É um livro escrito por Thomas
Mann em 1924. Um dos romances mais influentes da literatura mundial do século
XX que contribuiu para conquistar o Prémio Nobel de Literatura em 1929. Começou
a escrevê-lo em 1912, no mesmo ano em que sua mulher Katharina Mann (Katia) foi
internada num sanatório de Davos na Suíça, para se curar de uma tuberculose. O
livro teria sido inspirado nesse episódio.
A grande ligação germânica às
epidemias dos séculos XIX e princípios do século XX vem-nos através da ficção.
E essa pertence a Thomas Mann, no seu livro A Montanha Mágica, cuja
epidemia que retrata é a tuberculose. Já quanto ao tempo manifesta-se anterior
à Grande Guerra, período antes da invenção dos antibióticos para curar o mal, e
da BCG para o prevenir. É o tempo em que os infetados iam “a ares”.
Mann estudara detalhadamente a
doença e as suas terapias. Os Raios X tinham sido descobertos mas os
tratamentos preventivos e curativos demorariam ainda mais de um quarto de século
a chegar. Por isso, na época, o receituário eram os ares da montanha e a
alimentação saudável.
A Guerra que ia começar
anunciava o fim das montanhas mágicas.
Thomas Mann sabia que retiros
como o Berghof eram um típico fenómeno pré-guerra e que a sua Montanha Mágica
era o canto do cisne de um mundo em que os infetados privilegiados podiam viver
anos em sanatórios, à custa dos rendimentos, enquanto os infetados menos
abonados morriam a trabalhar nas fábricas, nos hospitais, nos lazaretos das
cidades.
Do pouco desta descrição da
obra de Thomas Mann se pode fazer uma reprodução para Portugal e Madeira, com
base na altitude, encontrando-se aqui essas montanhas mágicas. A Serra da
Estrela, a Guarda, o Caramulo e o Funchal aí estão na sua evidência.
Em 1854 Francisco António
Barral publicava o primeiro trabalho científico português “sobre o clima do
Funchal e a sua influência no tratamento da tuberculose”. Os benefícios do
arejamento, do repouso e da alimentação no tratamento da tuberculose, que então
ganhavam foros científicos, tinham já encontrado na Ilha da Madeira um local de
eleição. Aqui foi construído o Hospital Princesa D. Maria Amélia, “destinado a
tratar doentes afetados de tísica e outras moléstias pulmonares crónicas, que
ainda possam ter esperança de melhora”, tendo sido inaugurado em 1862.
Mas só quando, entre 1881 e
1883, a Sociedade de Geografia de Lisboa promoveu Expedições Científica à Serra
da Estrela, animadas, entre outros, pelo médico Sousa Martins, se começaram a
estudar as condições da região com o objetivo de “fundar nela sanatórios para
tratamento da tuberculose pulmonar, à semelhança dos da Suíça”.
José Tomás de Sousa Martins estudara
Farmácia e depois Medicina, e, em pouco tempo, ascendera à cátedra na Escola
Médico-Cirúrgica de Lisboa. Era sócio da Academia das Ciências de Lisboa e
médico da Real Câmara de Suas Majestades e Altezas. A cura da tuberculose, de
que viria a ser vítima, foi a luta da sua vida.
Sousa Martins e o colega Lopo
José de Figueiredo Carvalho tinham viajado até Davos e Saint Moritz, na Suíça,
de onde voltaram maravilhados com os resultados benéficos que o ar puro da
montanha trazia aos doentes tuberculosos.
O empenho de Sousa Martins na
divulgação dos benefícios das condições climatéricas e da altitude para a cura
da tuberculose teve um enorme impacto público. Assim, muito antes de ali
surgirem os primeiros hospitais-sanatórios, começaram a afluir à Guarda e à
Serra da Estrela inúmeros tuberculosos. Mas a grande concentração de tísicos,
hospedados em casas particulares e nos poucos hotéis da zona, onde doentes e
sãos se alojavam num mesmo espaço, gerou um cãos epidemiológico, obrigando as
autoridades sanitárias a impor um registo de entradas de doentes nos hotéis e a
prescrever a desinfeção das casas onde os tísicos pernoitassem. Foi mais uma
razão para que Sousa Martins se batesse pela criação de um Sanatório.
Entretanto, este veio a falecer e o Sanatório Sousa Martins, na Guarda, sonhado
por ele e projetado por Raul Lino, só seria construído depois da sua morte, por
ação do amigo Lopo de Carvalho. Com a ajuda do médico da rainha, D. António de
Lancastre, o Dr. Lopo de Carvalho criou a Assistência Nacional aos Tuberculoso,
a fim de reunir os fundos necessários à construção do Sanatório da Guarda, de
que seria o primeiro diretor. Foi inaugurado em 18 de maio de 1907, com a
presença do rei D. Carlos e da rainha D. Amélia.
E foi tal o afluxo de tísicos,
que os três pavilhões do Sanatório se encheram rapidamente. E com lista de
espera. E ainda o “parque da saúde” não abrira portas, e já restava um chalet
por ocupar. Os ricos já todos tinham garantido lugar para poderem “ir a
ares”.
No Sanatório Sousa Martins
havia chalets para onde os ricos se podiam mudar, com família e criados,
a 100 000 réis por mês; um pavilhão, para doentes de primeira, de 2000 a
4000 réis por mês, com direito a cozinha especialmente cuidada; um outro, para
doentes de segunda, que custava aos remediados de 1000 a 1400 réis; e um
terceiro pavilhão caritativo, aberto aos pobres.
Mais tarde, viria a surgir o
Sanatório das Penhas da Saúde, no concelho da Covilhã, junto às Penhas da
Saúde, na Serra da Estrela, igualmente também conhecido como Sanatório dos
Ferroviários, inaugurado em 11 de novembro de 1944, sendo nessa altura
considerado o melhor sanatório da Península Ibérica. Em 1952, devido a
problemas financeiros da CP e da Sociedade Portuguesa de Sanatórios,
procedeu-se à transferência do complexo para o Estado, de forma a integrá-lo no
Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos. Devido aos avanços da
medicina, o tratamento ambulatório passou a ser mais utilizado, levando ao
encerramento dos sanatórios. O Sanatório das Penhas da Saúde foi desativado,
tendo os últimos pacientes saído em finais da década de 1960, sendo o Sanatório
encerrado pelo Ministério da Saúde e Assistência em 1970. Veio a ter várias
ocupações, sendo atualmente a Pousada da Serra da Estrela desde 1 de abril de
2014.
(Parte da consulta e adaptação do livro “Contágios – 2500
anos de pestes”, de Jaime Nogueira Pinto)
(In "Notícias da Covilhã", de 19-11-2020)
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