Vão-nos
levando tudo, cada dia que passa, cada hora que se aproxima, cada minuto que
desaparece, e, num segundo, tudo se desvanece. Só nos falta levarem a alma!
Aquela pedra
angular da personalidade, duma pessoa de bem, se dissipou. Longe vão os tempos
dos nossos antepassados em que um aperto de mão ou a afirmação, numa tomada de
decisão, sem qualquer juramento, valia como lei. Era quase tão sagrado como a
pedra de ara na religião católica. Já tínhamos ultrapassado os tempos da pedra
polida, trabalhávamos na pedra preciosa, e, nos tempos que correm, somos
confrontados com horríveis sonhos no quase retrocesso para os tempos da pedra
lascada.
Vamo-nos
rindo, em sofrimento, com a palavra tão em voga – “irrevogável” –; saindo das
profundezas dum vulcão, entranhas duma “grande personalidade”, que nos vomita
para os olhos, nas televisões, e nos jornais, com o seu semblante – governante
sem palavra – , numa visão de autêntica macacada (já não dizemos “palhaçada”
por ser uma palavra proibida em certos espaços circenses); no consumir, escravo
das incompetências de muitos que nos desgovernam, o dia a dia de todos nós.
Muitos atiram
a primeira pedra, como outros atiram a pedra mas escondem a mão, em cobardias
sobejamente conhecidas.
Depois,
depois, quem deveria chamar à pedra os responsáveis pela caótica situação
prefere que o “seu” povo lhe proporcione antes uma pernoita com a sua Maria,
nas Ilhas Selvagens, onde esse povo pobre, doente e descontente, se sentiria
mais aliviado se a permanência de sua excelência ali fosse vitalícia.
Evitava-se, assim, andar tanto a dar por paus e por pedras, e andar
sistematicamente com quatro pedras na mão.
Aquelas
alminhas governamentais; quase de fazer chorar as pedras, pensando que se
sentem de pedra e cal, com a sua provocação, em cada dia que passa, em cada
palavra que soltam, em cada atitude que tomam; fazem-nos andar sempre com a
pedra no sapato.
É que, “Eles
não sabem que o sonho é uma constante da vida, tão concreta e definida, como
outra coisa qualquer”.
Querem acabar
com ele, pois há mais de uma década que mantemos pântano político e tanga no
Estado, assim como as reformas, que eram para imediato, acabaram numa mão cheia
de nada.
Mas, “como
esta pedra cinzenta em que me sento e descanso, como este ribeiro manso”, os
senhores dos palanques do poder nos vão prometendo grandes feitos e logo surgem os defeitos.
Sendo que, “em
serenos sobressaltos como estes pinheiros altos que em verde e oiro se agitam”,
já se agiganta, há muito, o espectro dos lóbis, desigualdades, protecionismo,
pobreza, impunidade e compadrio.
Mas, “como
estas aves que gritam em bebedeiras de azul”, vai a contrariedade com o
défice entre partidos políticos e políticos quebrados.
Mas, “eles
não sabem que o sonho é vinho, é espuma, é fermento, bichinho álacre e sedento,
de focinho pontiagudo, que fossa através de tudo num perpétuo movimento”,
nos vão enchendo de descaradas petas, em que o que hoje é verdade, amanhã é
mentira.
Evidentemente
que, “eles não sabem que o sonho é tela, é cor, é pincel, base, fuste,
capitel, arco em ogiva, vitral, pináculo de catedral”, para nos
conduzirem a bom porto, é preciso “lançar ao mar” a escória de oportunistas,
corruptos, traidores e embusteiros do pobre povo.
E, neste “contraponto,
sinfonia, máscara grega, magia, que é retorta de alquimista” , ao invés
de convertermos o metal vil em ouro, somos confrontados com a retoma a vê-la
por um canudo, não obstantes os “Pecs” e os agora programas de austeridade, à
espera de tranches dos empréstimos que pagamos, à grande e à francesa, como sói
dizer-se.
É neste “mapa
do mundo distante, rosa dos ventos, Infante, caravela quinhentista, que é Cabo
da Boa Esperança” que vamos continuando a ver a dívida sempre
escondida, a fragilidade da competitividade, a economia numa agonia, quando
houve alguns negócios fortes.
O “ouro,
canela, marfim, florete de espadachim, bastidor, passo de dança, Colombina e
Arlequim” se inseriram
nas privatizações da PT, EDP, GALP, REN, Portucel, ANA, e sabemos lá que mais.
Com a “passarola
voadora, para-raios, locomotiva, barco de proa festiva, alto-forno, geradora,
cisão do átomo, radar, ultrassom, televisão, desembarque em foguetão na
superfície lunar”,
logo
“visionários”, “iluminados” e “homens de Estado”, mas em estado vergonhoso, nos
vêm trazer uma mão cheia de coisas: a ruína do BCP, assistida pela CGD, as
fugas de informação, a vergonha manipuladora das escutas, a espionagem, e a
promiscuidade entre empresas, num longo etc.
E, portanto,
já que muito ainda haveria que dizer, entre Face Oculta, o Polvo, o escândalo
do BPN, do BPP, as PPP, os swaps, os estádios, as estradas, o aeroporto e o
TGV, e outras mais, ficamos por aqui porque “eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida, que sempre que um homem sonha o mundo pula e avança
como bola colorida entre as mãos de uma criança”.
(In "Notícias da Covilhã", de 10.07.2013)
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