19 de junho de 2019

A AMIZADE É UMA FESTA E EXPANDE-SE

Muitos encontros de amigos. Alguns, efémeros, outros eternizados. A idade, na caminhada das nossas vidas, não vai de parar, não se eclipsa, vai acrescentando tempo ao tempo.  Tantos a querer subir o Evereste, outros a preferirem as reminiscências extraídas do baú das suas memórias, dum tempo que o vento levou. Muitas memórias ficam. Por vezes quando menos se espera, surge alguém com o papel amarelecido das décadas das suas vidas. Daqui para a frente talvez se comece a pensar mais nos lustros que ainda possam restar. É giro! As horas prolongam-se. Perdemos a conta ao tempo.
O dia de Santo António é mítico. Com o Pedro Batista preparávamos o nosso habitual evento, que foi novamente sublinhado, com o título dado há década e meia – A Amizade é uma Festa – resultante do Homem de grande visão, lá para as bandas de Lisboa, em pleno espaço dum hotel repleto de ansiosos por conhecer os destinos das suas vidas profissionais, já que “santos da porta não fazem milagres”. Parte do grupo, os “apóstolos” escolhidos, memorizaram com o seu “pastor”, numa esplêndida quinta do Tortosendo, acontecimentos da vida que a todos uniu. Falou-se do passado, mas também dos dias de hoje e das perspetivas do amanhã.
As estórias da história do então livro publicado foi tema que não se deixou por mãos alheias, documento importante a correr todo o País. E, de facto, o postal das memórias, lá singularizava “Da CONFIANÇA à PROMESSA, para a CONCRETIZAÇÃO, dirigida ao ÊXITO”, com as datas e fotos assinaladas dos locais e intervenientes, terminando “E porque a Amizade é uma Festa!”
Inevitável é a despedida com uma esperança de que para o ano continua, se Deus quiser.
Conforme o título dado ao texto, a amizade expande-se. Falei no Pedro Batista, antigo Colega da atividade que abracei durante quatro décadas. Tomávamos um cafezinho numa esplanada do sul da Cidade. À mesma mesa estava outro amigo, Sérgio Gaspar Saraiva, companheiro da escrita neste periódico. Era o dia 11 de junho do ano da graça em curso. Esperávamos o seu primo, Arnaldo Saraiva, natural de Casegas, professor universitário, investigador científico e literário, ensaísta, cronista e poeta, doutorado pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Também leitor de Língua e Literatura Portuguesa e Brasileira na Universidade da Califórnia e professor convidado da Universidade de Paris (Sorbonne Nouvelle), tendo feito estudos superiores no Rio de Janeiro. Também colaborador da RTP e da Antena 1 e de várias publicações portuguesas e estrangeiras. Foi ainda distinguido com o Prémio Seiva (2017) na área das Letras.
A sua chegada para se sentar à nossa mesa tinha um fim em vista, singelo, carinhoso, afável, aproveitando uma breve pausa da sua viagem do Porto com destino ao Fundão onde tinha uma sua intervenção cultural. Daí que, depois, se vieram juntar ao grupo outros dois amigos: Fernando Paulouro Neves e Jorge Torrão. É que, a propósito dum texto publicado no Jornal do Fundão, sobre Casegas, onde eu vivi os primeiros anos de vida enquanto meu Pai ali exerceu a atividade de professor primário, nos distantes anos de 1945 a 1948, e vindo a saber que também fora professor do antigo Diretor do Notícias da Covilhã, Dr. José de Almeida Geraldes, quis memorizar algumas facetas daquela vivência entre professor e alunos. Assim, reconheceu perfeitamente, por uma foto daquele tempo, a figura do também seu antigo professor, José Martins Nunes.
E, se neste tempo ideal, o ditado mais se apropria ao de que “as palavras são como as cerejas”, só o compromisso que tinha já reduzido ao tempo que lhe restava para almoçar, o Professor Doutor Arnaldo Saraiva não ficou mais tempo, e, assim, de facto, a amizade é uma festa. Acabou por conhecer o filho do seu primeiro professor, e deu um abraço a um antigo colega do Seminário, assim como a outro seu conterrâneo, e outros mais que se juntavam, incluindo um grupo de antigas professoras que, do outro lado o avistando, algumas, suas antigas colegas da Universidade, o vieram cumprimentar. Uma delas, Maria do Céu Brás, antiga professora, sua conterrânea, portanto, caseguense, foi uma delas.

(In "Notícias da Covilhã", de  20-06-2019)

14 de junho de 2019

FOLHEANDO O NOTÍCIAS DA COVILHÃ


Estive lá no dia 24 de maio, na reinauguração das instalações na Rua Jornal Notícias da Covilhã, 65, donde o NC nunca deveria ter saído.
Efetivamente, não podia deixar de aceitar honroso convite do semanário onde, ao longo dos tempos, nele fui deixando algumas linhas escritas. E também a bondade dos seus Colaboradores em darem a conhecer algumas das minhas publicações e iniciativas.
Já lia o Notícias da Covilhã desde muito jovem, na então Biblioteca Municipal, ao Jardim Público, em cujo cabeçalho surgia como diretor o Padre José de Andrade, então também pároco de Nossa Senhora da Conceição (São Francisco) e a grande alma para a construção do Centro Cultural e Social da Covilhã.
Mas é em 29 de dezembro de 1963, que o meu saudoso amigo Cónego Dr. António Mendes Fernandes, passa a assumir a direção deste Semanário.
A caminho do final do ano 1964, trabalhando eu ali perto, como administrativo na Câmara Municipal, me desloquei à Rua de Santa Maria, 65 (nome com que então era designada esta rua) para entregar um meu primeiro artigo para publicação, se assim entendessem. E o mesmo foi acolhido, com a simpatia do Sr. Alfredo Nunes Pereira, da redação do Jornal.
Sob o título “A Covilhã precisa dum Museu”, pois não havia qualquer museu na cidade digno desse nome, viria a ser publicado em 14 de novembro desse ano, com uma nota final: “N.R.: Consoante pode ler na entrevista concedida a este jornal pelo Senhor Presidente da Câmara, logo que o novo Liceu esteja construído, ficará livre o prédio onde atualmente funciona na Rua Combatentes da Grande Guerra. Para aí passarão a Secção de Finanças e no prédio onde atualmente está instalada será o futuro Museu”.
Mas não seria assim tão depressa e, dentre outros registos sobre a cidade, que ia enviando, e seriam publicados, escolho a gazetilha ao “Soldado Desconhecido”, fruto de vandalismo que ao longo dos tempos foi tendo (“O Soldado Desconhecido”: ‘(…) partiram o cano à espingarda…’- 1965; “Espada, precisa-se” – 1991; ou “A réplica da espada de Nuno Álvares” – 2008).
Mas aos nossos 18 anos, também a então minha namorada, Maria Odete, seria objeto das páginas deste Semanário, pela sua ação no movimento operário católico. Em 15-01-1965: “Assembleia das Organizações Operárias (da Ação Católica, (…) Maria Odete, como jocista, usando da palavra, focando as lições da Quadra do Natal para a vida dos trabalhadores (…)”.
No mesmo ano, março de 1965, registava como preocupação “Para quando a conclusão da Avenida Salazar?...”; voltava à carga em 1983, com “Melhoramentos na Av. 25 de Abril”; e, em 1997, “o Elevador no Ramal de S. João de Malta”, qual mote para a construção do funicular?
Se em 1970 era noticiado o meu casamento com a Maria Odete, neste Semanário; já em 1972, com “Uma sóbria profissão: o Funcionalismo Público”, em tempos de ditadura, deixou pelos corredores da Câmara Municipal e da Repartição de Finanças, algum sussurro malicioso de quem queria ver a continuidade da conversa, à responsabilidade de quem se meteu na “embrulhada”, entre medos da censura.
1990 era o tempo de começar a falar dos Leões da Serra: “Sporting da Covilhã em naufrágio: Cidade exige um clube da I Divisão”, tema que se iria desenvolver por vários anos, não só com a publicação das quatro obras sobre esta coletividade serrana, como também no encalce de tudo o que favorecesse o clube de todos os covilhanenses e beirões, como “Memórias de um Clube e de uma Cidade” – 1998, data em que é comunicado pelo Notícias da Covilhã (NC) – 25-12-1998: “’Notícias da Covilhã’, passa a ser nome de rua. A partir de janeiro de 1999, data em que o NC completa 87 anos, a rua onde está instalado passa a chamar-se ‘Rua Jornal Notícias da Covilhã’”. Ainda sobre o Sporting Clube da Covilhã (SCC): “Sporting Clube da Covilhã – Terceira Divisão nunca mais!” – 1994; “Os Timoneiros do SCC na Primeira Divisão” – 1997”; “Memórias Esquecidas” – 2001; “Os 82 anos dos Leões da Serra” – 2005, entre muitos outros, salientando alguns dos que passaram para além do mundo dos vivos.
À Biblioteca Municipal foram dedicados vários textos: “Biblioteca Municipal: 82 Anos de História” – 1999; e, mais recentemente, sobre o seu Centenário.
Agradeço terem-me concedido o espaço de uma página inteira, entre outros: “A Escola Industrial mais antiga do País completou 110 anos da sua fundação” – 1994; “ Os 830 Anos do 1.º Foral da Covilhã” – 2016; “A Expedição Científica à Serra da Estrela foi há 135 anos” – 2016; “Padroeira da Covilhã” – 2016; “As Conferências de São Vicente de Paulo na Diocese da Guarda” – 2017.
Tive o prazer de, neste Semanário, evocar figuras covilhanenses ou que à Covilhã se dedicaram de corpo e alma: Padre José Domingues Carreto, António Santos Taborda, Maria Ivone Manteigueiro Vairinho, Cónego José Geraldes, Ernesto Cruz, Dr. José Ranito Baltazar, Dr. Manuel de Castro Martins, Alexandre Aibéo, entre muitos outros.
Também várias coletividades tiveram o espaço das minhas memórias no NC. Outros assuntos mais candentes na sua oportunidade tiveram leitores atentos: “Responsáveis pela Irresponsabilidade” – 1998; “Quando o peão ‘atropela’ o veículo” – 1999; “Uma nódoa no fato de gala” – 1998; “A Quinta das Celebridades” – 2004; “O Polvo” – 2005; “Assembleia de ratos” – 2005; “Da promiscuidade à corrupção” – 2006; “Fugitivos” – 2008, e muitos outros até aos dias de hoje.
Se tive o prazer de escrever sobre as gentes covilhanenses ou à mesma radicadas (“Os Grandes Covilhanenses” – 2007; “O Repolho” – 2007; “A Mulher na Sociedade Covilhanense” – 2008; “O Homem que nasceu para as flores” – 2009; “A Vocação e a Causa – 50 anos (Padre Fernando Brito) – 2009); também outros temas me traziam alegria quando alguém se aproximava de mim, me telefonava ou enviava mensagens,  fazendo referência às crónicas publicadas com interesse nas mesmas. E outros, que há muito não nos víamos, aquando dum encontro, referiam-me: “Bom, eu não o vejo pessoalmente mas vejo-o com regularidade no Notícias da Covilhã…”. E isto a partir das então “Crónicas da Rua Direita”, iniciadas em abril de 2003.
Teria muito ainda para contar, mas vou só dar registo das referências às efemérides do NC: “Nove décadas de ‘braço dado’ com os interesses da cidade” – 2003; “Mais perto do centenário” – 2006; “A caminho do centenário” – 2009; “NC em frente” – 2010; “Quase nos 100 anos” – 2011; “O Jornal e o direito de opinar” – 2013; “Diretores de um jornal” – 2014.
Os meus sentimentos de gratidão e alegria pelo Notícias da Covilhã, excedem-se no atrevimento de ocupar este precioso espaço, na menção de alguns títulos escritos neste Semanário, gotejo de muitos mais, que de outros periódicos, com textos diferentes, aqui não têm cabimento.
Parabéns, mais uma vez, ao NC e um fraternal abraço aos estimados obreiros do mesmo.

João de Jesus Nunes                                                                                           jjnunes6200@gmail.com

12 de junho de 2019

A DOR DE CABEÇA OU DE BARRIGA DOS EXAMES


Não era este o tema que tinha inicialmente previsto para a crónica desta semana. Mas, recordando o acompanhamento que tivemos com os filhos até ao ensino universitário e já com os netos a viverem os momentos do secundário e até mesmo o superior, ficam as marcas das reminiscências dos avós que já passaram a fasquia dos 70 anos.
Os tempos doutrora são incomparáveis aos dias de hoje, em todos os aspetos, desde o habitacional ao social, para não referir outros básicos, como o económico.
Se bem que com exceções como manda a regra, pelo menos para quem se embrenha nos meios solidários, os jovens de hoje não têm razão para não disputarem os valores da vida no empenhamento do saber até à opção vocacional.
As famílias já não são iletradas, embora se vão dando alguns pontapés na gramática. Certo é que os hábitos de leitura são escassos e falar de cultura é dum enfado confrangedor para muitas das pessoas, onde os jornais desportivos são os apelativos e o sensacionalismo do Correio da Manhã não deixa de atrair.
Hoje já não existe uma casa de habitação sem uma casa de banho, o que não acontecia no meu tempo de estudante, duma forma generalizada. Surgida a época dos exames, com o calor dentro das casas, agravadas pelo sarilho da barulheira de quem tinha mais irmãos, restava-nos pegar nos livros pela manhazinha e procurar uma sombra, só ou acompanhado, para aí ser o local mais sossegado e inspirador para o estudo, as revisões da matéria para as várias disciplinas. Era no Jardim Municipal, nas escadas ou bancos do Monumento de Nossa Senhora da Conceição, algumas sombras de oliveiras da então Avenida Salazar (hoje Avenida 25 de Abril), antes de se terem lá erguido algumas vivendas, e por aí fora. Não menos agradável era o ambiente acolhedor da antiga Biblioteca Municipal, ao Jardim. E não havia automóveis para a deslocação, mas tão só o caminhar com os livros debaixo do braço.
Certo é que, ainda que paradoxalmente, havia um pouco mais de propiciação para se estudar (nessa altura em que decorar era a forma de ensino adequada ao tempo), já que não havia os meios de hoje que são objeto de distração mesmo em tempo de estudo: televisão, telemóveis, redes sociais, e por aí fora…
Não havia dinheiro para uma merenda quotidiana, um sumo ou um gelado do Cardona, pelo que, na rua, a água duma fonte era bendita.
E os cérebros lá se tinham de esforçar sem o combustível necessário para o manter saudável. Ainda me recordo de, neste tempo então mais abundante de fruta, as mãezinhas se preocupavam em fazer um esforço adicional à aquisição das novidades, como os figos, as cerejas ou outra cobiçada, “porque se estava na altura dos exames” e havia que não deixar chegar algum fastio. Cérebros com carburante reforçado…
Se a Física e a Química, o Direito Comercial e a Economia Política eram as disciplinas que mais me levavam a retirar-me para uma concentração no estudo, não me posso esquecer que, duma transição do mesmo curso, que frequentava durante o dia, para o noturno, que obrigava a mais um ano, e por forma a não ficar deste modo com uma disciplina em atraso, vi-me forçado a esse então famigerado exame de transição, ter que gramar, durante todas as férias do verão, ao invés de aliviar a carga, estudar o Segundo Volume da História Universal, sem explicadores, naquela de “seja o que Deus quiser”. E, vai daí, a matéria dessa disciplina de um ano letivo completo marrei-a em dois meses!...
Pois é, levo com o exame de História e também com outro de Francês, que, para esse efeito de transição penso que eram só provas orais, e, por obra e graça do Divino Espírito Santo, saí-me bem perante o júri constituído pelos falecidos professores Drª. Maria Irene Portela e Dr. José de Oliveira Dias. Corria o ano da graça de 1963.
Arrumavam-se os livros e cadernos numa pasta, onde não havia secretárias em casa como nos dias de hoje, mormente quando há vários irmãos. Não se folheavam fotocópias nem havia marcadores fluorescentes ou post-it coloridos, porque não havia mesmo (os professores utilizavam os stencils da Escola para os testes).
Querer tirar dúvidas com um colega ao telefone não era viável pois quase nenhum tinha este aparelho (só em casas mais abastadas) e, telemóvel, ainda era inexistente, a léguas de distância. Quando muito, ia-se a pé e batia-se à porta do colega, o qual, por vezes, morava longe. Era uma carga de nervos quando parecia que já todos estavam mais adiantados no estudo ou, então, que todos estavam mais desesperados do que eu.
Para o exame final, volvidos três anos, lá combinámos, com o Manuel José Torrão, o falecido Tomé, do BNU, que foi viver para Abrantes, irmos trocar impressões e estudar para casa do então genro do José Vicente Milhano, por sua sugestão, mas que vivia longe, lá para as bandas do Campos Melo. Já tarde, esgotados, depois de um dia de trabalho e perto da meia-noite, vinha-me pôr a casa no seu Citroen boca de sapo.
É que, os nossos professores de Contabilidade, em final de ano, foram forçados a interromper as aulas. Primeiro, foi o Dr. Fernando Carneiro, que era chamado pela segunda vez para o serviço militar, para depois ser mobilizado para o Ultramar; depois foi um professor novo que teve igual sorte, pelo que, quase em vésperas do último exame – Aptidão Profissional – vem salvar a contenda o Dr. Duarte Simões. Do júri constava então também o industrial de lanifícios, Dr. Fernando Lopes Alçada.
Nessa altura eu fumava e o cinto das calças já reduzia mais um furo.
Agora pergunto a mim próprio, por que me deu na real gana de lembrar pecados velhos, ou algo nostálgico, em vez de falar no desplante de Joe Berardo; que em 45 anos, cinco Presidentes da República Portuguesa entregaram 9477 comendas; que a “coisa” pode piorar, segundo a versão de Rui Rio; que foi há 100 anos que Einstein se tornou uma popstar; que a Europa está sem ilusões; ou a doença do capitalismo; a ignóbil farsa do SIRESP; ou que surge a interrogação se a Theresa May não será o mal menor?
Bom, tudo isto seria diferente, mas não era a mesma coisa, pois não?

(In Jornal fórum Covilhã", de 12-06-2019)

5 de junho de 2019

ENTRE AS PÁGINAS ROMANESCAS DE UM LIVRO E O JORNAL “O OLHANENSE”


A primeira pausa após o almoço daquela sexta-feira. (1)
- Bom, meus caríssimos amigos e companheiros destas jornadas seguradoras, tenho a comunicar-vos uma notícia que ontem chegou a minha casa, que já poderia ser transmitida durante o almoço, mas custou-me imenso, até parece que se me travou a língua!... – Disse o Benedito. E manteve-se durante algum silêncio.
Todos ficaram atónitos, tanto mais que ninguém deduziu que viria a anunciar o nascimento do primeiro filho, face à idade do casal… Mas esperavam que alguém se pronunciasse, olhando uns para os outros.
Outros pensaram: aqui há gato!...
Até que o Benedito continuou:
- A Sónia recebeu um convite para passar a ser a maestrina de duas bandas filarmónicas algarvias, entre as quais a Banda Musical de Tavira, onde eu estive algum tempo no serviço militar…  Certamente a nossa vida vai mudar de Leiria para terras algarvias…  Pensamos nós!...
- Então qual é o problema? – disse o Rosas. E acrescentou: Primeiro a vossa vida, e depois o grupo Tertuliano. Paciência!...
- Claro que sim!... opinou também a Faustina. – É pena que ainda há pouco tempo começámos a integrar esta tertúlia que está a ser interessantíssima, mas a vida é mesmo assim!...
- Então para que não percamos mais tempo, vamos continuar com os nossos trabalhinhos – disse o Benedito – e depois já desenvolvo mais a conversa a meu respeito.
Na segunda pausa após o almoço desta sexta-feira, já a tornar-se de certo modo agitada, o Benedito tenta acalmar os companheiros tertulianos:
- Ora bem, na sequência do que vos transmiti há pouco, só lá para junho é que vou deixar Leiria, até porque ainda temos de acertar pormenores com o trabalho da Sónia, e a nossa deslocação para lá. Portanto, até lá ainda podemos fazer muita coisa…
No Algarve, para além da Sociedade da Banda Musical de Tavira, também foi abordada pela Banda Filarmónica Moncarachense 1.º de Dezembro e pela Banda Musical Castromarinense.
Disse o Rosas: - Alguém há de tomar a liderança do grupo para prosseguir com outro tema cultural. Pelo menos, ficaram as raízes do que tem sido desenvolvido ao longo pouco mais de uma semana!
- Não vai morrer, não senhor!... Deixemos lá o amigo Benedito e a Sónia resolverem a sua vida! – disse o Pedro. – Não esqueçais que as viagens estão de pé!...
Chegou finalmente aquela quinta-feira, dia 4 de maio do ano da graça de 2017. Bem cedo, ainda não eram nove horas e já começavam a chegar os primeiros tertulianos à Adega Regional.
Numa breve pausa, a Milu, que gosta muito de história, avançou com a pergunta:
- Não foi em 4 de agosto de 1578 que se deu a Batalha de Alcácer Quibir?
- Sei que foi em 1578, mas não me recordo da data completa… Mas porquê? – Resposta e pergunta da Sónia.
- É que me chamou à atenção o facto de o Benedito ter referido há pouco que… deixa cá ver…o cargo de escrivão de seguros foi criado por carta régia de D. João III, datada de outubro de 1579. Ora bem… mas a outra… ah! Já sei… disse que a criação do cargo de corretor de seguros coube a D. Sebastião, por carta régia de fevereiro de 1578. Logo, seriam seis meses antes de perder a vida naquela maldita batalha!... – Respondeu a Milu.
- Pois bem, hoje terminamos definitivamente esta tertúlia sob o tema que viemos a desenvolver – referiu o Benedito. Já combinei com a Sónia para que a viagem projetada para o Algarve, de dois dias, com uma pernoita, para celebrar o encerramento desta tertúlia, ainda que efémera, será no hotel Vila Gale Ampalius, em Vilamoura. Estivemos indecisos entre este e o Dom Pedro Martins..., escolhemos o primeiro porque está localizado a poucos metros da Praia da Marina e da Marina de Vila Moura.
Depois, as refeições logo se verão, uma vez que vamos visitar várias localidades do Algarve. É no dia 27 de maio, às 7h30 da manhã, sábado, porque o Benedito no dia 25 tem o já agendado encontro de futebol de Veteranos entre o Sport Clube Leiria e Marrazes e o Grupo Recreativo Amigos da Paz/Pousos.
- Então vamos juntar-nos no mesmo local – Jardim Luís de Camões? – perguntou o Licínio.
Depois de algumas trocas de impressões sobre o Algarve onde, uns há muito tempo que lá não iam, outros que estiveram lá o ano passado, e outros, como o Benedito e o Marques, estiveram durante a recruta no CISMI, em Tavira (o Benedito), e a especialidade (o Marques), chegou finalmente o ansiado dia. Eram oito horas e iniciaram a viagem a caminho do Algarve, destino Vilamoura, sendo feito algumas paragens pelo caminho. As máquinas fotográficas foram então substituídas pelos smartphones, pelo que se iam tirando umas fotos pelas paragens durante o trajeto. Eram aproximadamente 368 Km. Seguiram pela A1 e quando na IC 10 viram a placa Algarve/Évora/Coruche/Almeirim, saíram em Almeirim na tentativa de irem comer a sopa de pedra. A muito custo lá conseguiram uma mesa. Acautelaram-se nas bebidas…
Uma pequena paragem na área de serviço de Alcácer do Sal e aí se direcionaram a caminho de Vilamoura. Ao passarem por Poço de Boliqueime e Fonte de Boliqueime alguns lembraram-se que Boliqueime é a terra de Cavaco Silva.
Chegados ao hotel, depois do check-in e de tudo arrumado, foi altura de darem uma voltinha pelas cidades mais próximas…  Foram até Portimão, ficando o passeio pela marina de Vilamoura para a noite.
- Está ali um café – apontou o Alberto Ferreira. Entraram então no Café Casa Inglesa. O Rosas comprou o jornal O Olhanense, onde vinha sempre uma crónica do antigo camarada da Covilhã, do RAL 4, que estava à venda à porta do Café Nacional.
- Bom, meus amigos!... Está na hora de jantar, ou vocês não querem jantar?
- Sugeria que fossemos a Albufeira porque lá há animação à noite – disse o Pedro. Todos concordaram.
Entraram no Café Ameixial. Cá fora, quatro mexicanos tocavam os seus instrumentos exóticos. Depois, entraram numa esplanada e ali, ao ar livre, perto dum palco onde atuavam alguns artistas populares, jantaram. Quase todos preferiram um robalo escalado, exceto a Milu e o Pedro que optaram por cavala.
Ainda passaram pelo Café Pastelaria Riviera, tendo recolhido a Vilamoura.
- Amanhã podemos almoçar aqui no Restaurante do Chino e do Figo!... – disse o Rosas, apontando para o letreiro “Café Figo e China Lda”, ainda com muita gente.
Tomado o pequeno-almoço no hotel, quiseram ainda entrar no Café do Chino, e aí decidirem aproveitar o tempo, visitando outras cidades algarvias. Deram um salto a Lagos, entraram no Café Taquelim, e a Sónia quis comprar uns bolos vistos no Café Mildoces.
- Bom, agora voltamos para trás – disse o Rosas. E lá passaram novamente por Portimão, viram a Praia da Rocha  e a direção agora Faro, Olhão e Tavira.
A próxima viagem para uma visita turística foi a cidade de Faro, capital do Algarve. Uma pausa no Café Aliança, para umas minis pois as gargantas já estavam a precisar. A Milu e a Anabela beberam água natural sem gás, já que as restantes companheiras optaram por sumos frescos.
O Pedro perguntou onde era o Café Pastelaria Gardy pois estivera lá, como empregado de mesa, um seu antigo camarada do Ultramar.
Em Faro não houve grandes demoras, já que agora estavam na peugada de Olhão, Chegados a Olhão, logo encontraram onde matar a sede – Café Chaminé. Havia também que descansar as pernas.
Deram umas voltas pela cidade e entraram no Café O Pátio onde consumiram algumas bebidas.
Entretanto, o Benedito ouviu de dois compadres, em voz baixa, mas ali perto da mesa onde se encontrava – assim se chamavam um ao outro… –, a leitura de um artigo que vinha no jornal O Olhanense e que dizia assim: “O Lameiro do Chão Verde”. (2)
- Bom, meus amigos, vamos a Tavira porque eu já lá fico e vocês têm de regressar ainda a Leiria!... – Ordenou o Benedito.
Todos se ergueram mais rápido, entraram nos respetivos automóveis e… rumo a Tavira, onde o Marques começou logo por dizer que gostava de matar saudades, passando na ponte antiga sobre o Rio Gilão.
- Não te lembras das salinas, onde nos levavam para os exercícios, que saíamos de lá cheios de lama, e depois quando chegávamos ao quartel para tomar banho cortavam a água e ficávamos todos sujos? Tínhamos de nos desenrascar… que era ação psicológica!... – continuou a insistir o Marques, que agora queria ir ver o CISMI e a Atalaia.
Bom, dirigiram-se ao CISMI – Centro de Instrução de Sargentos Milicianos de Infantaria (que agora mudou o nome para Regimento de Infantaria n.º 1), também conhecido como Quartel da Atalaia. Pediram autorização de passar da porta de armas, acompanhado por um militar que estava de serviço. Ainda existe a G3 que o militar deixou que nela pegassem. Bom, o Campo da Atalaia, onde se fazia a instrução militar, esse já lá não estava, foi aí construída uma urbanização.
Entretanto, recordando algumas pessoas castiças, que acompanhavam os instruendos do CSM durante a instrução militar, para vender refrigerantes, a UCAL, chocolates ou bolachas, nos intervalos (como a Ti Almerinda), o Marques, mais uma vez, recordou e disse:
- Gostaria de vos ler um artigo do meu ex-camarada da Covilhã, durante o tempo em que esteve aqui. E, puxando pelo smartphone, pesquisou e passou a ler: “Boliqueime”.
E foi o regresso a Leiria.

(1)     In “O Documento Antigo – Uma Outra Forma e Ver os Seguros”, de João de Jesus Nunes
(2)     “O Lameiro do Chão Verde”, por Goreti Costa, in ‘O Olhanense’, de 15-04-2018.

(In Jornal "O Olhanense", de 01-06-2019)