24 de julho de 2016

A DIMENSÃO DO ANTIGO INTERNACIONAL PORTUGUÊS, VICENTE LUCAS

Este texto foi iniciado no final do encontro entre as seleções do País de Gales e da Bélgica, com a vitória do primeiro, em 1 de julho, ficando assim a conhecer-se o adversário para a Seleção de Portugal, nas meias-finais do Campeonato Europeu de Futebol 2016, a realizar-se em França.
Foi, assim, a 4.ª vez que Portugal chegou às meias-finais (1984, 2000 e 2012 e 2016), sendo certo que no ano 2004 foi vice-campeão europeu, e, neste caso, passou uma 5.ª vez pelas meias-finais.
Mas, o que é certo e verdade é que, depois de muitas críticas, Portugal acabou por vencer o País de Gales por 2-0, passando, pela segunda vez na sua história, à final, desta vez com a França, que, entretanto, derrotara a Alemanha por aquele mesmo resultado.
Chegado o momento decisivo da final, no inolvidável domingo,10 de julho, Portugal acaba mesmo por se sagrar Campeão Europeu de Futebol, ao ganhar à França, em sua própria casa, por 1-0, golo de Éder, pela primeira vez na sua história, ficando assim assinalado este facto numa das páginas de ouro dos anais do desporto português
Sobre a génese deste Campeonato, considerando ter havido muitas oportunidades para a realização de jogos internacionais a nível de seleção, a Europa foi o último continente a desenvolver um campeonato para as suas Federações.
Somente em 1958 se começou a disputar o Campeonato da Europa, inicialmente com a designação de Taça Henri Delaunay, em homenagem ao seu fundador e principal ideólogo da prova. Foi o primeiro presidente da UEFA. Depois passou a designar-se de Taça da Europa das Nações. Em 1968 foi abandonada esta designação para a atual: Campeonato Europeu de Futebol. Inicialmente a prova funcionou de moldes diferentes.
Portugal integrou o Campeonato Europeu, pela primeira vez, em 21 de junho de 1959, com o primeiro jogo na Alemanha Oriental, onde ganhou por 2-0. Neste encontro jogaram dois irmãos: Sebastião da Fonseca Lucas, mais conhecido por Matateu, já falecido; e Vicente Lucas da Fonseca. Os golos de Portugal foram marcados por Matateu e Coluna. No segundo jogo, realizado no nosso país, em 28 de junho, Portugal ganhou à Alemanha Oriental por 3-2.
Vamos dar evidência à figura incontestável de VICENTE LUCAS, de seu nome completo Vicente da Fonseca Lucas, que nasceu em Moçambique em 24-09-1935. Veio para Portugal, envergando a camisola do Clube de Futebol “Os Belenenses”, ombreando com seu irmão, Matateu.
Estreou-se pela Seleção Portuguesa em 3 de junho de 1959, em Lisboa, frente à Escócia (1-0), tendo sido o seu último jogo, no Campeonato do Mundo de Futebol de 1966, em 23 de junho de 1966 (há cinquenta anos), em Liverpool, frente à Coreia do Norte (5-3). A sua posição em campo era a defesa e médio.
Pouco falador, bondoso, Vicente tornou-se numa das figuras mais queridas da história do futebol português. O seu estilo subtil e instintivo marcou uma época, tendo sido um defesa de categoria ímpar, de técnica apuradíssima e impressionante rapidez de movimentos. Na sua capacidade de antecipar os lances e os movimentos do adversário, chegava sempre primeiro às bolas em disputa, tendo alicerçado uma carreira que o Mundo apreciou.
Cinco anos depois de ter assinado pelo Belenenses, Vicente chegou à Seleção Nacional na qual não teve uma presença muito firme. Os confrontos com o Brasil, sobretudo aquela célebre vitória de abril de 1963, em Lisboa (1-0) criaram um facto inesquecível na vida do defesa central português: a forma como soube marcar Pelé, a grande estrela do futebol mundial, permitindo à imprensa rejubilar em manchete: “Vicente meteu Pelé no bolso”. Não admira, portanto, que das suas 20 internacionalizações, Vicente some 6 contra o Brasil.
Com 30 anos, parecia que Vicente iria ter mais 4 ou 5 épocas ao mais alto nível para dar ao seu clube – O Belenenses, e à Seleção Nacional Portuguesa, mas o fatal destino não permitiu que assim acontecesse. Logo no início da época seguinte, no fatídico dia 7 de outubro de 1966, um acidente de viação fez-lhe perder uma das vistas. O infortúnio atingira brutal e precocemente o fim da carreira de Vicente.
Em 22 de janeiro de 1967, uma vénia coletiva varreu o país desportivo, com jogos a decorrerem em 17 campos de norte a sul sob o mesmo denominador, e isto diz tudo sobre a dimensão de Vicente Lucas.
Recordo-me de também o Sporting da Covilhã se ter associado num desses encontros, com o Benfica de Castelo Branco, em Castelo Branco. Foi a justa homenagem ao grande Homem e Desportista, todos se unindo para mitigar o infortúnio de um jogador de eleição.
Recentemente, Vicente Lucas teve um novo irritante adversário. A recente amputação parcial da perna esquerda vai obrigar o antigo defesa/médio que brilhou no Mundial de 1966 “a um processo de recuperação que exige uma dose de empenho tão generosa como aquela que, durante anos a fio, derramou sobre o relvado. É mais um revés num corpo massacrado pelo azar que foi forçado a virar costas ao futebol demasiado cedo”, quando, em outubro desse ano de glória da seleção em Inglaterra, sofreu, como já referi, um acidente de viação que lhe inutilizou um olho.
E, assim terminamos este texto, da “Memória Redonda – Simplesmente Vicente”, como tão bem o interpretou o “Público”, de 6 de março de 2016.
As memórias dos dois irmãos, a jogar no Belenenses, e na Seleção Nacional, são diferentes, na verdade. No campo e fora dele. Matateu, mais imponente e extrovertido. Vicente, mais subtil e discreto. Matateu um predador de área. Vicente uma sombra permanente para os adversários.
É verdade que Vicente Lucas nunca se sagrou campeão nacional, mas conquistou algo bem mais valioso que um troféu: o respeito e a admiração de um povo.

Como Vicente Lucas, também os valorosos atletas que integraram a Seleção de Portugal, neste Campeonato Europeu de Futebol de 2016, são credores do respeito e admiração de todos nós.

(In "O Combatente da Estrela", de julho a setembro de 2016)

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