Neste primeiro de outubro, mais
próprio de um dia de verão, as notícias climáticas não são agradáveis. Culpa do
homem. O meteorologista acabou há pouco de alertar num dos canais televisivos
de que em Portugal nos deveremos habituar a ter unicamente duas estações. Até o
fundo dos oceanos é quente, e, como tal, nocivo para a vivência no planeta.
Depois das férias, com uns mais preocupados
do que outros, os bons jornalistas, de conceituadas publicações, deparam com as
notícias “num mundo em plena desordem, em que é cada vez mais difícil detetar
os principais fios condutores e as grandes tendências que nos permitem,
normalmente, interpretá-lo”. Nesta preocupação surge Teresa de Sousa, do Público.
É que vivemos num desses momentos de grande turbulência internacional. É a
transição entre duas ordens mundiais, ou seja, a que conhecemos nas últimas
décadas, construída pelos Estados Unidos depois da II Guerra Mundial. Liberal e
assente em regras. A outra, ainda desconhecemos os seus contornos, em grande
parte. De harmonia com o que escreveu a diretora da revista britânica The
Economist, começa por lembrar que desde que a China passou a integrar a
economia global, nos anos 1980, o seu crescimento foi o mais espetacular que
alguma vez a História registou. A economia chinesa “cresceu à taxa anualizada
de apenas 3,2% no segundo trimestre”, face aos 40 anos em que a sua economia se
encontrava. Terrível para os padrões chineses, sobretudo se compararmos com o
crescimento da economia americana de quase 6% no mesmo período.
Segundo a tese da revista
britânica, as políticas económicas defendidas pelo presidente chinês apenas
agravarão o problema porque o seu objetivo principal deixou de ser o
crescimento económico para passar a ser a segurança, na rivalidade com a
superpotência americana.
Na cimeira dos BRICS que decorreu
em Joanesburgo, na África do Sul, os países passaram a ser onze. Mais que
duplicaram o número dos seus membros. Eram inicialmente quatro, sendo certo que
BRIC significa Brasil, Rússia, Índia e China. Juntou-se-lhes depois a África do
Sul. Agora estes convidaram mais seis países: Arábia Saudita, Emirados Árabes
Unidos, Irão, Argentina, Etiópia e Egipto. Já a Indonésia não aceitou integrar
este grupo, que é o maior país islâmico do mundo, com uma economia poderosa e
uma população de 200 milhões e pessoas, no Sudoeste Asiático.
Não deixa de ser desagradável,
quase ofensivo, o facto de países democráticos, como o Brasil, Índia ou África
do Sul, terem aceitado sem qualquer problema “coabitar com teocracias ignóbeis como
o Irão e a Arábia Saudita”.
A China foi o grande
impulsionador deste alargamento. Sozinha, já representava 70% da riqueza dos
BRICS. Consolidar um grupo de países importantes do Sul Global capaz de
rivalizar com o G7 é uma parte fundamental da sua estratégia. À Índia cabe-lhe,
durante este ano, presidir ao G20 criado por iniciativa da França e dos Estados
Unidos, em 1999, para integrar as principais economias emergentes, grandes e médias,
que não se sentiam devidamente representadas nas estruturas das Nações Unidas,
e para responder ao mundo que emergia do fim da Guerra Fria.
O presidente russo não esteve
presente nas cimeiras organizadas por se ter tornado uma figura muito incómoda
para todos os subscritores dos estatutos do Tribunal Penal Internacional, que
devem cumprir os respetivos mandados de captura, como no caso de Vladimir
Putin.
O G7 reúne democracias liberais
que partilham os mesmos valores fundamentais da democracia e do Estado de
direito. Não existe essa unidade, neste novo grupo, que reúne teocracias
violentas, regimes totalitários como o chinês, ditaduras agressivas e expansionistas
como a russa, onde Putin transformou o seu país num verdadeiro Estado-máfia, em
que os opositores são pura e simplesmente assassinados.
O alargamento dos BRICS
representa uma tendência que não deve ser subestimada e que exige dos Estados
Unidos e da Europa particular atenção.
O jornal Monde concluía,
no seu editorial de 26 de agosto que “Ao passar de cinco para 11 países, os
BRICS podem defender melhor os interesses do Sul Global. Mas as esperanças da
China de reunir à sua volta uma frente antiamericana parecem menos realistas”.
Teresa de Sousa conclui no Público
que “o nosso velho continente está a braços com uma guerra em grande escala,
a maior desde a II Guerra Mundial, que ditará o nosso futuro coletivo – de paz
e de prosperidade, como nos habituámos a viver, ou de insegurança e de profunda
incerteza. O seu desfecho a favor da Ucrânia é vital”.
Questiono, pois, para onde
iremos?
João de Jesus Nunes
(In “Jornal Fórum Covilhã”, de
11-10-2023)
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