Nesta época natalícia trazemos à presença dos prezados Leitores d’ “O
Combatente da Estela”, uma Figura Covilhanense, sobejamente conhecida porquanto
a sua atividade profissional que abraçou, de longa data, se coaduna com os seus
produtos para esta época, e em todas as festividades ao longo do ano.
Quem vê o Rui Cardona, a maior parte do tempo quase embrenhado no seu
estabelecimento da indústria de pastelaria, na cidade serrana, tão de humilde
quão de atencioso, brota-se-lhe um certo sorriso para com a clientela que vê
crescer.
Quem não conhece a Pastelaria Almeida com os seus produtos característicos
como os biscoitos de azeite, bolo-rei, filhós, e outros afins, de grande
diversidade?
Bom, mas certamente a maioria das pessoas não terá conhecimento que o Rui
foi um antigo combatente em Moçambique, onde passou grande parte do tempo em
zonas de grande perigo que, embora não tivesse sido atingido pelos efeitos nefastos
da guerra, viu entretanto sucumbirem alguns dos seus camaradas de armas.
Mas façamos uma retrospetiva desde a Covilhã, onde nasceu no dia 9 de
novembro do ano da graça de 1950, até à então designada, na altura, província
ultramarina de Moçambique, para cuja colónia foi enviado.
É casado. Tem 2 filhos e 2 netos e, como referido, exerce a atividade de
industrial de pastelaria.
Quando jovem estudou na Escola Industrial e Comercial Campos Melo da
Covilhã e veio a iniciar a sua atividade profissional numa loja de
eletrodomésticos, na Covilhã (Adalberto dos Santos Luís) e posteriormente
noutra (Francisco Nunes Silva).
Surge entretanto o serviço militar obrigatório, que o leva até
Moçambique, e, no regresso com passagem à disponibilidade, conclui o Curso
Geral do Comércio e vai trabalhar com o pai, na Padaria da Ramalha. Este
estabelecimento acabou por ser vendido e o Rui Cardona Almeida passou a
trabalhar de conta própria, estabelecendo-se, fundando a Padaria Almeida, até
aos dias de hoje.
Relativamente ao início do serviço militar obrigatório, foi incorporado
no Regimento de Infantaria 7 (RI 7), Leiria, em 16 de abril de 1971 para a
frequência do 1º Ciclo do Curso de Sargentos Milicianos (CSM), passando em 15
de maio do mesmo ano para o RI 5, nas Caldas da Rainha, ficando apto para a
frequência do 2º Ciclo do CSM em 4 de julho, no CISMI, em Tavira, terminando o
mesmo na especialidade de Atirador de Infantaria, em 18 de setembro.
Foi entretanto promovido a 1º Cabo Miliciano em 5 de outubro de 1971, então
no RI 1, na Amadora, altura em que é mobilizado para Moçambique.
Seguiu ainda para Tancos (RI 11) onde tirou o Curso de Minas e
Armadilhas.
No dia 27 de junho de 1972 foi promovido a Furriel Miliciano e embarcou em
Lisboa para Moçambique, no avião 747, fazendo parte da C. Caçadores 3555, B.
Caçadores 3886/RT1, desembarcando na Beira no dia seguinte.
Da Beira seguiu para Tete, onde estava o Comando que o destacou para
Chinhanda e Daque. Fez Segurança à
Barragem de Cabora Bassa e fazia o reconhecimento das colunas, limpando a
picada das minas ou outros objetos. Era então uma zona de intenso perigo,
minada, onde passavam os carros de abastecimento.
Na especialidade de Minas e Armadilhas tinha a função de organizar as
equipas que iriam detetar as minas com os aparelhos de deteção, trabalho este
que cabia aos sapadores.
A Companhia era mista, de brancos e pretos, incluindo oficiais. Por vezes
iam nas picadas e recebiam informação da DGS de que mais adiante tinham minas,
o que lhes facilitava muitas vezes o seu o salvamento. É que a DGS torturava o
inimigo e este sentia-se obrigado a dizer onde se encontravam as minas...
livrando-se muitas vezes da morte.
A maior parte do tempo era passado no mato, pois havia só a casa do
Comando e o restante onde se encontrava a guarnição militar eram palhotas, onde
estavam aquartelados.
Os grandes problemas eram nas picadas onde havia minas, chegando a haver
alguns comandos que morreram, como o subcomandante da Companhia, Alferes Sá
Carneiro, sobrinho de Sá Carneiro que foi 1º Ministro de Portugal. Teve o
desfecho mortal ao fazer o reconhecimento da zona, de helicóptero, onde foi
abatido. Todos faleceram (quatro), à vista do Furriel Miliciano Rui Cardona e
seus camaradas.
Da sua Companhia teve oito baixas (3 por minas antipessoal; 3 por
acidentes com viaturas; e 2 por doenças, como o paludismo).
Mas nem só de combate o Rui Cardona tem memórias. Certo é que as
refeições eram geralmente à base de rações de combate. Vingavam-se muito no pão
que era fabricado por eles com a farinha que lhes distribuíam. Certo dia
mataram uma grande vaca do mato, mais conhecida por puma. Estavam à espera de
uma coluna, e mais uma vez com as refeições referidas, o habitual arroz com
conservas, mas sabiam que aquele carregamento trazia batatas, que há muito, mas
muito tempo não comiam. Com a abatimento da vaca, mais as batatas que aí vinham,
estavam todos ansiosos, mesmo encantados, todos alegres. Chegado o carregamento das batatas (alguns a
pensar naquelas batatinhas fritas...) ao abrirem, o contentor as batatas
estavam todas podres. Foi uma autêntica deceção, que levou muitos deles a
chorarem.
O Rui Cardona regressou à Metrópole em 14 de setembro de 1974, já depois
da Revolução do 25 de Abril, desembarcando no Porto, no aeroporto Sá Carneiro.
Recebeu a Medalha Comemorativa das Campanhas de Moçambique com a legenda:
“1972/73/74” (O.S. nº. 30 de 3555 de 28/08/1974).
(In “O Combatente da
Estrela”, nº. 133-DEZ/2033)
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