Comecei a escrever esta crónica no primeiro dia do Novo Ano,
altura habitual da publicação de poucos jornais, não só em Portugal, onde
surgiu nas bancas somente o Jornal de
Notícias, como também pelo Planeta fora, exceção feita ao continente americano,
pleno de imprensa escrita.
Na Ásia também a míngua se fez sentir no jornal em papel, no
dia 1 de janeiro, com o The Japan Times,
The Himalayan (Nepal), The Telegraph e The Nation (Índia), como também na
Europa, paupérrima de comunicação social escrita, em meia dúzia de países (o Braunschweiger Zeitung (Alemanha), The
Guardian (Reino Unido), Diário de Sevilha… e poucos mais.
No continente africano e na Oceânia nem pelos dedos de uma
só mão se contavam os jornais deste primeiro dia do ano, destacando-se tão só o
The Post, da Zâmbia.
Os brasileiros deram ênfase ao “Réveillon 2014 – um ano de fortes emoções”, no jornal O Globo. E, já agora, o “El Universo”, do Equador, surgiu na
capa com a foto de uma menina desenhando, na areia molhada da praia, os anos
2013 (já parcialmente encoberto pelas ondas) e 2014, bem destacado.
De notar, sem qualquer admiração, que quase todos tinham as
suas primeiras páginas alusivas ao Novo Ano 2014 – Happy New Year 2014 – enquanto poucos primaram, na mesma página,
por chamar a atenção dos principais eventos do ano findo – 2013 in review.
Também altura propícia para acertar conversas entre familiares
e amigos, veio, a talhe de foice de uma delas, o recordar um hábito de
linguagem errónea, de alguns estudantes do meu tempo:
- Fulano – perguntava o professor –, você sabe o que é o
“Anel do Fogo do Pacífico?”
- “Nada não, Stôr!” – respondia o aluno.
De tanta vez que esta resposta negativa surgia, certo dia,
um professor portuense, estranho com a resposta, já depois de ter feito reparo
pela estranheza da expressão, e pedido para corrigir, acabou por dizer – “Nada
não?!” Que é isso? Ora bem, “nada não é sim…”
E não é que, embora nunca tenha pertencido ao léxico
português, tal expressão, nos dias de hoje, vem de encontro às contradições e
incoerências nas pessoas em quem devíamos confiar.
Vejamos algumas, sem qualquer intuito de alinhamento cronológico.
- Nada não! – A primeira mulher a ser segunda figura em
Portugal – aquela simpática loira magrinha – na sua primeira intervenção inesquecível,
enquanto presidente da Assembleia da República, quando estava há seis meses no
cargo, em dezembro de 2011, queixou-se de cansaço. A revista 2, do Público,
referia que “pode crescer o desemprego,
faltarem os alimentos, pode haver austeridade em todo o lado menos nas
comparações que envolvem Assunção Esteves”. As pessoas logo falaram: “Mas estás cansada como, se te reformaste
aos 42 anos?... E não será ela a velhinha reformada mais nova de Portugal? E
talvez a que ganhe mais? Como é que apela ao esforço e sacrifício de todos os
portugueses quando escolheu a reforma vitalícia do Tribunal Constitucional?
(7255 euros mensais, por dez anos de serviço da primeira mulher juíza
conselheira do TC, mais 2133 euros de ajudas de custo, motorista, etc., em vez do
salário da segunda figura do Estado, que paga menos)”.
- Nada não! – O ano de 1993 estendeu-se pelo resto da década
por ter sido o começo de um período de disparates. A situação política estava
estabilizada. Cavaco Silva, a liderar o segundo governo, com os dinheiros da
CEE pensava que era então um maná. Dos muitos disparates, que não cabem neste
apontamento, desde a demasiada facilidade na aquisição de casa própria ao
grande aumento do número de funcionários públicos, contribuiu muito para a
situação em que hoje nos encontramos. “Cavaco,
abençoado seja, é um grande e inesgotável tema de comentário. Mas apresenta
dificuldades: manter um registo publicável num jornal e atualizada a lista de
todas as suas piruetas, contradições, sonsices e patifarias” – in DN de 3.1.2014, por Fernanda Câncio.
- Nada não! E que dizer dos “120 mil novos empregos “ de
Passos Coelho quando foram apenas 22 mil? Pois é, esta cabecinha pensadora
apontou a criação destes novos postos de trabalho em 2013 como sinal de
sucesso, mas desde janeiro surgiram muitos menos!
- Nada não! Ainda este Passos Coelho, acusado de mentir na
mensagem de Natal, com o conluio do Presidente da República, que acabou 2013
com uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma, qual é a legitimidade do
governo e deste primeiro-ministro que continua a praticar políticas e a aplicar
medidas que não sufragou democraticamente?
- Nada não! O candidato beijoqueiro das feiras e mercados
“assume uma atitude de grande responsabilidade” com a sua demissão irrevogável
do governo. Nos vários dicionários que consultei não consegui encontrar o
significado desta palavra, harmonizada com a atitude de Paulo Portas. E este
“nada não” transformou-se de facto, naquele sentido do professor portuense,
“nada não é sim”. Um sim que valeu oiro com a sua promoção a vice!
- Nada não! Já Vasco Pulido Valente escrevia no Público uma crónica com o título “Quem nos toma a sério?” quando antes,
no Correia da Manhã, surgiu um texto
que se intitulava “Será que Durão Barroso também é cigano?”. Nem as
instituições internacionais tratam o nosso país com algum respeito. Durão
Barroso, ainda presidente da Comissão Europeia, deveria ser o primeiro a pôr na
ordem alguns centros universitários em Bruxelas que insistem em qualificar-nos
como fazendo parte dos “Porcos”. Mas um centro de estudos na Bélgica incluiu
agora Portugal no grupo dos “Ciganos”. Primeiro, fazíamos parte dos chamados
“PIGS” (significado de “porcos” em inglês), com as designações das iniciais dos
países “Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha (Spain em inglês)”. Estes animais foram usados em caricaturas para
ilustrar as misérias económicas dos países. Apareceu agora a denominação de
ciganos, ou “GIPSY”, em inglês, em que os cinco países do costume são
incluídos. Será que Durão Barroso não consegue banir estes ultrajes?
- Nada não! E para colocar ponto final nesta crónica
primeira do ano 2014, uma referência às palavras do antigo jornalista e atual
escritor e comentador político, Miguel Sousa Tavares, na sua coluna de opinião,
no semanário Expresso – “2013 foi um ano inútil” e “o objetivo político da maioria
governamental para a primeira metade do ano que entra é apenas o de prolongar o
estado vegetativo que vivemos em 2013”.
(Texto completo, a publicar no jornal "O Olhanense")
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