3 de outubro de 2018

O ZÉ DO MEGANE


Como entrámos no Outono, o tempo de férias praticamente acabou, começaram as aulas depois dos protestos dos professores, e dos taxistas terem terminado os seus, contra a “lei Uber”, para além de outros acontecimentos que foram dando corpo à “silly season”, houve algum tempo para leitura.
Pela minha parte, coube-me o deleite de, após ter devorado dois livros, passar a folhear despreocupadamente aquele que escrevi e foi apresentado no passado dia 8 de setembro.
Os meus dedos levaram-me indiscriminadamente para as páginas 119 e 120, da parte romanesca, na tertúlia de Valbom, mas desta vez a ter lugar no Restaurante Margarida, em Leça da Palmeira:
“- Psssstt… - Chamou à atenção o Zé do Megane, para o que se estava a passar, ali bem perto, à porta do restaurante, mas bem fora dele.
Um grupo de cinco turistas visitava o Porto. A carrinha com o cicerone parou à porta. Eram três lindas moças e dois esguios rapazes.
Então dizia o cicerone: Aqui é Leça da Palmeira e o Porto é intitulado pelos ilustres da História de Portugal, como a ‘Sempre Leal e Invicta Cidade do Porto’.
Os sorrisos das moças às explicações do cicerone faziam inveja a quem passava, tal a sua graciosidade, todas de calças de ganga, curtas, a denunciarem as formas do corpo, para além dos seus cabelos compridos e uma de rabo de cavalo.
Os dois rapazes daquele grupo turista, tanto como elas, procuravam dos seus telemóveis obter as melhores fotografias.
Ao recuarem para obterem uma melhor panorâmica – cuidado com os automóveis!... – dizia o cicerone – uma das moças pisa inadvertidamente um velho que ali passava, de jornal debaixo do braço, e ainda uma caixinha de bolos, que comprara na pastelaria para o aniversário da sua Maria que fazia 80 anos, e, na outra mão, uma bengalinha, que por graça e mor do senhor doutor, o aconselhara a andar assim mais seguro.
Da pisadela, susto do velho, um pouco mais de vento, jornal para o chão, e logo duas páginas centrais voam e se enrolam num automóvel que passava.
Corou e deixou-se de sorrisos a pequena enquanto as suas colegas se riam.
Um dos rapazes corre atrás das páginas do jornal que voaram quando obriga um ciclomotorista a travar bruscamente e a estatelar-se no chão. Para além das calças rotas (rotas já elas estavam quando as comprou com aqueles buracos…) nada mais aconteceu, depois de mirar a Famel Zundap que não ficara danificada.
O rapaz do motociclo, após ter recebido pedidos de desculpa, por lhe terem ocasionado aquele susto, do turista e seus companheiros de viagem, bem como o cicerone, lá seguiu o seu caminho, tanto mais que as três gaiatas também o haviam fascinado.
Entretanto, o velho, de sua graça, Joaquim, vendo todo este espetáculo, acaba por dizer: - ‘Deixe lá o jornal, minina, era só p’rá mor de m’entreter com a minha Maria que hoje faz 80 anos. O pior foram os bolos que ficaram esborraçados!... Não viu que o rapazinho a correr atirou-me com a caixa ao chão e pisou os bolos?’
Deste episódio, o Zé do Megane que, entretanto, fizera interromper os trabalhos, e os seus companheiros tertulianos acabaram por se juntar à porta, assistindo a tudo, teve pena da moça e do velho, e não é que lhes pede para entrarem, e dá indicações ao empregado para arranjar uma caixinha de bolos, enquanto o Damasceno acabou por ir comprar o Correia da Manhã, do qual algumas páginas tinham voado e ficado incompleto…
Entretanto, o Benedito, finório, diz para o sr. Joaquim: - Olhe lá, já viu que as páginas que voaram do jornal eram estas… e apontou para aquelas em que surgiam, desnudadas, algumas celebridades…
- Olhe, Sinhor! … Não sei a sua graça… - Respondeu o sr. Joaquim ao Benedito: ‘Noutros tempos, eu binha à cidade de barco rabelo… Ainda m’alembra dos carros de bois birem carregar pipas de beinho fino, dos nabios à bela subindo’ …
E enquanto lhe servem um copo de branco, que lhe ofereceram, adianta-se: - ‘Bote aí!’
Bom, as três mocinhas, os dois rapazes e o cicerone lá seguiram o seu caminho, muito agradecidos com tudo o que lhes fizeram, com muitos pedidos de desculpa, sem que antes o Benedito conseguisse a aceitação de uma selfie com elas.
O sr. Joaquim também já se preparava para partir, enquanto o empregado foi retirar de perto da porta, para o lixo, a caixa dos bolos esmagados, quando o Manuel lhe pergunta:
- Então, a sua Maria faz hoje 80 anos? Parabéns!
- E olhe que eu, oficialmente, casei três bezes. Isso mesmo, três bezes! – Respondeu o sr. Joaquim.
Bom, e aqui terminou o drama, que não chegou a acontecer.
- Vamos continuar com o nosso programa, malta, senão também podem voar os nossos papéis – Ordenou o Fernando Gonçalves.”
E muitas, muitas mais histórias entre facto-ficção foram escritas. Fica somente esta pequena abordagem para os muitos que são possuidores do livro.


(In "Notícias da Covilhã", de 04-10-2018)

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