Este é o título que a médica
neurologista, Isabel Santana, inclui na revista Olhares, um registo
muito oportuno que me chamou à atenção, eu que me debato com esse problema de me
surgirem muitas partidas de falha da memória, essencialmente quando mais da
mesma necessito, ou seja, para o desenvolvimento de um texto, ou mesmo no
discernimento de uma conversação, já que várias vezes a omissão da palavra que
está debaixo da língua teima em não sair. Mas, com esforço, e uma dose de
tranquilidade, as memórias ofuscadas acabam por voltar à tona da água.
A caminho de sete décadas e mais
sete anos de peregrinar neste planeta, recordo-me que há precisamente sete anos
(a minha tendência para o número sete, talvez induzido pela resposta de Cristo
aos Apóstolos de que deviam perdoar não sete vezes mas setenta vezes sete),
numa consulta a uma neurologista, no âmbito das formulações da consulta, veio a
propósito o meu envolvimento na publicação de mais um livro, de grande conteúdo
(perto de 900 páginas), para além de manter colaboração assídua em quatro
jornais. A resposta foi perentória: “Escrever artigos moderadamente, sim!
Quanto a esse livro que está a escrever, esqueça!”. Bom, aceitei parte da
prescrição mas a obra em curso acabou por sair, não um “ensaio” mas um
autêntico “tratado sobre seguros”, aquela que foi a minha atividade de mais de
quatro décadas, e ainda mantenho um grupo de amizades em redor da mesma. Depois
deste livro (que se encontra em mais de centena e meia de bibliotecas e
instituições deste país, Brasil e muitos particulares), mais dois se seguiram.
“Temos 800 mil milhões de
neurónios, uns mais especializados que outros – é certo – e tudo o que somos,
fazemos, pensamos, imaginamos e sentimos passa por ali. A informação circula a
uma velocidade próxima dos 400 Km/hora e está sempre dependente da comunicação
que existe entre os neurónios, as chamadas sinapses ou pontos de encontro de
trocas químicas e elétricas. Quando a idade avança, este funcionamento começa a
perder alguma eficácia, mas as modificações são subtis e não interferem com a
vida do dia-a-dia”.
Evidentemente que respeito as orientações
clínicas mas também compreendo que é muito difícil terminar com compromissos,
ainda que voluntários, das atividades cognitivas.
É certo e verdade que o
esquecimento nas pessoas mais idosas nem sempre é levado a sério, conforme
refere Isabel Santana, admitindo alguns serem ingredientes de um processo
normal de envelhecimento, o que considera errado, já que não é apenas o risco
cardiovascular que importa. “O cansaço, a desmoralização, o sofrimento e a
solidão, inevitavelmente irão acelerar o défice de saúde mental e física. A
falha de memória deve ser um alerta, mas há outros sintomas a que devemos dar
atenção: perder o entusiasmo por atividades que eram muito apreciadas;
desorientação no tempo e eventualmente no espaço; arrumar objetos no lugar errado;
perda de iniciativa; perda de capacidade de resolução de problemas básicos;
perda de capacidade de raciocínio; alterações de humor, comportamento e
personalidade; dificuldade na utilização de palavras (fala e/ou escrita); perda
de memória”.
Sem o sentido de atemorizar quem
ler esta crónica, deixo, no entanto, aqui este interessante alerta (que para
mim também serve) da médica neurologista Isabel Santana, para as nossas capacidades
cognitivas não ficarem comprometidas.
Infelizmente lê-se pouco no nosso
país, e até os jornais começam a ficar preteridos. O meu melhor ambiente entre
amigos é de quem gosta de cultura, e não de quem a despreza. Felizmente ainda
conto com alguns bons grupos de amigos, entre as versões apontadas, onde não
faltam os prazeres da comida portuguesa, e dos bons vinhos.
Quando faço uma visita à
Biblioteca Municipal, lá encontro interessados pela leitura, mormente dos
jornais.
E, aqui, um antigo leitor assíduo
da biblioteca, que já vem da antiga Biblioteca Municipal, ao Jardim, e agora na
nova Biblioteca Municipal, de seu nome Francisco Pereira de Sousa, continua
numa perene ida à sala de leitura para a consulta de jornais e livros. É um
prazer ver este Homem, de 85 anos, que desde os primórdios da antiga
biblioteca, na década de 50 do século passado, até aos dias de hoje, se torna o
mais antigo leitor da Biblioteca Municipal da Covilhã.
Recentemente encontrámo-nos e memorizou
algumas páginas dum dos meus livros que lhe ofereci, ao mesmo tempo que
recordou peripécias quando, menino e moço, visitava a antiga Biblioteca
Municipal, ao qual não lhe facultavam todos os livros, face à mentalidade da
época, em que os livros sobre amor eram tabu. Mas era o Almanaque ABCZINHO de que
mais gostava, com aquelas figuras, como o boneco Narciso Pateta. Recordou o
jornal do regime salazarista Diário da Manhã em que encimava “Tudo pela
Nação, Nada contra a Nação”.
Convidou-me a ver a parte de trás
do seu carro, onde havia livros em vários sítios, que ia lendo. Sem dúvida, um
caso insofismável de amor à cultura.
Este Leitor de mais de setenta
anos de leitura na Biblioteca Municipal merece ser objeto de reconhecimento
municipal. Ou será que estou equivocado. Não! Não estou!
João de Jesus Nunes
(In “Jornal Fórum Covilhã”, de
08-03-2023)
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