A minha primeira crónica deste ano de 2024, para o Jornal Fórum Covilhã.
Das resmas de temas que gravitam sobre a minha cabeça levam-me à opção
para me direcionar no sentido dos vendavais do momento.
Por vezes perco-me um pouco pelas redes sociais, e, vai daí, partilho
algo que o Facebook faz o favor de recordar de anos precedentes. Desta vez,
tive um certo assombro. Numa foto datada de janeiro de 1968, lá estávamos os
quatro covilhanenses que partimos da estação dos caminhos de ferro da Covilhã
em direção a Tavira, para cumprimento do serviço militar obrigatório. No CISMI,
na parada, a fotografia da praxe. Dos quatro dois já tinham falecido, ficámos dois.
Qual não foi o meu espanto quando eu digo que “já só restamos os dois primeiros”,
quando um amigo antigo colega me informa que já estava sozinho. O outro também
já partira.
Decidi moderar a minha escrita para um esforço do poder de síntese, o que
nem sempre é possível.
Vivi a minha infância onde o meio era de iliteracia, fora da família mais
chegada. Valeu-nos meu Pai que nos preparava nos primeiros estudos e na antiga
Biblioteca Municipal onde trabalhou durante muitos anos.
Foi aqui, num mundo de livros nas estantes que quase chegavam ao teto da
sala de leitura, mesas compridas, cadeiras pesadas e suportes de madeira para
os livros, que se enraizou a minha paixão pela leitura. Mas não só. Seriam também
os muitos jornais que diariamente ali chegavam, vindos pelo correio, portanto, com
atraso de um dia. Eles eram o Diário de Notícias, Diário Popular, Diário de
Lisboa, e, do Norte, só me recordo de lá poder ler O Comércio do
Porto. O primeiro e o último eram autênticos lençóis de papel.
Alguns dos que também tinham leitura apelativa, como O Século, Primeiro
de Janeiro ou Jornal de
Notícias, e ainda todos os desportivos como A Bola ou o Record
tinham que os leitores interessados os adquirir nas bancas, cafés ou
livrarias, já que que quiosques não havia, sendo o primeiro colocado na então
placa do Pelourinho para o Leal.
A única revista, muito cobiçada, de saudosa memória, era então a Flama. Mas havia outros jornais, afetos ao regime ditatorial de então, como o Diário da Manhã, ou de raiz adversa, como o República. E, noutras vertentes, o jornal A Voz e o Novidades.
Os semanários da nossa região, muito do
interesse dos leitores covilhanenses, eram então Notícias da Covilhã e o Jornal
do Fundão, chegando ainda a existir o Beira Baixa. De vários pontos do País, incluindo dos
distritos de Castelo Branco, Guarda, Coimbra e Setúbal, chegavam muitos jornais
regionais e eu até gostava de ler transversalmente o Diário
do Alentejo. Depois não faltavam, com elevado atraso, os jornais oriundos das então
Províncias Ultramarinas, que seriam as colónias, como o Diário
de Luanda, A Província de Angola, e de outros recantos coloniais, envolvidos em
cintas com a beleza dos selos temáticos.
Foi através dos jornais, muito antes das
televisões terem a possibilidade de serem adquiridas para os nossos domicílios (caríssimas,
só se viam nos cafés, nas coletividades e nos salões paroquiais) que se tinha
conhecimento dos temores da invasão da India Portuguesa e dos terrores com as
guerras na Guiné, Angola e Moçambique, onde a censura abafava muito da
realidade e só revelava o que convinha ao regime salazarista.
E todos os acontecimentos mundiais se repercutiam
nas páginas dos jornais.
Com a democracia, o jornalismo tornou-se o
quarto poder porque pode exercer determinada influência sobre a sociedade.
Chamamos-lhe este termo porque tem como referência os Três Poderes do Estado
Democrático que regem a sociedade (Legislativo, Executivo e Judiciário). A
influência da grande mídia pode alterar as decisões sociais, a opinião pública
e as notícias que chegam à população.
Assistimos hoje a um drama com os profissionais
do JN, DN, O Jogo, TSF, entre outros títulos da Global Média Group, jornais
históricos e uma rádio que foi, durante tantos anos, uma referência na
informação. Os seus salários estão em atraso e com o risco de fecharem por gestão
danosa.
Esperemos qua ainda neste início do ano bons
ventos possam soprar para as bandas deste mundo do jornalismo.
João de Jesus Nunes
(In “Jornal Fórum Covilhã”, de 31-01-2024)
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