Ainda faltam quatro anos e quase
dois meses para completarmos o primeiro quarto do século XXI. Ele que começou
mal em todo o mundo. Memórias terríveis certamente em muitos habitantes deste
planeta.
No meio deste mar de problemas,
Portugal foi poupado a muitas desgraças, como o terrorismo. Tivemos também a
nossa quota-parte nas contrariedades. Para além de incêndios florestais como
nunca se tinham visto, foram duas décadas de fraco crescimento económico,
partilhando, com excesso, as crises financeiras e de austeridade. Conhecemos o
maior embuste financeiro da história deste país.
Mas viria a surgir o “milagre”
económico português com Mário Centeno, ministro das Finanças, a colocar o nosso
País a crescer acima da média europeia nos últimos anos, com o défice público
reduzido a mínimos, a superar 2014 com 7% do PIB e a fechar 2018 em apenas
0,4%. O reconhecimento internacional é indubitável, com as três principais
agências de classificação a retirarem o país do nível “lixo”. Foi o homem que
chegou a um partido que fora corrido do poder por causa de uma bancarrota, e
que enquanto estava na oposição atacava “a obsessão do défice” dos outros, mas
que, regressado ao Governo, chegou ao ponto de espalhar pelo país cartazes que
celebravam “o défice mais baixo da história da democracia” e de exultar com o
primeiro superavit do regime.
A pandemia, entretanto, veio
manchar este desanuviar económico do país que, tal como por quase toda a
Europa, viria a ver uma luz sorrir com a anunciada “bazuca” europeia, por via
do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
Assim, a crónica de Vasco Pulido Valente, sob o título “A geringonça”,
datada de 31 de agosto de 2014, publicada no Público, aplicada com o
sentido depreciativo ao PS de António José Seguro, viria com este termo a ganhar,
nacional e internacionalmente, um sentido positivo e elogioso. Neste paradoxo, a
aliança parlamentar estabelecida entre o líder do PS, António Costa, e o BE, o
PCP e o PEV, permitir-lhe-ia governar até ao chumbo do orçamento no passado dia
27 de outubro.
Com a insólita, ou talvez não, não aprovação
do Orçamento de Estado para 2022, e consequente dissolução da Assembleia da
República e marcação de eleições antecipadas, surgem muitas análises, muitos
comentários, sendo certo que o Partido Comunista, acusado de ter alinhado ao
lado da direita, consequentemente ao lado do CHEGA, direita radical, “vai pagar
caríssimo”, na opinião do sociólogo António Barreto. “O voto contra, ao lado da
direita, é dizer que a direita tem razão quando quer cortar salários”. Já
António Costa antevê uma vitória de Pirro para a direita.
Com o Presidente da República no seu labirinto
a tentar encontrar uma solução e a esquerda a mostrar receios, com a evidente fisionomia
de Jerónimo de Sousa na sua expressão recordando que “nada obriga” à dissolução
do Parlamento, naquele provérbio de “burro morto, cevada ao rabo”, também com a
entrevista de Vasco Cardoso, membro da comissão política do PCP, dada a Rosália
Amorim, diretora do Diário de Notícias conjuntamente com
Pedro Cruz, da TSF, foi direcionada no mesmo sentido. Os receios
persistem.
Já a direita também não está melhor, com a
luta interna para a liderança das forças do CDS-PP e do PSD, com os
protagonistas Francisco Rodrigues dos Santos e Nuno Melo, pela banda do CDS; e
Rui Rio e Paulo Rangel, nas hostes do PSD.
Vamos ver se esta embrulhada em que os
partidos da esquerda se quiseram envolver contra o Governo, não lhes vai
resultar “num tiro a sair pela culatra”.
Jorge Almeida Fernandes, in Público, sobre a
inesperada rutura da “geringonça”, mas que também não pode ser considerada uma
surpresa, analisa o PCP na pessoa de Jerónimo de Sousa como “os restos do muro
de Berlim que voltaram a erguer-se” e que o PCP regressa ao estilo tribunício.
Nesta conduta algo inédita, a posicionarem-se
para a fotografia, orgulhosas, tanto a esquerda à esquerda do PS, como a direita,
com honrosas exceções para o PAN e as duas deputadas não inscritas, vamos ver
se não vai resultar numa hecatombe política sobre aquelas forças.
E, depois já não vale a pena chorar sobre o
leite derramado. Sim, Quo Vadis, Esquerda! Direita! Volver!?
(In "Jornal fórum Covilhã", de 17-11-2021)
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