14 de janeiro de 2014

HÁ QUATRO DÉCADAS NA ESPERANÇA

Neste início de um novo ano vamos esperar que haja algum lenitivo no que concerne aos sacrifícios suportados pelos portugueses no ano findo, mas estamos um pouco céticos em relação a isso.
O atual governo, adornado de alguns betinhos, que, da vida desconhecem as dificuldades, integram o rol de dirigentes deste País, no ano em que se comemoram 40 anos da Revolução de abril de 1974.
Enquanto a “gaivota voava, voava”, a tranquilidade de espírito e bem-estar social iam sofrendo convulsões, ao mesmo tempo que “uma papoila crescia, crescia”, acabando por ir murchando por não suportar os ventos do exterior, nas suas intenções ditas reformadoras.
Num olhar para o passado, as crises internacionais que interrompiam ciclos de crescimento económico podiam ser menos violentas se este nosso Portugal não tivesse; principalmente nas últimas décadas, para além da incompetência de artífices da ladroagem; a aquiescência dos líderes da governação.
Segundo a Pordata, entre 1961 e 1973, o PIB per capita aumentou fortemente e Portugal foi deixando de ser uma economia com predominância rural. Houve um crescimento da indústria  transformadora e da produção dos serviços públicos, como o fornecimento de eletricidade, gás e água. Por exemplo, na Covilhã, no auge da sua indústria rainha, de então – os lanifícios -, com centenas de empresas a proporcionar emprego para muita gentinha a caminho das fábricas, havia os Serviços Municipalizados que se encarregavam da eletricidade, água e saneamento.
O forte incremento da emigração, com as suas remessas para Portugal, manteve a balança com o exterior sem se agravar, mas é obra que entre 1966 e 1973 saíram do país quase 2% da população em cada ano, registando uma taxa de crescimento anual média de 7%.
Sou testemunha do fluxo de emigrantes que diariamente se dirigiam à Câmara Municipal da Covilhã para tratarem da sua documentação, com as cartas de chamada, a fim de rumarem a França, principalmente, e Alemanha, mas também para outros países europeus, ainda com a “cortina de ferro” a perdurar nessa Europa então dividida politicamente, sob o domínio soviético.
Enquanto as funcionárias municipais se arregalavam no atendimento dos munícipes que pretendiam emigrar, sim, porque eram fortemente recompensadas, para além de dinheirinho vivo em mão fechada, ou envelope sorrateiro, também uns cabazes confiados ao porteiro, tinham assim mais um “complemento do seu trabalho”, já que as mesmas funcionárias faziam brilhar aqueles rostos rudes, de uma vida rural em que, nas suas terras, muitos comiam o pão que o diabo amassou. Mas eles sabiam que se iam tornar uns “novos-ricos”, regressando depois, temporariamente, com as expressões meio afrancesadas.
E, assim, no regresso de férias, até já podiam ir, numa de sobranceria, ao Café Montalto, onde só viam entrar os seus patrões, e pedir uma bière fraiche.
Até o porteiro, guarda-portão em termos oficiais, conseguiu que lhe fosse conseguida autorização para ir a França “tratar dumas heranças familiares” (na altura os funcionários públicos viam-se obrigado a pedir uma autorização para sair do País). O passaporte de turista lá foi conseguido mas o porteiro acabou por ficar e arranjar trabalho em França, fintando os seus chefes, deixando os velhos Matias e Lança a expelirem impropérios pela astúcia do “malfeitor”, enquanto o Duarte Branco, o José Américo e a Suzete Figueiredo se riam…
Mas há 40 anos, logo em 1973, surgiram sintomas de fim de ciclo económico. A Organização dos Países Exportadores de Petróleo iniciaram um embargo com cortes na produção de crude, originando no Planeta a mais grave crise petrolífera de sempre.
Recordo-me de, em Portugal, haver um tempo em que não se podiam abastecer as viaturas de combustível aos sábados e domingos, ainda no tempo de Marcelo Caetano, face à crise do petróleo.
Avançando no tempo, Cavaco Silva, com duas maiorias absolutas contava convictamente com um forte desempenho económico positivo, com taxas de desemprego próximas de 4%, mas, entretanto, em 1993 verificou-se que tal não foi possível. Entretanto a economia europeia entrou em recessão e Portugal foi um dos países mais afetados, pois o PIB viria a cair 2% em 1993. Cavaco Silva perde popularidade e surge a vitória do Partido Socialista nas eleições legislativas de 1995.
Em 2011, em troca dos empréstimos dos parceiros europeus e do FMI, Portugal comprometeu-se com uma política de forte austeridade com impacto muito negativo na atividade económica. Atingiu-se o terceiro ano consecutivo com uma contração do PIB, com 4,8 pontos percentuais do mesmo, o pior resultado registado em Portugal nos últimos 60 anos.
Com o surgimento das novas tecnologias, começando a Internet em 1993, a entrada em vigor do espaço Shengen em 1995, e a adoção do euro em 2002, o país forçosamente teve que mudar.
Com a globalização da economia, as indústrias tradicionais, como na Covilhã o têxtil e de lanifícios, sofreram com isso.
Até 2013 Portugal não conseguiu ainda respirar com tranquilidade, sendo o país mais envelhecido da Europa.

As universidades abriram com o 25 de abril e em 2012 a taxa bruta de escolaridade no nível superior era de 54,6%. A educação avançou assim a um ritmo diferente da economia. Portugal não está a conseguir manter a mão-de-obra qualificada, partindo, mais de metade para outros países, aproveitando assim os cérebros portugueses, ao contrário do que se havia verificado na década de sessenta. E, assim, em Portugal não se pode sonhar!

(In "fórum Covilhã", de 14.01.2014)

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