Ao longo dos tempos sempre
houve quem se revelasse na maldade sob os ventos da história.
Hoje, depois de termos vivido
num ambiente de paz reinante na generalidade do planeta, conforme já me referi
noutro artigo, mormente na Europa, embora com ventos e marés pelo caminho, desde
a Segunda Grande Guerra, eis que um malandro, sanguinário, agita ferozmente a
invasão de um país soberano – a Ucrânia –, não se importando de lançar a guerra
no mundo, declinando a paz. Isto já estamos fartos de saber diariamente.
Em Portugal superou-se, em 24
de março do corrente ano, por um dia, o tempo vivido em ditadura.
A guerra passou a ser o
fantasma e uma realidade na Europa. E as palavras: promessa, garantia, confiança,
contrato de boas intenções, acordo oficial, foram substituídas por uma única
que dá pelo funesto nome de traição.
E é nesta base que memorizo,
por analogia, outro “Putin” de outrora, selecionado dentre muitos. Sérvio
Sulpício Galba, em 151 a. C. recebeu o governo da Hispânia Ulterior como pretor,
continuando a Guerra Lusitana. Os lusitanos causaram a Galba enormes perdas. Segundo
os cronistas, na primavera de 150 a. C., Galba invadiu novamente a Lusitânia e os
Romanos arrasaram o território. Quando os Lusitanos enviaram uma embaixada
reclamando a violação do tratado que haviam firmado com o pretor Marco Atílio Serrano,
e reiterando o seu propósito de manterem os termos de paz prometida por eles,
Galba recebeu-os amavelmente. Prometeu-lhes terras férteis onde se poderiam
estabelecer com as suas famílias, sob a proteção de Roma, se permanecessem
leais. Acudiram cerca de 30 000 lusitanos solicitando o cumprimento dessa
promessa. Galba, repartiu-os em três acampamentos e exigiu-lhes que entregassem
as armas em sinal de amizade. Logo que tal aconteceu, rodeou-os com todo o seu
exército e ordenou um ataque. Cerca de 9000 foram passados pela espada e
20 000 foram capturados e vendidos como escravos aos Gálias. Somente uns
poucos conseguiram escapar, incluindo Viriato, que, anos depois, se vingaria
por esta traição romana, em vários combates que ganharia.
Mas a diferença de forças em
combate ia-se tornando em tarefas difíceis. E já Táutalo, o grande amigo de
Viriato reconhecia que tinham pouco mais de três mil cavaleiros e dois mil
homens a pé, contra mais de 30 mil romanos, em várias frentes de ataque.
As palavras de ordem do líder era
“Temos de negociar”. Era evidente que lutar seria um suicídio. Saíram todos em
silêncio, mantendo-se apenas Viriato, Táutalo , Audax, Ditalco e Minuro.
Os romanos Cepião e Lenate estavam
em Tucci e Audaz, Ditalco e Minuro foram dar-lhes a conhecer as condições propostas
por Viriato: “Não abandonamos as armas, mantemos o nosso território e não nos
envolvemos em escaramuças“.
Viriato despediu-se da mulher,
Munnia, e do sogro, Astolpas. Parte na sua égua “Milos”.
Entretanto, os emissários,
homens de confiança, enviados por Viriato, são corrompidos pelos romanos com
promessas de riquezas. E, na pessoa de Lenate, insiste: - “Não queremos as
vossas terras, apenas as armas, para que haja paz.” “Lenate olhou de soslaio
para Cepião, retirou três moedas de ouro do saco e distribuiu-as pelos três. E
há mais de onde veio este”. O regresso dos emissários foi fatal para Viriato,
assassinando o seu chefe enquanto dormia. Termina assim aqui a vida deste notável
guerreiro ibérico. Duas semanas depois, os três assassinos e traidores de
Viriato, deslocaram-se a Tucci, a base da operação romana na Ibéria Ulterior.
Iam receber a recompensa prometida por Lenate e Cepião.
Então, quando esperavam
receber dos romanos, na pessoa de Libérius, o ouro que lhes haviam prometido,
em troca pela morte de Viriato, os mesmos foram apunhalados e mortos, com esta
indicação: – “Roma não negoceia com traidores”. Este é um exemplo entre muitos,
ao longos dos tempos.
A outra face da moeda é depois
de Cristo. Durante a Guerra Fria, a terceira maior potência nuclear do planeta
não era o Reino Unido, a França ou a China, mas sim a Ucrânia. E com o colapso
da União Soviética (URSS) em 1991, a nação recém-independente herdara cerca de
3000 armas nucleares deixadas por Moscovo em seu território. Três décadas
depois, a Ucrânia está totalmente desnuclearizada. E o tema volta à tona agora
que o país se encontra numa posição delicada após a invasão territorial
comandada pelo Kremlin, que ameaça reagir a qualquer tentativa de interferência
das potências da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) no confronto.
Através do Acordo de Budapeste,
nos anos 1990, a Ucrânia decidiu abrir mão das armas nucleares deixadas em seu
território em troca de segurança e reconhecimento como país independente. Tudo
foi acordado por meio do Memorando de Budapeste, um acordo assinado entre o
governo ucraniano, a Rússia, o Reino Unido e os Estados Unidos após o fim da
URSS. No entendimento firmado em 1994 na capital da Hungria, a Ucrânia
comprometia-se a aderir ao Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP)
e a devolver para Moscovo as ogivas deixadas no seu território.
Em troca da desnuclearização de
Kiev, os governos da Rússia, dos EUA e do Reino Unido comprometeram-se a
respeitar a independência, a soberania e as fronteiras existentes da Ucrânia e
a abster-se da ameaça ou do uso da força contra o país. E agora o que está a
acontecer? Putin, traidor, não respeita nada, brinca com a ONU, brinca com o
Tribunal Europeu dos Direitos Humanos. A ONU, NATO e UE só agora acordaram duma
letargia em que se encontraram. Esperemos que uma azia neste maldito Putin o
não largue até que seja absorvido por instintos de remorsos pelo imenso mal que
está a ocasionar a milhões de pessoas que nada têm a ver com a sua disfuncionalidade
cognitiva.
João de Jesus Nunes
jjnunes6200@gmail.com
(In “Jornal Fórum Covilhã”, de
06-04-2022)
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