Na senda do entusiasmo que temos
vindo a atingir em crescendo com a nossa publicação trimestral, foi solicitado
na última Assembleia Geral deste Núcleo da Covilhã, realizada no dia 9 de
março, que se mantivessem os quatro números anuais d’ O Combatente da Estrela, já que é o elo de ligação com os muitos
Associados radicados por todo o País.
Esta Assembleia Geral viu
aprovado por unanimidade o relatório das atividades do ano 2018 e o plano de
atividades para 2019, salientando-se com muito apreço o trabalho da atual
Direção do Núcleo, pois que o ano de 2018 foi um ano pleno de atividades, onde
sobressaíram as evocações do Centenário do Armistício.
Vem à presença dos leitores este
número, no mês de abril, ano em que se comemoram 45 anos do 25 de Abril, dia em
que quase todos nós, então ainda revestidos da nossa juventude, sentimos o
coração a palpitar de alegria, acordados de um sonho que parecia uma utopia.
Pena é que os ideais do Movimento
dos Capitães viessem ao longo de todos estes anos a ser adulterados e gerado em
muitos de nós dúvidas, indignações e perplexidades sobre atuações em várias
vertentes como, por exemplo, onde pondera a lentidão da justiça, e a sua
aplicação. Muitos se têm aproveitado da democracia para se envolverem no
locupletamento, à descarada, por vezes provindo de figuras das quais nem
pensávamos que por elas passasse tal conduta. Não olhando a meios para atingir
os seus fins, numa onda de populismo como agora é a palavra do momento político.
E foi a Revolução dos Cravos,
ainda que feita de pétalas de virtudes e defeitos, que veio terminar com a
Guerra nas Colónias – a Guerra do Ultramar – para onde muitos de nós por lá
passámos, e, daí, a vivência profunda dos variadíssimos Núcleos da Liga dos Combatentes.
Se muito já se falou, é bom que os
atuais antigos Combatentes, e não só, deixem para os novos, e os vindouros, as
memórias destes tempos, para que odeiem as guerras e se insuflam nos projetos
pela paz.
Aqui reproduzo as primeiras
notícias sobre o início desta Revolução do 25 de Abril, e as figuras que
emergiram como filhos daquela madrugada, que tiveram a coragem de enfrentar o
perigo, naquela altura em que eu tinha 28 anos, recordando essa célebre
quinta-feira de redobradas atenções.
Às quatro e tal da manhã daquele
dia de quinta-feira o Rádio Clube Português (RCP) acaba de transmitir o
primeiro comunicado do Movimento das Forças Armadas (MFA), o que motivou que
não mais conseguisse dormir quem o ouviu, tal como o fotógrafo Alfredo Cunha,
do jornal O Século, que foi quem
obteve as primeiras fotografias deste acontecimento, em Lisboa. Às seis da manhã
de 25 de Abril toca a campainha do jornalista Adelino Gomes, então com 29 anos
e secretário da redação da revista Seara
Nova, pensando que ia ser preso pela PIDE, quando a mulher o informou do
acontecimento. Às três horas e doze minutos, o RCP tinha pouca gente, dois
técnicos de som e Joaquim Furtado, que preparava o noticiário das quatro. Oito
militares entraram na estação. Objetivo: instalar ali o Posto de Comando do
MFA. Só nessa altura Joaquim Furtado tomou conhecimento da existência de um
movimento. Saiu do gabinete e no primeiro momento que encontrou apropriado
perguntou a um dos militares, que lhe disse, de forma muito breve, mas muito
clara, que se tratava de um golpe militar para depor o governo, fazer eleições
livres, libertar os presos políticos, acabar com a PIDE, com a censura e com a
guerra. Deu-lhe em síntese o programa do MFA.
Às quatro e vinte e seis, e não
às quatro como previa o plano militar de operações devido a um atraso na tomada
do Aeroporto de Lisboa, a voz segura de Joaquim Furtado anuncia: “Aqui Posto de
Comando do Movimento das Forças Armadas. As Forças Armadas portuguesas apelam a
todos os habitantes da cidade de Lisboa no sentido de recolherem a suas casas,
nas quais devem conservar-se com a máxima calma. Esperamos sinceramente que a
gravidade da hora que vivemos não seja tristemente assinalada por qualquer
acidente pessoal, para o que apelamos para o bom senso dos comandos das forças
militarizadas no sentido de serem evitados quaisquer confrontos com as Forças
Armadas. Tal confronto, além de desnecessário, só poderá conduzir a sérios
prejuízos individuais que enlutariam e criariam divisões entre os portugueses,
o que há que evitar a todo o custo. Não obstante a expressa preocupação de não
fazer correr a mínima gota de sangue de qualquer português, apelamos para o
espírito cívico e profissional da classe médica, esperando que acorram aos
hospitais, a fim de prestar a sua eventual colaboração, que se deseja,
sinceramente, desnecessária”.
E foi assim que outro filho da
madrugada, o médico João Camilo, interno do Hospital de São José, respondeu ao
apelo do MFA.
Quem também não esqueceu este dia
foi Helena Pato, na altura com 35 anos, dirigente estudantil, dirigente da CDE,
sindicalista e fundadora do Movimento Democrático das Mulheres, porque tinha o
seu marido de então, José Manuel Tengarinha, preso em Caxias. Tinha uma visita
marcada para a cadeia às onze da manhã do dia 25 de Abril, mas cerca das quatro
horas toca-lhe o telefone, e é o jornalista do Diário de Lisboa que lhe comunica que estavam em curso
movimentações militares para derrubar o regime, que iniciavam uma revolução e
uma das primeiras coisas que iriam fazer era libertar o marido e os restantes
presos políticos.
Na primeira conferência de
imprensa de Salgueiro Maia, o jornalista Adelino Gomes disse-lhe: “Não
desconhece que a GNR está muito bem armada, pois não?”, ao que o capitão
responde: “Temos todas as viaturas do Exército do nosso lado”. E há uma voz que
diz. “E temos o povo”. Era o alferes Carlos Beato, que foi presidente da Câmara
de Grândola.
E foi o desenrolar de muitos
outros filhos da madrugada que não cabem neste texto. Ficam as memórias.
(In "O Combatente da Estrela", nº. 114, de março de 2019)
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