Século
XV, ano de 1480, nasce em Portugal em local incerto, presumindo-se no Norte, uma
criança a quem foi dado o nome de Fernão de Magalhães. Na sua juventude, aos 25
anos (1505) estava a prestar serviço militar na Índia.
Mas
já antes havia ingressado como pajem na corte da rainha D. Leonor, mulher de D.
João II, aos 14 anos.
Em
1488, Bartolomeu Dias regressa dobrando o Cabo da Boa Esperança; em 1492, Cristóvão
Colombo é recebido por D. João II, a caminho de Sevilha, após a descoberta da
América; Vasco da Gama faz a descoberta do caminho marítimo para a Índia em
1498, isto querendo dizer que, a nível científico têm tanta importância na
passagem da Idade Medieval à Idade Moderna, quanto, em Itália, a nível
artístico, o Renascimento, ou na Alemanha, de âmbito religioso, a Reforma.
Magalhães
vem a ser figura assinalável nos anais da história de Portugal e, talvez noutra
vertente, também na história de Espanha. Uma personalidade dotada aos caprichos
da incompreensão de alguns, da dúvida e de ódios, a par de um homem sem medos,
valoroso, combativo, rigoroso e aventureiro, a quem, paradoxalmente, lhe é
reconhecido o real valor ao leme de uma ideia, de uma empresa, de um projeto
comum europeu: o do conhecimento da verdadeira dimensão do mundo.
Sobre
Fernão de Magalhães talvez seja importante referir que à morte de D. João II,
em 1495, a corte se dividiu quanto à sucessão em duas fações. A primeira que
insiste que o trono seja entregue a D. Jorge, filho bastardo do rei. A segunda,
liderada pela rainha, defende a ascensão ao trono de D. Manuel, irmão de D.
Leonor, primo de D. João II. Alguns historiadores colocam a hipótese de a
família de Magalhães ter apoiado a primeira fação, ou seja, a que acabará por
perder a corrida ao trono.
Originaria
assim, que, volvidos anos, e por repetidas vezes, havia hostilidade de D.
Manuel I a todos e quaisquer pedidos e projetos que lhe seriam apresentados por
Fernão de Magalhães. Uma vingança? Se
não, pelo menos uma injustiça!
Assim,
juntamente com o nosso conterrâneo, covilhanense Ruy Faleiro, também fora das
graças do rei D. Manuel I, colocam-se ao serviço do rei de Castela, D. Carlos
I, mais tarde o imperador Carlos V, contra a vontade, não declarada, do monarca
português, para uma viagem marítima à terra das especiarias, pelo ocidente,
donde emanava a riqueza. Era também esta a direção que o Papa apontava aos
espanhóis, havendo, no entanto, uma barreira atravessada no caminho: o
continente recém-descoberto da América, do que se dizia, erradamente, não poder
ser contornado por sul. No entanto, Fernão de Magalhães teria já a informação
precisa de haver aí uma passagem. Estaria assim disposto a pôr o seu segredo e
o do seu amigo Ruy Faleiro ao serviço da coroa espanhola, se lhe fosse
disponibilizada uma frota.
Mas
havia o medo de navegar para sul face a fábulas que surgiam, quase
intransponível para o Papa de forma a arranjar homens para as primeiras
expedições como quando Gil Eanes, em 1434 dobrou o pretensamente intransponível
cabo. Assim, o Papa assegurou a cada participante, para as primeiras
expedições, a remissão completa dos seus pecados.
E
Magalhães lá vai conseguir uma frota de cinco naus, sendo que a maior é a San
Antonio, sob o comando de Juan de Cartagena; a Trinidad vai ser
capitaneada por Magalhães; depois, a Concepcion, comandada por Gaspar
Quesada; a Victoria, capitaneada por Luis de Mendonça; a Santiago,
por João Serrão.
A
viagem, ao longo do seu percurso, torna-se atribulada, com tempestades e
naufrágios, com problemas com alguns nativos, e a fome. Uma das embarcações
volta para trás, desertando, e existe um motim no porto de S. Julião que vai
dar lugar à condenação à morte horrível de dois deles e outros tantos deixados
na praia deserta, incluindo um padre cúmplice, condenados ao degredo.
O
grande capitão e homem sem medo, Fernando de Magalhães, após já ter cumprido a
sua missão, que foi a passagem estreita a sul, já nas Filipinas, enfrenta na
peleja corpo a corpo o muçulmano Lapu-Lapu, em Mactan, e morre, sendo a
debandada dos poucos homens de Magalhães, que nem o seu corpo conseguem trazer,
ficando sem se saber qual o destino que lhe deram.
Depois
de tantas injustiças do nosso rei D. Manuel I, em dizer não a tudo que fosse
pedido por Magalhães, nem sequer a sua família (mulher e dois filhos menores)
que pouco tempo depois faleceram, tiveram direito a qualquer importância.
Até
Vasco da Gama aconselhou D. Manuel I a assassinar Magalhães!
Valeu,
para limpar o bom nome de Magalhães, face às informações erradas que
transmitiram os desertores da nau San Antonio, as declarações do jovem
italiano Pigafetta, escrivão de todo o tempo da expedição, sobrevivente e um
dos 18 que conseguiram chegar a San Lucar de Barrameda, ele, diplomata e homem
de letras que, ao serviço do embaixador do Vaticano chegou em 1518, a
Valladolid, na altura a sede da corte espanhola. Depressa descobriu que em
Sevilha se preparava uma expedição aos limites do mundo e consegue ser admitido
como membro da tripulação.
Pois
é, de cerca de 260 tripulantes e cinco navios à largada, a 20 de setembro de
1519, houve um navio e 18 sobreviventes, no seu regresso, a 6 de setembro de
1522, três anos depois.
O
nome de Magalhães em ruas ou avenidas em Portugal jamais foi de grande opção.
Recordo que existe, por exemplo, em Coimbra, a Avenida Fernão de Magalhães,
pois foi aí que eu, pela primeira vez fui multado por estacionamento indevido,
decorria o ano de 1973.
E
já que a Covilhã tem a Rua Ruy Faleiro por que não dar o nome de Fernão de
Magalhães a uma rua ou avenida desta Cidade, como agora fizeram, estranhamente,
com o nome do líder pacifista indiano Gandhi, nas comemorações dos 150 anos do
seu nascimento, quando, afinal, até comemoramos os 500 anos da 1ª Viagem de
Circum-Navegação, iniciada pelo português Fernão de Magalhães, símbolo
admirável do início do processo de globalização que vivemos e da força de
vontade dos homens em conseguirem alcançar grandes desígnios por que anseiam?
Saudamos
o lançamento do livro do Covilhanense, Dr. João Morgado, sob o título Fernão
de Magalhães e A Ave-do-Paraíso”.
(In "Jornal fórum Covilhã", de 09-10-2019)
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