Do centro da China para a
Europa, parte a dona Crise. Sua indumentária de cambiantes virulentas bate à
porta do nosso país. Estávamos em março do famigerado ano. O pretérito. Primeira
onda de choque muito dura. A começar de mansinho. Vítimas mortais que hoje
aumentam drasticamente. Efeitos muito negativos na atividade económica
imediatos. Do primeiro estado de emergência surgem renovações. Alguns ainda
acreditavam que se tratava duma gripezinha. O nosso país não é aquele recanto à
beira mar plantado imune. Como já se aperceberam os incrédulos. Os teimosos. Outras
frases de responsáveis deste país já lá vão: o disse que não disse do “milagre
português”, de Marcelo, na primeira vaga, ou, antes, logo no início, “não há
grande probabilidade de chegar um vírus destes a Portugal”, de Graça Freitas.
Adiante, porque, segundo o provérbio, águas passadas não movem moinhos.
Controlo de propagação do
vírus. Fez-nos pensar que o pior já teria passado. Mas, no final do verão, uma
segunda vaga. Aumento significativo do número de vítimas. Agravamento das
dificuldades da economia. Esperança para 2021 está na vacinação. A Ciência faz
a descoberta em tempo recorde.
O regresso à normalidade ainda
é uma luz ténue ao fundo do túnel. Luz que começa, de quando em vez, a ficar um
pouco mais distante. O surgimento de nova variante deste vírus chega a
Portugal. E esta estirpe faz detetar já 16 casos no Continente e 18 na Madeira.
Estamos numa terceira vaga. Ou a caminho da mesma.
Bicho-de-sete-cabeças para uns.
Outros a andarem com o credo na boca. No início da pandemia pelo novo
coronavírus, alguns observadores e políticos começam a considerar que estávamos
perante um “cisne negro”. Na definição de Nicholas Taleb. Mas termina n’“um
rinoceronte cinza”, que é uma ameaça altamente provável, de alto impacto, mas
negligenciada, na expressão da analista de risco norte-americana Michele
Wucker.
O ano que muitos querem
esquecer, sentou mais de 350 mil portugueses por dia em frente à TV. A maioria
a pagar para ver conteúdos no pequeno ecrã. Há 100 anos que não se morria tanto
em Portugal.
O mesmo ano que agora deixamos
para trás ficará para sempre na História. Quer queiramos quer não. Pela
pandemia e pelo que ela escreveu nas nossas vidas.
Sem parar demasiado no tempo,
temos o Brexit resolvido. Vamos ver os seus próximos capítulos. É o novo
normal para europeus e britânicos. A partir do primeiro dia do primeiro mês do
ano. Com impacto em áreas como o turismo, trabalho e estudos.
O novo ano começa com a quarta
presidência portuguesa do Conselho da União Europeia.
Ainda sobre a passagem para o
ano novo: fazemos sempre planos, promessas, formulamos desejos, sonhos – aquela
esperança. Os efeitos brutais verificados na economia e na sociedade
resultantes da pandemia de covid-19 levou-nos a uma promessa. Entre o medo daquela
maldição de março a dezembro. Passaríamos a ser melhores pessoas. Então nos
direcionamos em ondas de solidariedade. Assistimos e participámos nas mesmas. No
âmago dos nossos sentimentos houve também aquela comoção. O notável esforço dos
profissionais de saúde a tentar salvar homens e mulheres, de qualquer idade,
nos cuidados intensivos dos hospitais, infetados pelo coronavírus. Por vezes
num cenário quase dantesco. Num esforço hercúleo.
Recomendações do Presidente da
República e do Primeiro Ministro para o rigoroso cumprimento das regras
sanitárias foram persistentes. Mas muito também por via da Ministra da Saúde e
da Diretora-Geral de Saúde. Igualmente de especialistas nas áreas da saúde. Mormente
da infeciologia. E não só. Diariamente
nos chega a informação dos números dos falecidos, infetados e recuperados. Do
país e do mundo. Pelas televisões, comunicação social, redes sociais.
Conhecemos os casos da nossa região, cidade, vila ou aldeia. Lares e por aí
fora.
Os desejos da maioria de nós são
previsíveis na ansiedade do ano 2021. Pois que traga o fim da pandemia, vacinas
para todos, recuperação económica, emprego e menos desigualdades. E, no topo da
pirâmide, a saúde. Estamos fartos do “novo normal”, das máscaras, dos
desinfetantes, dos riscos de contágio.
No início da pandemia seguimos
as orientações públicas. Que em Portugal e noutros países foram sendo
transmitidas para prevenir a segunda vaga. Mas alguns, talvez muitos, fizeram
ouvidos de mercador. Não ligaram patavina às recomendações. Só colocavam a
máscara (e muitas vezes com o nariz destapado) nos locais em que a isso eram
obrigados. O distanciamento não era respeitado. Na dedução errónea, talvez
estúpida, de que só aos outros poderia suceder o mal. O resultado é que, alguns
desses, já estão fora do mundo dos vivos. Muitos acreditámos que depois destes primeiros
tempos de pandemia seríamos melhores cidadãos. E menos egoístas. Alguns até
acreditaram no slogan “Vamos ficar todos bem”. A certa altura até parecia que a
solidariedade e o civismo tinham vencido a doença virulenta.
Veio a segunda vaga. Pós-verão.
Alguns comportamentos mudaram para pior. Outros mantiveram o seu comportamento
egocentrista. Como se nada fosse com eles. Alguns de ideias retrógradas. Não
perceberam. Ou não quiseram perceber a importância de seguir normas. Ainda que
não concordando com tudo. O dever social e comunitário seria o de fazer tudo
para reduzir o número de mortes de pessoas atingidas por um inimigo invisível.
O resultado, pensamos, é a terceira vaga aí à porta.
Quando saio de casa, a
primeira coisa que encontro são pessoas sem máscara na rua. Cruzando-se umas
com as outras. Ou conversando como se nada existisse. Sem guardarem distâncias
regulamentares nas filas para as lojas. Para já não falar noutros locais. Por
exemplo, onde não há desinfeções do material utilizado pelos utentes. Isto porque, não havendo fiscalizações pelos
serviços competentes, com atuações profícuas, como a DGS, ASAE, PSP ou GNR, em
muitos casos tudo gira à balda. Utilizando
o calão. Impensável que seja uma ditadura. Mas tão só no rigoroso zelo pela
saúde de todos nós. Já que persistem os infratores.
Duvidamos de que o
comportamento por efeito da pandemia tenha melhorado. Sobretudo naqueles homens
e mulheres cujo caráter egoísta se intensificou. E não só aos da brigada do
reumático.
Não se trata de pessimismo. Mas
não é demais acentuar que há uma pandemia para vencer. E todas as consequências
adversas que a mesma originou. Os que não quiserem colaborar, pelo que já
sobejamente foi referido, também ficarão sujeitos à rejeição das suas visões
egoístas. Por se preocuparem somente consigo próprios. E não olhando em redor
para apoiar corajosamente todos os que lutam para manter o emprego, o sustento,
o negócio. E, acima de tudo, o seu maior bem que é a saúde.
(In Jornal Quinzenário "O Olhanense", de 15-01-2021)
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