, com os seus inventos, às vezes tão simples como um clip, às vezes tão sofisticados como um computador, facilitaram as nossas vidas, trouxeram comodidade, conforto, prazer ou mais tempo livre para pensar noutros assuntos! Reconhecemos a relevância daqueles que acrescentaram algo ao mundo em que vivemos. E também se infere que tudo isto foi feito para se viver facilmente, mas até aqui chegar foi difícil. Por agora, e por falta de espaço, apenas registo os detalhes de uma das invenções – o fecho-éclair. Nem falo das calças de bombazina, nem dos “kispos” que “nasceram” por alturas da revolução de 1974. Poderei vir a falar dos jeans, essa extraordinária invenção que mudou o nosso modo de vestir e que não há moda nem mania que retire do mercado. O que é que isto tem a ver com o fecho éclair? Bom, no meu tempo, as calças só tinham botões... depois passou a usar-se o fecho-eclair e as duas situações, até que prevaleceu a segunda opção. Deve a sua existência a Whitcomb Judson e terá surgido em 1891. Segundo consta, o inventor estava farto de perder tempo a calçar-se com atacadores e ouvir as mulheres queixarem-se da morosidade em fechar os espartilhos com fitas. Judson decidiu-se a criar um sistema alternativo em metal. Nos primeiros anos do século XX o “fecho-éclair” ganhou forma e feitio.

Mas se a curiosidade despertar, podemos vir a saber como foi inventado o simples clip, o fax, o antibiótico, a ganga, as lentes de contacto, a via verde, o computador, o post-it, o ar condicionado, o cartão multibanco, a refrigeração, o CD, as fraldas descartáveis, o telefone sem fios, o micro-ondas, o tetra pak, o telefone celular, a máquina de lavar roupa, a pílula, a esferográfica, a Internet, o telecomando, a lycra, a varinha mágica, a máquina de barbear, o edredão, a aspirina, o transístor, ou outras coisas mais.

 

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

(In “Jornal Fórum Covilhã”, de 10-05-2023)

 

 

5 de maio de 2023

VELHAS GLÓRIAS



 

Entre o espaço que medeia escrever esta crónica e a data da sua publicação, várias posições desportivas estão a rumar com agitação dos ventos que agora se tornam mais a favor, ou contrários, sob o manto diáfano do destino traçado.

É com tristeza que vejo o Sporting Clube Olhanense (SCO) alijado da embarcação em que andou navegando, quando a sua história no futebol português estaria mais em consonância a viajar num paquete, menos propício a afundar-se. E isto quando acaba de comemorar o seu 111º Aniversário. Esperemos que depois desta tormenta venha a bonança, passando a brilhar a luz do farol determinante como guia para a rota certa mais condizente com os méritos desta prestigiosa coletividade algarvia.

Mas os contextos em que o futebol flutua nos tempos que correm permitem a abundância de incautas decisões, na avidez de colocar as embarcações a navegar independentemente de reconhecidas fragilidades existentes, e daí os resultados que surgem, já quase sem estupefação, no mapa futebolístico, onde clubes de grande prestígio hoje os vemos em lugares ventosos.

Também o Sporting Clube da Covilhã (SCC), depois de conseguir durante vários anos navegar em águas tranquilas, embora com alguns ventos e marés na sua rota, se vê arredado para uma posição que não corresponde aos pergaminhos do clube serrano, considerado, tal como o Olhanense, um dos históricos do futebol português. As comemorações do seu centenário, a ocorrer este ano com início em junho, estarão refletidas para muitos serranos, de raiz ou de coração, de tristes ou ledas madrugadas, de sonhos desfeitos ou na continuidade do barco na mesma rota em que navegava. Esperemos que também aqui a luz do farol possa brilhar.

O título da crónica vem no seguimento das pedras basilares que se evidenciaram na constituição das equipas, e, tantas vezes, como na bíblia, “aquela que os construtores rejeitaram se tornou a pedra angular”.

Há muito que, serrano, tenho vindo a escrever neste prestigiado quinzenário algarvio, de cuja região, como Olhão, o Algarve veio a ser um viveiro daquelas pedras que vierem dar à “costa” da Covilhã, porta principal para a Serra da Estrela, com destino aos Leões da Serra.

Dos valorosos, como foram Fernando Cabrita e outros que jogaram no SCO, destaco o algarvio oriundo do Lusitano de VRSA, Domiciano Barrocal Gomes Cavém que veio juntar-se a seu irmão Amílcar Cavém, envergando a camisola do SCC, respirando os ares da Serra da Estrela. Aqui jogou nas épocas 1953/54 e 1954/55. Logo se evidenciou nestas duas épocas, onde participou em 25 jogos na primeira e marcou 9 golos, logo seguido de Simonyi; e igual número de jogos na segunda e última época, onde liderou como melhor marcador do SCC, com 14 golos. Participou ainda em duas eliminatórias da Taça de Portugal, onde marcou 1 golo.

No Sporting da Covilhã, onde se evidenciou, logo teve a cobiça de outros clubes, nomeadamente o Vitória de Setúbal, onde esteve quase com um pé dentro quando surgiu o Benfica a desembolsar 225 contos, sendo 175 contos para o Vitória de Setúbal e 50 contos para o jogador, levando-o para as suas fileiras na época 1955/56, onde permaneceu 14 épocas. No Benfica efetuou 48 jogos nas provas da UEFA, duas vitórias na Taça dos Campeões Europeus (1961 e 1962), 9 vezes campeão nacional e 4 vezes vencedor da Taça de Portugal. Foi ainda 18 vezes internacional tendo marcado 5 golos.

Mas focando-nos ainda na sua vinda para o SCC, foi o guarda-redes suplente dos Leões da Serra, Isaurindo, também ele algarvio, que foi incumbido pela Direção do clube serrano de ir “estabelecer as démarches preliminares junto do Domiciano Cavém” para a sua vinda para o SCC. Segundo Isaurindo, “trata-se de um jovem de pouco mais de 20 anos, com qualidades magníficas para o futebol, a quem a Crítica tem tecido elogiosas referências. Possui ótimo remate e evidencia-se particularmente no jogo alto devido à sua facilidade de elevação e cabeceamento. Há acentuado interesse por parte da família do jovem atleta, pelo que as démarches devem ser coroadas de êxito e o SCC terá alcançado os serviços de mais um jogador de futuro, tal como aconteceu com Amílcar Cavém e Hélder, ambos vindos também do Lusitano algarvio”

O que é certo é que, como atrás foi descrito, Domiciano Cavém acabou por ir representar muito brilhantemente o Benfica.

Em sua substituição, o clube lisboeta cedeu ao SCC o seu jogador Fernando Pires, meu vizinho, felizmente ainda vivo, mas que o treinador Otto Glória não queria deixar sair, onde ganhava 800$00, passando a receber no clube serrano 2000$00 e mais 30 contos de luvas, embora tudo pago em prestações...

Domiciano Cavém participou numa homenagem promovida pela APAE Campos Melo – Associação dos Antigos Professores, Alunos e Empregados da Escola Campos Melo, onde eu era dirigente e diligenciei este evento, no dia 28/09/1991. Compareceram mais de trinta “Velhas Glórias do SCC”, todas dos tempos em que militaram na Primeira Divisão Nacional. Quase todos já não se encontram no número dos vivos, entre os quais Domiciano Cavém, que faleceu aos 72 anos, em Alcobaça, onde se havia radicado. O Benfica prestou-lhe uma homenagem póstuma, assim como a Federação Portuguesa de Futebol, mas, segundo parece constar, não lhe deu qualquer oportunidade de ajuda, já que o Domiciano, no final da sua carreira, ainda tentou ser treinador mas sem qualquer sucesso. Certamente o clube lisboeta não se tivesse recordado do episódio da sua barba que deixou crescer, em 1962, barba que só cortaria se o Benfica ganhasse ao Real Madrid e, consequentemente, seria bicampeão europeu, o que veio a suceder. Foi então que Domiciano Cavem foi cortar a barba e recolheu os pêlos todos e guardou-os...  É que havia candidatos à compra da barba! Um sócio do Benfica telefonou à comissão central das obras do estádio pedindo para ficar com a barba de Cavém, e houve mesmo alguém que alvitrou a possibilidade de se fazer um leilão com a barba do jogador, revertendo a receita para o estádio... (In “Record”).

Domiciano Cavém, não obstante a apatia do clube que durante mais de uma década representou e onde fortemente brilhou, segundo parece constar, terá vivido com dificuldades económicas, mas desconheço se as terá tido mais acentuadas conforme me fizeram chegar por via das redes sociais.

Muito mais haveria a dizer sobre memórias serranas e algarvias, que perduram e ultrapassam várias gerações, com uma ou outra pedra a salientar-se do rochedo da nostalgia.

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

(In “O Olhanense”, de 01-05-2023)

 

4 de maio de 2023

AMIGOS EM CASTELO BRANCO


 

Ao longo de quase quatro décadas da minha última atividade profissional que abracei, reportada entre 1973 e 2012, deixando para trás outras após ter terminado o serviço militar obrigatório em 1971, grande parte da mesma teve passagens marcantes no distrito de Castelo Branco. Muitas vezes pernoitei nesta cidade, no regresso da visita comercial aos concelhos de Proença-a-Nova, Sertã e Vila de Rei, já que Oleiros e Vila Velha de Ródão ficavam para outra volta. Já nas deslocações a Penamacor e Idanha-a-Nova, nesta última recordo, com o agente de Idanha, António Catana, várias visitas pelas freguesias do concelho, entre gente boa, humilde, de muitos anciãos numa altura de forte iliteracia, assim como conheci as grandes propriedades onde crescia o trigo, o centeio, a aveia e o tabaco, como a do Marquês da Graciosa. Em Alcains, era forçoso visitar o sempre sorridente e simpático Amável Barata Castilho, que já nos deixou, e que gostava de me oferecer laranjas do seu quintal.

Era ainda o tempo em que não havia telemóveis. Um furo num pneu ou uma avaria no automóvel, tinha de haver o desenrascanço.  Ainda não havia a assistência em viagem no seguro automóvel.  E, mesmo este seguro, ainda não era obrigatório, assim como a colocação do cinto de segurança. Outros tempos que dariam muitas estórias para contar da história de vida de cada um de nós. Os contactos telefónicos só por via de cabines telefónicas instaladas nalguns estabelecimentos comerciais, geralmente os cafés.

Mas faziam-se muito amigos, quer por via da vida profissional, quer pelos casos de velhas amizades encontradas.

Em Castelo Branco, durante vários anos, confraternizava nas noites do meu pernoitamento, com o amigo covilhanense, João José Dias Tomás, radicado nos Maxiais, onde casou.

Certamente que alguns dos que lerem esta crónica se recordarão dos tempos em que dei formação nesta cidade a vários candidatos a agentes de seguros, os levei a exame por exigências regulamentares da altura, com a consolação de sucesso na aprovação de todos perante o júri da capital.

Há dias, em contacto telefónico com o amigo albicastrense Luís Vicente Barroso, que, no futebol, como guardião, defendeu as cores do Desportivo e do Benfica de Castelo Branco, irmão de outro amigo já falecido – o Ludgero, que pertenceram aos quadros da empresa J. Castanheira, Lda, onde fazia o meu “quartel-general”, fiquei contente em saber que tem visto as suas antigas colegas Maria do Rosário, Maria dos Anjos e Madalena, com as quais contactava aquando da visita àquela empresa. Pedi lhes apresentasse os meus cumprimentos. É que, na Reconquista, vou tendo conhecimento de algumas pessoas amigas, ou de antigos contactos comerciais, que já partiram do mundo dos vivos. Há poucos anos foi o saudoso amigo José Maria Ventura da Silva Balonas, que depois passou a representar a Lusa em Castelo Branco. Foi ele que diligenciou a publicação na Reconquista, em 22 de maio de 1992, da notícia dum dos meus primeiros livros.

Tive contactos iniciais aquando da instalação da empresa Centauro, em Castelo Branco, por intermédio do já falecido sócio José Castanheira, onde conheci também o sócio Henrique. Tudo se passou há algumas décadas. Soube que o empresário Manuel Ramos Tomás e seus irmãos, também já cá não estão, como destino normal da vida neste planeta.

Da extinta empresa J. Valente & Irmãos, C.I., SARL, tive conhecimento através deste semanário, na necrologia, do desaparecimento de antigos funcionários como Maria do Céu Moreno Pires e Augusto Cravo Dias, para além de vários sócios desta empresa. Memorizei no meu livro DA MONTANHA AO VALE, alguns extratos da minha vivência profissional, no seio albicastrense, duma forma romanesca.

Aqui vão alguns deles que se reportam a personagens reais, no âmbito daquela minha facto-ficção.

“Entrámos na Belar, onde tomámos café e logo aí encontrámos dois amigos – o António Rosário Augusto e o Eduardo Fernandes – a quem informámos o porquê deste grande grupo. O António Augusto ia almoçar ao Kalifa e o Eduardo ao Palitão. O Joaquim Almeida, proprietário do Hotel Covilhã-Jardim disse: Isto tudo fecha!... Antigamente havia aqui o Arcádia, o Lusitânia, o Cine-Bar, o Café Avenida... o Avis...

- Bom, o Avis ainda existe, mas agora como restaurante – replicou o António Augusto.  E

acrescentou: mas vocês na Covilhã também viram fechar o Montalto, o Café Leitão, o Danúbio. Vá lá, ainda lá se mantém o Primor...

- Mas em Castelo Branco podemos encontrar-nos para uns bons petiscos na Marisqueira do Carlos, ou então nas tasquinhas... – disse o Eduardo. Temos a Tasca O Avião e a Tasca do Relógio (ou Tasca do Amândio, como é mais conhecida) – acrescentou o António Augusto.

Os tertulianos da Covilhã despediram-se dos amigos albicastrenses, ainda entraram no Palmeiras e depois dirigiram-se para o Fórum onde alguns desejavam fazer compras, principalmente calçado para as caminhadas. Aqui no Fórum, voltaram a encontrar o António Rosário Augusto, nome sobejamente conhecido dos albicastrenses e não só, pela sua envolvência em vários organismos chegando a ser vereador do Município de Castelo Branco. Andava acompanhado da esposa, a Isabelinha. Perguntámos-lhes por um restaurante perto e fomos dar ao Bifanas & Cª., no Parque Industrial. No final do almoço ainda passámos pela Padaria-Pastelaria Montalvão onde alguns voltaram a tomar café e adquiriram doces regionais. Aí encontraram o Luís Nisa, agente de seguros, que a todos nos veio cumprimentar. E casualmente surgiu o Eduardo Fernandes, major do Exército aposentado, e a esposa, a Deolinda, ele que esteve com o António Augusto no serviço militar em Timor.

E assim terminou o dia de convívio, em Castelo Branco, com as tertúlias covilhanenses, do Hotel Covilhã-Jardim, e do Celso”.

Muito mais haveria para contar mas ficará para outro ocasião, se a oportunidade surgir.

 

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

(In “Reconquista”, de 04-05-2023)

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