25 de setembro de 2020

HÁ QUE CONTINUAR A DAR FORÇA À VIDA

 A maioria dos Combatentes do Ultramar já ultrapassou os 65 anos. Na generalidade quase podemos dizer que se situam acima das sete décadas de vida. Como se costuma dizer, a idade não perdoa. Por isso, as nossas vontades indómitas vão forçosamente perdendo alguma vitalidade. Nos tempos que correm, em tempo de pandemia, muitos de nós temos de nos preservar da envolvência em ações de risco, porque somos pessoas de risco. Esta última palavra diz muito à nossa juventude de então; ou seja, dos já longos tempos do segundo ano da década de sessenta a meados da de 70, do século transato, que por todos nós já passou; de onde o perigo era iminente. Foram muitas vicissitudes na perigosidade constante duma guerra não desejada. Longe da família. Longe de um fim de semana. Longe de tudo. Queríamos imaginar um sorriso aos entes queridos deixados na Metrópole. Quantas folhinhas desdobráveis chamadas aerogramas não terão sido utilizadas! Para chegarem ao destino passado não sei quanto tempo…  Surgiriam as primeiras tatuagens, algumas exuberantes, no braço direito de alguns soldados: “amor de mãe”. E quando algum ferido grave soltava desesperado aquele espontâneo grito pela mãe, sentiam algum bálsamo quando alguma jovem enfermeira paraquedista, ou nos hospitais, tentava atenuar as suas dores. Esta, uma de várias e muitas situações do risco concretizado que então se corria todos os dias.

Noutro contexto, mas similar, são os tempos que correm com o COVID 19. Quantos Combatentes, ainda dominados pelas patologias resultantes da exposição a fatores traumáticos de stress durante a sua permanência no Ultramar, urgem da necessária prestação de serviços de apoio médico, psicológico e social, e se refugiam nos Corpos Médico e de Enfermagem, e nos Psicólogos, a que estão afetos, variadíssimas vezes por via dos Núcleos da Liga dos Combatentes da sua área. Tal como nos tempos da guerra subversiva, são agora esses Homens e Mulheres dos Serviços de Saúde em Portugal que se encontram na linha da frente tentando vencer um inimigo invisível, que tem conseguido dominar exércitos, tratando democraticamente grandes e pequenas potências. O vírus, esse inimigo desconhecido, mas potente e invisível, omnipresente e mortal do homem, com prevalência para os mais idosos e fragilizados, tem sido ocasião de muitos tormentos para muita gente da nossa gente, onde se englobam os Combatentes do Ultramar e suas famílias.

Depois de muita tinta, e muitos esforços da Liga dos Combatentes, com destaque para o seu Presidente da Direção Central, Tenente-general, Joaquim Chito Rodrigues, conseguiu ser aprovado o Estatuto do Antigo Combatente. Assim, a comissão parlamentar da Defesa Nacional aprovou no dia 15 de julho, na especialidade, por unanimidade, a maioria dos artigos do novo Estatuto do Antigo Combatente. E, em 20 de agosto, no Diário da República, por força da Lei n.º 46/2020, foi definitivamente aprovado o Estatuto do Antigo Combatente.

Procedeu assim à sétima alteração ao Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro; à primeira alteração à Lei n.º 9/2002, de 11 de fevereiro; e à primeira alteração à Lei nº. 3/2009, de 13 de janeiro.

Salientamos alguns artigos:

Artigo 2.º - Âmbito da aplicação –  1 – São considerados antigos combatentes para efeitos do presente Estatuto:

a)       Os ex-militares mobilizados, entre 1961 e 1975, para os territórios de Angola, Guiné-Bissau e Moçambique;

b)      Os ex-militares que se encontravam em Goa, Damão e Diu, bem como em Dadra e Nagar-Aveli, aquando da integração destes territórios na União Indiana;

c)       Os ex-militares que se encontravam no território de Timor-Leste entre o dia 25 de abril de 1974 e a saída das Forças Armadas desse território;

d)      Os ex-militares oriundos do recrutamento local que se encontrem abrangidos pelo exposto nas alíneas anteriores;

e)      Os militares dos quadros permanentes abrangidos por qualquer uma das situações previstas nas alíneas a) a c).

2 – São ainda considerados antigos combatentes os militares e ex-militares que tenham participado em missões humanitárias de apoio à paz ou à manutenção da ordem pública em teatros de operação classificados nos termos da Portaria n. 87/99, de 28 de janeiro, publicada no Diário da República, 2.ª série, n.º 23, de 28 de janeiro de 1999.

3 – O Estatuto aplica-se apenas aos deficientes das Forças Armadas que estejam incluídos no âmbito dos números anteriores.

4 – O Estatuto não prejudica a natureza e as necessidades específicas dos deficientes das Forças Armadas, nem exclui a possibilidade de adotarem um estatuto próprio, tendo em conta o regime legal específico que lhes é aplicável.

5 – As disposições previstas no presente Estatuto aplicam-se ainda às viúvas dos antigos combatentes identificados no n.º 1 do presente artigo naquilo que, estritamente, lhes for aplicável.

Artigo 3º. – Dia do antigo combatente

             1 – Como forma de reconhecimento aos antigos combatentes identificados nos termos do artigo anterior pelos serviços prestados à Nação, é estabelecido o dia do antigo combatente, para que sejam relembrados, homenageados e agraciados pelo esforço prestado no cumprimento do serviço militar.

             2 – O dia do antigo combatente é celebrado anualmente no dia 9 de abril, data em que se comemoram os feitos históricos dos antigos combatentes por Portugal.

            3 – Não obstante o disposto no número anterior, o Estado, através do Ministério da Defesa Nacional, pode evocar a memória e feitos dos antigos combatentes no Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades e no dia 11 de novembro, data em que se comemora o fim da Primeira Grande Guerra, em colaboração com a Liga dos Combatentes e as associações de antigos combatentes.

Com surpresa verificamos que os militares que foram mobilizados para os territórios de Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste até 24 de abril de 1974, em missão de soberania e com obrigações idênticas aos visados nos números do artigo 2.º, que até aqui eram notoriamente considerados antigos Combatentes, constam deste novo Estatuto duma forma pouco abonatória para os mesmos, na minha maneira de ver, integrados no âmbito da Portaria nº. 87/99, de 28 de janeiro, na forma ambígua de interpretação, no que concerne à designação de “militares envolvidos em missões de paz e humanitárias ou que cumpram ações de cooperação técnico-militar, fora do território nacional”, em países de classe A, B ou C. 

(In "O Combatente da Estrela", n.º 120, setembro 2020)

 

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