Vem este texto a propósito das
enérgicas palavras que disparou o Ministro da Defesa, Nuno Melo, no dia 13 de setembro,
aquando da sua participação na cerimónia comemorativa do Dia do Regimento de
Cavalaria nº. 3 (RC3), em Extremoz, onde passou parte do serviço militar. O seu
pecado foi ter tido a coragem de lembrar que Olivença é portuguesa, “de jure” e
não “de facto”, desde o tratado de Alcanizes em 1297. Só que Espanha, na sua
chico- espertice anexou Olivença mantendo-a integrada na província de Badajoz.
No entanto, deve ser devolvida a Portugal, conforme tratado do Congresso de
Viena de 1815, e que em 1817 a Espanha reconheceu a soberania portuguesa. Por
isso mesmo, aquela unidade militar portuguesa é também conhecida por Dragões de
Olivença.
Não é que eu tenha qualquer
simpatia por Nuno Melo, penso, contudo, que poderia ter tido um pouco mais de
moderação nas suas palavras. Mas também discordo em parte das de Pedro Nuno
Santos, líder do PS, bem como das de Sérgio Sousa Pinto, comentador político do
mesmo partido, vindo logo a assustar com possíveis represálias de Espanha. Foram
na onda do alcaide de Olivença Manuel José González Andrade, tendo dito que os
discursos que procuram “separar através das fronteiras, no século XXI, foram
mais que esquecidos e pertencem a séculos passados”.
Enfim, conforme refere o Público,
de 13-09-2024, “apesar da diplomacia portuguesa continuar, sem reconhecer a
soberania espanhola sobre Olivença, o tema chega a ser ‘não-assunto’ entre os
dois Estados, não perturbando as relações”. O que é certo é que Olivença celebra
o Dia de Portugal e a população continua a procurar preservar o legado
português, desde a língua à nacionalidade.
Para Carlos Luna, historiador e
membro do Grupo dos Amigos de Olivença, as declarações de Nuno Melo não fazem
mais do que chamar à atenção para uma posição que Portugal tem mantido há dois
séculos e que continua por resolver. “Creio
que o Estado português poderia pressionar Madrid, pelo menos no sentido de autorizar
que os oliventinos conhecessem a sua própria história logo na escola”. Este
ativista da causa de Olivença considera que a ação espanhola na localidade “só
pode ser considerada como colonizadora”.
Olivença tinha 11 871
habitantes em 2021. Esta cidade dista 23 Km de Elvas, 24 Km de Badajoz, 236 Km
de Lisboa e 424 Km de Madrid. Pertenceu a Portugal desde a sua fundação, no
século XIII após a reconquista cristã, e foi integrada no território português
pelo Tratado de Alcanizes, em 1297, conforme inicialmente referido, durante o
reinado de D. Dinis. Em 1801, durante a chamada Guerra das Laranjas, Olivença
foi ocupada por Espanha, e a sua posse foi confirmada pelo tratado de Badajoz,
assinado nesse mesmo ano, embora Portugal nunca tenha oficialmente reconhecido
a anexação. A 14 de agosto de 1805 era lavrada a última ata da Câmara e Olivença
em língua portuguesa. Longe da ameaça de Napoleão, em 1 de maio de 1808, o
príncipe regente D. João (futuro D. João VI) publica no Rio de Janeiro, então
capital do Império Português, um manifesto no qual repudia o Tratado de Badajoz.
Em 1811, Olivença é temporariamente ocupada por contingentes luso-britânicos
sob o comando de Lord Beresford. Após o Congresso de Viena de 1815 que sucedeu
às Guerras Napoleónicas, as potências europeias decidiram que Olivença deveria
ser devolvida a Portugal, mas a Espanha nunca implementou essa restituição, e a
cidade permaneceu sob administração espanhola até hoje. Em 1821, a partir do
Brasil, Portugal ocupou a Província Cisplatina (atual Uruguai). Este facto
serviu de justificativa espanhola para interromper as conversações sobre a
devolução que decorriam. Paralelamente, Espanha argumentou (e continua a
argumentar) que o Tratado de Badajoz de 1801 continua válido e que o Tratado de
Viena não tem força legal suficiente para obrigar à entrega de Olivença a
Portugal. Entretanto, em 1840 passou a ser proibido o uso da língua portuguesa
no território, incluindo nas igrejas, conforme narrado na Wikipédia.
Na segunda metade do século XX, o
general Humberto Delgado e o almirante Pinheiro de Azevedo foram fervorosos adeptos
da recuperação de Olivença, tendo ambos desempenhado funções de destaque no
Grupo dos Amigos de Olivença, fundado em 1944.
A Covilhã tem uma rua com o nome
Rua de Olivença, que substituiu a antiga denominação de Rua do Vigário. Foi
inaugurada no início do ano 1956, de harmonia com o deliberado pela edilidade
covilhanense, sob a presidência do coronel António Matoso Pereira, em cuja ata
da sessão camarária de 24-01-1956, referia: “Rua de Olivença – Datado de 12 do
corrente, do secretário-geral do Grupo Amigos de Olivença, solicitando à Câmara
que a uma das artérias desta cidade seja dado o nome de ‘Olivença’. Informo
ainda que, gostosamente, o Grupo Amigos de Olivença levaria a efeito uma
conferência desta cidade sobre o elevado significado do nome da nova artéria,
no dia da sua inauguração. A Câmara considerou este pedido e deliberou que à
atual Rua do Vigário seja dado o nome de Rua de Olivença, o que deverá ser
comunicado ao Grupo dos Amigos de Olivença”.
Ora bem, recordo-me perfeitamente
desta inauguração, cuja data exata desconheço pois não consultei mais atas da
Câmara Municipal da Covilhã ou do Arquivo Municipal. Tinha 9 anos e andava na
3ª. Classe (hoje 3º. Ano), no Asilo – Associação Protetora da Infância
Desvalida, como se designava. Nesta escola pertencíamos à Mocidade Portuguesa e
entregavam-nos uma farda para os dias festivos, como participar nas
comemorações do 1.º de dezembro e Procissões do Senhor dos Passos e Enterro do
Senhor, como também em outros eventos que recordo: receção aos militares que
regressavam da Índia Portuguesa, junto à Câmara Municipal, no Pelourinho.
Outro dos eventos seria (mas não
foi da minha parte) participar fardado da Mocidade Portuguesa, junto ao local
onde foi a inauguração da Rua de Olivença. Não me desloquei porque estava uma
tempestade, chovia torrencialmente, e a conselho de meu Pai, não saí de casa.
Na situação atual, embora
Olivença esteja sob controle espanhol, a questão permanece formalmente não
resolvida. Portugal mantém a sua reivindicação, embora o assunto não cause
tensões diplomáticas significativas nos dias de hoje. A cidade e a sua cultura refletem
uma mistura de influências espanholas e portuguesas, com muitos dos seus
habitantes falando ambos os idiomas e com tradições culturais que unem os dois
países. Na atualidade, Portugal não reclama abertamente Olivença, mas também
não renuncia à sua pretensão.
João de Jesus Nunes
(In “O Olhanense”, de 01-10-2024)
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