23 de junho de 2023

CONTE-NOS A SUA HISTÓRIA JOSÉ MANUEL BRITO

 
Este antigo Combatente na Guiné é uma figura sobejamente conhecida na Cidade, tendo trabalhado num único espaço comercial – a Casa Dinis, sempre muito atencioso e de reconhecida simpatia pelos clientes. Aqui se iniciou aos 13 anos, após concluir a Instrução Primária. Até à sua aposentação completou neste estabelecimento comercial 52 anos de trabalho consecutivo, só interrompido pelo serviço militar.

Nasceu em 2 de novembro de 1941 na freguesia de Santa Maria, do concelho da Covilhã.

Vindo a propósito, memorizamos um extrato dum texto que inserimos no “Notícias da Covilhã”, de 11-04-2003, sob o título “Crónicas da Rua Direita”, como segue:

“De facto, o mais antigo empregado duma casa comercial sediada nesta rua, ainda no ativo, dá pelo nome de José Manuel Brito. Sempre na Casa Dinis, onde entrou com 13 anos, e acabaria por casar com uma sua colega, Helena Almeida. Este veterano já vai em quase meio século de trabalhador por conta de outrem, e, nos seus 48 anos de ligação aquela casa comercial, está como o Vinho do Porto, cada vez mais ativo a trabalhar. Isto contrasta com outros mais novos, que, fruto de reformas antecipadas, passeiam nessa condição, pela Rua Direita, quando há tanto trabalho a desenvolver, ainda que gratuito, no meio associativo e até da solidariedade social, cada vez mais necessária nos dias de hoje. Pois, o José Manuel, como é conhecido, além da sua “enxada” quotidiana, ainda se dedica ao associativismo, tendo pertencido a vários elencos, já lá vão 40 anos, no GIR do Rodrigo, sendo o seu esforço inegável na colaboração que tem prestado em várias atividades desenvolvidas por esta coletividade de prestígio. E como não sabe dizer não a quem dele se abeira, também participou no trabalho de colaboração nas profundas obras de melhoramento na Capela do Bairro do Rodrigo. Tem três filhos que se orgulham do pai – um exemplo de trabalhador”.

Em fevereiro de 1962 foi chamado para iniciar o serviço militar obrigatório, no CICA3, em Elvas, onde fez a recruta e a especialidade de condução autorrodas, fazendo depois exame no Porto, no Cavalaria 6. Seguiu ainda para Espinho e daqui para o BC6 em Castelo Branco, onde foi mobilizado para a Guiné. Nesta colónia esteve durante dois anos, regressando à Metrópole em junho de 1964, no navio Índia.

Ao desembarcar em Bissau no navio Ana Mafalda, seguiu para Bafatá, onde permaneceu todo o tempo.

Como condutor auto participou em várias operações no mato, onde lhe surgiram algumas emboscadas do inimigo (IN), que, embora não o tivessem felizmente atingido, ainda viu morrer em combate três camaradas, soldados do seu pelotão. Todos eles eram do Norte. Ainda passou a poucos metros de uma mina, mas foi avisado a tempo por um seu camarada, pelo que não chegou a pisá-la, o que provocaria o seu rebentamento, que seria trágico e de consequências imprevisíveis. É que, entretanto, no Esquadrão de Cavalaria de que fazia parte, houve muitos feridos nas várias ações de combate.

Veio a ser chamado para trabalhar na messe de sargentos, para servir o pessoal, sem abandonar a condução auto.

De Bafatá foi ainda para Bamadinga, onde, para aqui chegar, tiveram de atravessar o rio Geba, a pé, e, noutros locais, em canoas, sem nunca existirem problemas apesar de haver crocodilos. Chegaram mesmo a apanhar um crocodilo pequeno que levaram para o quartel e o alimentaram, metendo-o num poço. Também muitos macacos foram apanhados, sendo alguns levados para o quartel, a fim de serem domesticados. Alguns camaradas trouxeram-nos de regresso mas acabaram por morrer devido ao clima na Metrópole.

Mesmo assim, um dos sustos que teve foi quando, estando de serviço, encontrou uma jiboia “surucucu” a qual se encontrava num patamar com arame farpado, numa altura em que faziam      uma ronda, com holofote fixo para ver se viam o IN. Era de noite e foi morta pelo sargento.

Como foi referido, andou no mato sempre como condutor, tendo-se sentido feliz por nenhum dos que o acompanhavam terem tido qualquer problema, assim como na sua pessoa, mas, paradoxalmente, sente-se triste ao ter visto morrerem outros camaradas, um deles quando lhe faltava pouco tempo para terminar o serviço e regressar à Metrópole.

Sentiu sempre saudades da família.

Terminado o tempo de serviço, embarcou para a Metrópole e retomou a sua vida profissional na Casa Dinis.

Aos 81 anos, doente, faz a sua vida calma, sempre muito acarinhado pela esposa, que lhe dá todo o apoio de que necessita.

(In “O Combatente da Estrela”, nº. 131-JUL/2023)


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