É grande o esforço que recai
sobre quem tem a responsabilidade de o deixar pronto em tempo útil. Mas existe
sempre o prazer de procurar encontrar meios para que este órgão trimestral não
falhe na sua periodicidade programada.
Cada vez temos mais o peso dos
anos sobre cada um de nós. No entanto, todo o trabalho, desde as pesquisas às formas
de encontrar uma alternativa para um certo lenitivo quando o desânimo nos importuna,
talvez seja uma forma de mantermos a parte cognitiva tão salutar quão possível
e evitar as suas disfunções.
O carinho no acolhimento deste
periódico é patente na avidez de muitos que o procuram logo que algum atraso se
verifica. É a fonte de informação consumada na necrologia dos nossos camaradas antigos
Combatentes. A nossa última homenagem individualizada que fica no perpétuo
registo da nossa informação escrita.
A juventude de hoje poderá
encontrar um ponto de reflexão do que foram os tempos de nos obrigarem a entrar
numa guerra fratricida, com as inegáveis nefastas consequências para a vida de
cada um e das suas famílias. Destas, dando
origem aos seus sofrimentos, dilaceradas pela eterna falta dos seus filhos,
pais ou maridos, arrancados do seu seio familiar. Foram prejudicadas fortemente
as suas vidas e profissões, com mortes, deficiências físicas permanentes e doenças
por stress pós-traumático. Vários casos são contados nas rubricas que vamos
publicando: “Conte-nos a sua História”.
Na revista “O Combatente”, de março de 2024, de que
é diretor o albicastrense e nosso prezado amigo – amigo de todos os antigos
Combatentes – também ele o Presidente da Liga dos Combatentes, Tenente-general
Joaquim Chito Rodrigues, no seu excelente editorial, reporta-se às idades dos
antigos Combatentes. De momentos até aos
dias de hoje. E não só, pelo que me
permito transcrever parcialmente algo da sua página, para que fique na mente de
quem queira refletir sobre o importante assunto das guerras coloniais que nos
envolveram durante 13 anos.
“Jovens e Veteranos”
“Contrastes da vida real
vêm-nos à memória. Parece que foi ontem. Aos gritos o povo português entoava: ‘Angola
é nossa’. Já lá vão 63 anos… Angola é hoje um país independente. Parece que
foi ontem. Aos gritos o povo português entoava ‘Grândola Vila Morena’… ‘Liberdade’. Há precisamente 50 anos… Portugal
é hoje um país democrático e comemora o cinquentenário do 25 de abril. Há uma
parte do povo português que foi ator decisivo nestes momentos importantes da
História de Portugal. Alguns deles deram a vida ao escrever essa História.
Outros sobreviveram, observam e vivem hoje, na generalidade, os últimos anos
das suas vidas.
De facto, quem em 1961 foi
chamado às fileiras das Forças Armadas, com os seus 20 anos para marchar para
Angola, tem hoje 83 anos. Quem com 20 anos, marchou em 1974, no final da guerra
ou fez e comemora o 25 de abril, tem hoje 70 anos. Por outro lado, quem decide
hoje em Portugal e nasceu com o 25 de abril, comemora os seus 50 anos, mas não
teve a vivência nem da ditadura, nem do PREC, recebendo nas mãos a Democracia.
Importa, pois, essa juventude ouvir o que os mais veteranos têm para contar e
para sugerir”.
Neste ano da graça de 2024 comemoram-se
também os prováveis 500 anos do nascimento de Luís Vaz de Camões. O maior poeta
nacional de Portugal considerado uma das maiores figuras da literatura
lusófona.
Pouco se sabe com certeza
sobre a sua vida. Diz-se que, por conta de um amor frustrado, autoexilou-se em
África, alistado como militar, onde perdeu o olho direito na batalha naval no Estreito
de Gibraltar. Enfrentou uma série de adversidades, foi preso várias vezes, combateu
ao lado das forças portuguesas e escreveu a sua obra mais conhecida, a epopeia
nacionalista Os Lusíadas.
“Enquanto viveu queixou-se
várias vezes de alegadas injustiças que sofrera, e da escassa atenção que a sua
obra recebia, mas pouco depois de falecer a sua poesia começou a ser
reconhecida como valiosa e de alto padrão estético por vários nomes importantes
da literatura europeia”.
Seu pai, Simão Vaz de Camões
casou com Ana de Sá e Macedo, de família fidalga, oriunda de Santarém. Seu
filho único, Luís Vaz de Camões, terá nascido em Lisboa, em 23 de janeiro de 1524,
baseando-se no soneto “O dia em que eu nasci moura e pereça” atribuído a
Camões, e na data de um eclipse ocorrido em 1525. Três anos depois, estando a
cidade ameaçada pela peste, a família mudou-se, acompanhando a corte de D. João
III, para Coimbra. Por isso, o seu local e data de nascimento são considerados
incertos. A sua família era pobre, mas sendo fidalga, pôde ser admitido e
estabelecer contactos intelectuais frutíferos na corte de D. João III,
iniciando-se na poesia.
Levava uma vida boémia,
frequentando tabernas e envolvendo-se em arruaças e relações amorosas
tumultuosas.
Os anos finais passados em Goa
foram entretidos com a poesia e com as atividades militares, onde sempre
demonstrou bravura, prontidão e lealdade à Coroa.
Depois de tantas peripécias,
finalizou Os Lusíadas, tendo-os apresentado em récita para o rei D.
Sebastião. O rei, ainda um adolescente, determinou que o trabalho fosse
publicado em 1572, concedendo também uma pequena pensão a “Luís de Camões,
cavaleiro fidalgo da minha Casa”, em paga pelos serviços prestados na
Índia.
Viveu seus anos finais num
quarto de uma casa próximo da Igreja de Santa Ana, num estado, segundo narra a
tradição, da mais indigna pobreza, mesmo assim ainda conseguiu manter o escravo
Jau que trouxera do oriente. Depois de ver-se amargurado pela derrota
portuguesa na Batalha de Alcácer-Quibir, onde desapareceu D. Sebastião, levando
Portugal a perder a sua independência para Espanha, adoeceu de peste, morrendo
em 10 de junho de 1580. Foi enterrado,
numa campa rasa, na Igreja de Santa Ana, ou cemitério dos pobres do mesmo
hospital. Depois do terramoto de 1755 que destruiu a maior parte de Lisboa,
foram feitas tentativas para se encontrar os despojos de Camões, todas
frustradas. A ossada que foi depositada em 1880 numa tumba do Mosteiro dos
Jerónimos é, com toda a probabilidade, de outra pessoa.
E assim termina a vida de Luís de
Camões, mas fica na imortalidade de Portugal e do Mundo, em que o seu linguajar
literário foi sempre reconhecido como erudito. Ele não escrevera para
ignorantes.
João de Jesus Nunes
(In “O Combatente da Estrela”, nº.
135 – JUL/2024)